Um dia inesquecível para as 22 famílias remanescentes de quilombo da Comunidade Senhor do Bonfim, situada no distrito de Cepilho, no município de Areia, brejo paraibano, a 122 km de João Pessoa. Assim será lembrado o dia 14 de abril de 2010, data em que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) foi imitido na posse da área com aproximadamente 122 hectares . Esta foi a primeira comunidade remanescente de quilombo do estado da Paraíba a ter sua área destinada ao Incra pela Justiça e a primeira a receber o Decreto Presidencial de Desapropriação por Interesse Social, assinado pelo Presidente Lula em 2009, que prevê a indenização e posterior retirada de particulares que não pertencem à comunidade.
Ao meio-dia, na sede da Associação dos Moradores, o ato de imissão de posse da área reuniu o superintendente regional, Marcos Faro, o procurador da Intituição Ridalvo Machado de Arruda, dezenas de quilombolas da comunidade e de mais quatro comunidades quilombolas paraibanas, representantes das Secretarias Estaduais de Educação e de Mulheres, bem como de integrantes da Associação de Apoio às Comunidades Quilombolas da Paraíba (Aacade) e da Coordenação Estadual Quilombola (Cecneq).
A festa, anunciada por rojões, foi animada pelo grupo de ciranda da comunidade quilombola Caiana dos Crioulos, do município de Alagoa Grande. Após a assinatura do ato de imissão de posse, foi servido um almoço com alimentos colhidos na comunidade.
“Quero dizer às outras comunidades que não desistam apesar das dificuldades. Se não fosse a resistência da comunidade nós não estaríamos aqui. Mas não paramos por aqui; ainda temos muito a conquistar e agora precisamos mais do que nunca da ajuda de todos, principalmente dos órgãos do Governo, com recursos financeiros”, disse Geraldo Gomes de Maria, 36 anos, ex-presidente da Associação de Moradores de Bonfim. “Daqui a dois anos nossa comunidade será outra. Vocês vão ver!”.
História de resistência
A propriedade, que abriga o Engenho Bonfim, atualmente desativado, foi vendida em 2004 e se transformou em área de conflito. Os novos donos tentaram expulsar os moradores, que estão na área há pelo menos 25 anos. Algumas famílias estão nas terras há mais de 90 anos.
Com o acirramento do conflito, e a partir do apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e da Pastoral dos Negros, a comunidade do Bonfim aos poucos foi tomando maior consciência de sua condição de negros e dos direitos que a sua relação com o território lhes confere. Em dezembro de 2004 redirecionaram sua demanda, antes voltada para a desapropriação para Reforma Agrária, e entraram com um pedido de certificação como comunidade remanescente de quilombo junto à Fundação Cultural Palmares, que emitiu a certidão de autorreconhecimento em 18 de abril de 2005.
Em função do acirramento do conflito envolvendo a comunidade e os novos proprietários, com ameaças inclusive a representantes do Incra, seu processo de regularização fundiária ganhou prioridade em relação aos demais.
Fome e maus-tratos
Até pouco tempo atrás, os homens das famílias do Bonfim trabalhavam no plantio da cana, na lida com o agave e na produção de rapadura e aguardente no engenho, na condição de trabalhadores-moradores. Recebiam salário irrisório, que, segundo eles, não dava para cobrir o que era comprado na mercearia, também propriedade dos donos do engenho. Os homens eram obrigados a trabalhar entre quatro a seis dias da semana no engenho em troca da moradia e de um pequeno espaço de terra para fazer roças.
Os administradores da fazenda sempre se mantinham vigilantes para impedir que o tamanho da área plantada aumentasse e, dessa forma, as famílias se viam obrigadas a comprar praticamente todos os gêneros alimentícios na mercearia.
Ainda não foram apagadas da memória dos mais velhos as recordações de períodos de fome, maus-tratos, inclusive físicos, por parte do proprietário ou de seus gerentes ou administradores. Na falta de alimento de qualidade, as famílias driblavam a fome com a polpa da semente da palmeira Macaíba.
“Antes a gente tinha dificuldade de ter o próprio alimento. Agora temos para sobreviver e ainda temos de sobra, para vender e comprar o que a gente não produz aqui”, afirmou, entre lágrimas, Geraldo Gomes de Maria.
Processo de Regularização De acordo com a antropóloga Maria Ester Fortes, do Serviço de Regularização de Territórios Quilombolas do Incra-PB, o processo de regularização fundiária de comunidades quilombolas é demorado, mas indispensável ao futuro das comunidades quilombolas, que têm visto suas áreas cada vez mais diminuídas com a especulação imobiliária.
As comunidades quilombolas são grupos étnicos predominantemente constituídos pela população negra rural ou urbana, que se autodefinem a partir das relações com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições e práticas culturais próprias. Estima-se que em todo o País existam mais de três mil comunidades quilombolas. Para terem seus territórios regularizados, as comunidades quilombolas devem encaminhar uma declaração na qual se identificam como comunidade remanescente de quilombo à Fundação Cultural Palmares, que expedirá uma Certidão de Auto-reconhecimento em nome da mesma. Devem ainda encaminhar à Superintendência Regional do Incra uma solicitação formal de abertura dos procedimentos administrativos visando à regularização.
A regularização do território tem início com um estudo da área, a elaboração de um Relatório Técnico que identifica e delimita o território da comunidade. Uma vez aprovado este relatório, o Incra publica uma portaria de reconhecimento que declara os limites do território quilombola. A fase final do procedimento corresponde à regularização fundiária, com a retirada de ocupantes não quilombolas através de desapropriação e/ou pagamento das benfeitorias e a demarcação do território.
Ao final do processo, é concedido título de propriedade coletivo, pró-indiviso e em nome da associação dos moradores da área, registrado no cartório de imóveis, sem qualquer ônus financeiro para a comunidade beneficiada. Os títulos garantem a posse da terra, além do acesso a políticas públicas como educação, saúde e financiamentos por meio de créditos específicos.
Atualmente, outros 22 processos para a regularização de territórios quilombolas encontram-se em andamento na Superintendência Regional do Incra na Paraíba.
De acordo com a presidente da Associação de Apoio aos Assentamentos e Comunidades Afro-descendentes da Paraíba (Aacade-PB), Francimar Fernandes, das 35 comunidades remanescentes de quilombos identificadas na Paraíba, 33 já possuem a Certidão de Autodefinição expedida pela Fundação Cultural Palmares.
A festa, anunciada por rojões, foi animada pelo grupo de ciranda da comunidade quilombola Caiana dos Crioulos, do município de Alagoa Grande. Após a assinatura do ato de imissão de posse, foi servido um almoço com alimentos colhidos na comunidade.
“Quero dizer às outras comunidades que não desistam apesar das dificuldades. Se não fosse a resistência da comunidade nós não estaríamos aqui. Mas não paramos por aqui; ainda temos muito a conquistar e agora precisamos mais do que nunca da ajuda de todos, principalmente dos órgãos do Governo, com recursos financeiros”, disse Geraldo Gomes de Maria, 36 anos, ex-presidente da Associação de Moradores de Bonfim. “Daqui a dois anos nossa comunidade será outra. Vocês vão ver!”.
História de resistência
A propriedade, que abriga o Engenho Bonfim, atualmente desativado, foi vendida em 2004 e se transformou em área de conflito. Os novos donos tentaram expulsar os moradores, que estão na área há pelo menos 25 anos. Algumas famílias estão nas terras há mais de 90 anos.
Com o acirramento do conflito, e a partir do apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e da Pastoral dos Negros, a comunidade do Bonfim aos poucos foi tomando maior consciência de sua condição de negros e dos direitos que a sua relação com o território lhes confere. Em dezembro de 2004 redirecionaram sua demanda, antes voltada para a desapropriação para Reforma Agrária, e entraram com um pedido de certificação como comunidade remanescente de quilombo junto à Fundação Cultural Palmares, que emitiu a certidão de autorreconhecimento em 18 de abril de 2005.
Em função do acirramento do conflito envolvendo a comunidade e os novos proprietários, com ameaças inclusive a representantes do Incra, seu processo de regularização fundiária ganhou prioridade em relação aos demais.
Fome e maus-tratos
Até pouco tempo atrás, os homens das famílias do Bonfim trabalhavam no plantio da cana, na lida com o agave e na produção de rapadura e aguardente no engenho, na condição de trabalhadores-moradores. Recebiam salário irrisório, que, segundo eles, não dava para cobrir o que era comprado na mercearia, também propriedade dos donos do engenho. Os homens eram obrigados a trabalhar entre quatro a seis dias da semana no engenho em troca da moradia e de um pequeno espaço de terra para fazer roças.
Os administradores da fazenda sempre se mantinham vigilantes para impedir que o tamanho da área plantada aumentasse e, dessa forma, as famílias se viam obrigadas a comprar praticamente todos os gêneros alimentícios na mercearia.
Ainda não foram apagadas da memória dos mais velhos as recordações de períodos de fome, maus-tratos, inclusive físicos, por parte do proprietário ou de seus gerentes ou administradores. Na falta de alimento de qualidade, as famílias driblavam a fome com a polpa da semente da palmeira Macaíba.
“Antes a gente tinha dificuldade de ter o próprio alimento. Agora temos para sobreviver e ainda temos de sobra, para vender e comprar o que a gente não produz aqui”, afirmou, entre lágrimas, Geraldo Gomes de Maria.
Processo de Regularização De acordo com a antropóloga Maria Ester Fortes, do Serviço de Regularização de Territórios Quilombolas do Incra-PB, o processo de regularização fundiária de comunidades quilombolas é demorado, mas indispensável ao futuro das comunidades quilombolas, que têm visto suas áreas cada vez mais diminuídas com a especulação imobiliária.
As comunidades quilombolas são grupos étnicos predominantemente constituídos pela população negra rural ou urbana, que se autodefinem a partir das relações com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições e práticas culturais próprias. Estima-se que em todo o País existam mais de três mil comunidades quilombolas. Para terem seus territórios regularizados, as comunidades quilombolas devem encaminhar uma declaração na qual se identificam como comunidade remanescente de quilombo à Fundação Cultural Palmares, que expedirá uma Certidão de Auto-reconhecimento em nome da mesma. Devem ainda encaminhar à Superintendência Regional do Incra uma solicitação formal de abertura dos procedimentos administrativos visando à regularização.
A regularização do território tem início com um estudo da área, a elaboração de um Relatório Técnico que identifica e delimita o território da comunidade. Uma vez aprovado este relatório, o Incra publica uma portaria de reconhecimento que declara os limites do território quilombola. A fase final do procedimento corresponde à regularização fundiária, com a retirada de ocupantes não quilombolas através de desapropriação e/ou pagamento das benfeitorias e a demarcação do território.
Ao final do processo, é concedido título de propriedade coletivo, pró-indiviso e em nome da associação dos moradores da área, registrado no cartório de imóveis, sem qualquer ônus financeiro para a comunidade beneficiada. Os títulos garantem a posse da terra, além do acesso a políticas públicas como educação, saúde e financiamentos por meio de créditos específicos.
Atualmente, outros 22 processos para a regularização de territórios quilombolas encontram-se em andamento na Superintendência Regional do Incra na Paraíba.
De acordo com a presidente da Associação de Apoio aos Assentamentos e Comunidades Afro-descendentes da Paraíba (Aacade-PB), Francimar Fernandes, das 35 comunidades remanescentes de quilombos identificadas na Paraíba, 33 já possuem a Certidão de Autodefinição expedida pela Fundação Cultural Palmares.
Pb agora
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