quarta-feira, 29 de outubro de 2014

O 'Bolsa Esmola' dos mais ricos


Fernando Molica

Como pobres não têm dinheiro para gastar em escolas e médicos privados, ficam de fora dos benefícios

Rio - O Bolsa Família conquistou a unanimidade dos principais candidatos à Presidência — os oposicionistas Marina Silva e Aécio Neves até disseram que ampliariam o programa desenvolvido em administrações petistas. Mas, nas ruas e na internet, a complementação de renda é muito criticada por pessoas que dizem ser contra o governo, o mecanismo chega a ser chamado de Bolsa Esmola.

A entrega de uma quantia mensal a famílias muito pobres — fundamental para a alimentação de milhões de brasileiros — é associada a um estímulo ao comodismo. E olha que o valor médio do benefício é de apenas R$ 152,35. Mas os que tanto criticam a transferência de renda aos mais pobres não falam que também se beneficiam de dinheiro público, são favorecidos pelo que poderíamos chamar de Bolsa Rico ou Bolsa Classe Média.

A grande maioria da população não tem dinheiro para bancar escolas e serviços privados de saúde e é obrigada a recorrer às redes públicas. Mas essas mesmas pessoas — que estão entre as mais pobres — são obrigadas a rachar a conta das escolas particulares e dos médicos, dentistas, fisioterapeutas, psicólogos e hospitais privados utilizados pelos que têm mais grana.

O subsídio se dá pelo imposto de renda, que permite a dedução das despesas com saúde e autoriza o abatimento de parcela do que foi gasto com a educação do contribuinte e de seus dependentes. Como pobres não têm dinheiro para gastar em escolas e médicos privados, ficam de fora dos benefícios.

Recursos aplicados em uma modalidade de plano de previdência privada também podem ser abatidos do imposto, assim como parcela do INSS pago a empregadas domésticas. É inacreditável, mas é isso mesmo — com a desculpa de estimular a formalização do trabalho doméstico, o governo devolve para os patrões dinheiro gasto com a previdência das empregadas. Deve ser o único país do mundo em que o privilégio de manter uma doméstica conta com estímulo oficial.

No ano passado, foram investidos R$ 24,5 bilhões no Bolsa Família. Já o valor das deduções previstas no imposto de renda de pessoas físicas foi estimado em R$ 37, 354 bilhões. Só os abatimentos relacionados a despesas com saúde chegariam a R$ 9,874 bilhões; o subsídio àqueles que gastam em escolas privadas somaria R$ 3,877 bilhões. No fim das contas, muita gente que se diz contra o Bolsa Família quer mesmo é continuar a tirar dos pobres para dar aos ricos ou remediados. Robin Hood ficaria espantado com a cara de pau de muitos de nossos compatriotas.

O DIA


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