Miranda Muniz: A famigerada “cláusula de barreira”
A tentativa da “reimplantação” da cláusula de barreira (apresentada com o nome pomposo de cláusula de desempenho) é a iniciativa que mais atenta contra o estado democrático de direito e o pluralismo político.
por Miranda Muniz*
Nas discussões sobre a reforma política, em curso no Congresso Nacional, há dois grandes campos em contraposição: as elites políticas e econômicas desejando uma reforma para restringir a democracia, pois entendem que há muito povo participando do poder. São embaladas pelas teses da diminuição do número de partidos, cláusula de barreira, voto distrital, fim das coligações proporcionais, nenhum controle sobre a mídia e a influência do poder econômico nos processos eleitorais, etc; o outro, representado pelos setores populares, quer uma reforma para fortalecer os partidos e ampliar a democracia, com adoção das listas preordenadas e a diminuição da interferência da mídia e do poder econômico sobre o processo eleitoral (com financiamento público exclusivo), uma reforma que implante mecanismos para garantir maior presença de mulheres, de jovens e dos setores populares nos executivos e legislativos, entre outros.
Certamente, a tentativa da “reimplantação” da cláusula de barreira (apresentada com o nome pomposo de cláusula de desempenho) é a iniciativa que mais atenta contra o estado democrático de direito e o pluralismo político.
Esse mecanismo antidemocrática fazia parte da Constituição outorgada de 1967. Nem chegou a entrar em vigor e, posteriormente, com a Constituição Cidadã de 1988, foi “jogada na lata de lixo”, juntamente com outros “entulhos autoritários.”
Tal mecanismo discricionário voltou ao cenário em 1997, com o advento da lei 9.095 (lei dos partidos políticos) e, após ação de inconstitucionalidade, impetrada pelo PCdoB e outras agremiações, os artigos que versavam sobre a cláusula de barreira foram declarados inconstitucionais, em decisão unânime, dos ministros do Supremo Tribunal Federal, em 2006.
O artigo 13 da referida lei, que foi considerado inconstitucional, dizia que "tem direito a funcionamento parlamentar, em todas as Casas Legislativas para as quais tenha elegido representante, o partido que, em cada eleição para a Câmara dos Deputados obtenha o apoio de, no mínimo, cinco por cento dos votos apurados, não computados os brancos e os nulos, distribuídos em, pelo menos, um terço dos Estados, com um mínimo de dois por cento do total de cada um deles." Assim, mesmo o partido tendo alcançado o quociente eleitoral e, consequentemente, eleito parlamentar, só teria direito ao funcionamento parlamentar se alcançasse um número mínimo de votos. Caso contrário, o parlamentar eleito não teria os mesmos direitos dos parlamentares de outros partidos que tivessem superado a “clásula”, ou seja, o parlamento estaria assim dividido em parlamentares de primeira e de segunda categoria, algo inaceitável num sistema democrático.
Mesmo não tendo lei disciplinando o tal “funcionamento parlamentar”, há certo consenso que ele estaria relacionado com participação nas comissões, indicação de voto nas votações nominais, presença nas mesas diretoras, ausência de benefícios materiais e assessoria especial, etc.
Certamente, a tentativa da “reimplantação” da cláusula de barreira (apresentada com o nome pomposo de cláusula de desempenho) é a iniciativa que mais atenta contra o estado democrático de direito e o pluralismo político.
Esse mecanismo antidemocrática fazia parte da Constituição outorgada de 1967. Nem chegou a entrar em vigor e, posteriormente, com a Constituição Cidadã de 1988, foi “jogada na lata de lixo”, juntamente com outros “entulhos autoritários.”
Tal mecanismo discricionário voltou ao cenário em 1997, com o advento da lei 9.095 (lei dos partidos políticos) e, após ação de inconstitucionalidade, impetrada pelo PCdoB e outras agremiações, os artigos que versavam sobre a cláusula de barreira foram declarados inconstitucionais, em decisão unânime, dos ministros do Supremo Tribunal Federal, em 2006.
O artigo 13 da referida lei, que foi considerado inconstitucional, dizia que "tem direito a funcionamento parlamentar, em todas as Casas Legislativas para as quais tenha elegido representante, o partido que, em cada eleição para a Câmara dos Deputados obtenha o apoio de, no mínimo, cinco por cento dos votos apurados, não computados os brancos e os nulos, distribuídos em, pelo menos, um terço dos Estados, com um mínimo de dois por cento do total de cada um deles." Assim, mesmo o partido tendo alcançado o quociente eleitoral e, consequentemente, eleito parlamentar, só teria direito ao funcionamento parlamentar se alcançasse um número mínimo de votos. Caso contrário, o parlamentar eleito não teria os mesmos direitos dos parlamentares de outros partidos que tivessem superado a “clásula”, ou seja, o parlamento estaria assim dividido em parlamentares de primeira e de segunda categoria, algo inaceitável num sistema democrático.
Mesmo não tendo lei disciplinando o tal “funcionamento parlamentar”, há certo consenso que ele estaria relacionado com participação nas comissões, indicação de voto nas votações nominais, presença nas mesas diretoras, ausência de benefícios materiais e assessoria especial, etc.
Na opinião do professor Jairo Nicolau, pesquisador do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, o parlamentar eleito nessas condições seria obrigado a mudar de partido ou “do contrário, ficariam como deputados-zumbis, almas sem plenos direitos legislativos, condenadas a vagar pelos corredores do Legislativo.”
Por ocasião do julgamento sobre constitucionalidade dessa matéria, a fundamentação legal argüida pelos ministros para afastar a famigerada cláusula de barreira, teve escopo constitucional, no princípio fundamental do “pluralismo político”, expresso no art. 1º, inciso V, e no primado da “liberdade partidária”, presente no art. 17, da Constituição Federal.
Em seu voto, o ministro Marco Aurélio, relator da ADI, enumerou que, na época, se prevalecesse a cláusula restritiva, somente sete partidos estariam aptos a participar plenamente da vida política e parlamentar e, segundo ele, “os demais ficarão à míngua, vale dizer, não contarão com o funcionamento parlamentar, dividirão, com todos os demais partidos registrados junto ao Tribunal Superior Eleitoral, a percentagem de um por cento do fundo partidário e, no tocante à propaganda partidária, terão, por semestre, apenas dois minutos restritos à cadeia nacional”.
Por ocasião do julgamento sobre constitucionalidade dessa matéria, a fundamentação legal argüida pelos ministros para afastar a famigerada cláusula de barreira, teve escopo constitucional, no princípio fundamental do “pluralismo político”, expresso no art. 1º, inciso V, e no primado da “liberdade partidária”, presente no art. 17, da Constituição Federal.
Em seu voto, o ministro Marco Aurélio, relator da ADI, enumerou que, na época, se prevalecesse a cláusula restritiva, somente sete partidos estariam aptos a participar plenamente da vida política e parlamentar e, segundo ele, “os demais ficarão à míngua, vale dizer, não contarão com o funcionamento parlamentar, dividirão, com todos os demais partidos registrados junto ao Tribunal Superior Eleitoral, a percentagem de um por cento do fundo partidário e, no tocante à propaganda partidária, terão, por semestre, apenas dois minutos restritos à cadeia nacional”.
Para o Ministro-relator, tal mecanismo asfixiava e até alijava importantes partidos do campo político e, em tom de ironia, acrescentou “e tudo ocorreu a partir da óptica da sempre ilustre maioria.” Já em tom de desabafo, sentenciou que “é de repetir até a exaustão, se preciso for: Democracia não é a ditadura da maioria!”
O ministro Ricardo Lewandowski destacou, na ocasião, que “a cláusula de barreira fere de morte o pluripartidarismo político e a garantia de que as minorias encontrem representação no plano político.” No mesmo sentido, a ministra Cármen Lúcia, defendeu que a "minoria de hoje tem de ter espaço para ser a maioria de amanhã". Ela enfatizou que a regra vai de encontro com a tentativa de construir uma sociedade inclusiva. Já o ministro Sepúlveda Pertence observou que na Alemanha a cláusula de barreira mata os partidos e, aqui no Brasil, ela condenava o partido à morte por inanição.
Por todos os argumentos expressos pelos ministros do STF e por respeitáveis estudiosos, percebe-se claramente que a “cláusula da exclusão”, menina dos olhos da grande mídia e dos setores conservadores, não merece prosperar num verdadeiro estado democrático de direito. É mais uma tentativa que precisa ser rechaçada com vigor, pois, afinal, a reforma política deve ter o sentido de aperfeiçoar e ampliar, e não de restringir a jovem democracia que está em construção em nosso país.
*Miranda Muniz – agrônomo, bacharel em direito, oficial de justiça avaliador federal e presidente estadual do PCdoB-MT
O ministro Ricardo Lewandowski destacou, na ocasião, que “a cláusula de barreira fere de morte o pluripartidarismo político e a garantia de que as minorias encontrem representação no plano político.” No mesmo sentido, a ministra Cármen Lúcia, defendeu que a "minoria de hoje tem de ter espaço para ser a maioria de amanhã". Ela enfatizou que a regra vai de encontro com a tentativa de construir uma sociedade inclusiva. Já o ministro Sepúlveda Pertence observou que na Alemanha a cláusula de barreira mata os partidos e, aqui no Brasil, ela condenava o partido à morte por inanição.
Por todos os argumentos expressos pelos ministros do STF e por respeitáveis estudiosos, percebe-se claramente que a “cláusula da exclusão”, menina dos olhos da grande mídia e dos setores conservadores, não merece prosperar num verdadeiro estado democrático de direito. É mais uma tentativa que precisa ser rechaçada com vigor, pois, afinal, a reforma política deve ter o sentido de aperfeiçoar e ampliar, e não de restringir a jovem democracia que está em construção em nosso país.
*Miranda Muniz – agrônomo, bacharel em direito, oficial de justiça avaliador federal e presidente estadual do PCdoB-MT
Vermelho
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