terça-feira, 26 de abril de 2011

Bolsa-Família: fiador dos bilhões transferidos aos detentores da dívida pública.




Francisco de Oliveira

Dilma Roussef paga o preço de praticamente ter sido tirada do bolso do colete de Lula da Silva, então em pleno auge de popularidade, sem ter feito o longo e quase sempre desgastante trajeto de militância no PT. Embora eleita sem dificuldades, sua autonomia no governo é precária. Cem dias já decorreram da posse da presidente e ela ainda não conseguiu completar o segundo escalão; o próprio PT e os partidos “aliados” – diga-se empoleirados nos galhos da ampla coalizão que Lula forjou, – se esfalfam para conseguir os disputados lugares, e a presidente titubeia.. Para os áulicos, trata-se de cautela, já que ela mesma declarou que não nomearia ninguém que não tivesse competência técnica, apoiada pela política, para nenhum cargo. Sabe-se agora que Garibaldi Alves é um “notável” especialista em previdência social e Lobão, honrando o nome, “morde” tudo de energia, como mostrou quando ministro da pasta com Lula da Silva.

Ainda por cima, teve que engolir os nomes que Lula da Silva impôs. Dilma se vê às voltas com o chamado “fogo amigo”: seu gabinete dá a impressão de que é a “casa da Mãe Joana”, ou uma novela noir de baixas intrigas. Mantega, mantido no cargo devido aos serviços prestados a Lula da Silva quando este estava no ostracismo, depois de três derrotas para a presidência, e diga-se sem ambigüidades, um raro quadro de caráter dentro do PT, na verdade não formula a política econômica: desde Lula da Silva, são economistas-estrelas do firmamento da especialidade que são convocados periodicamente para orientar a política econômica. Os nomes são bastante conhecidos, e poupo-me de citá-los. Alguns estão no pedaço há mais de 30 anos! Mas Palocci, que não conseguiu voltar à Fazenda, conspira quase abertamente contra o ministro e teve agora a inusitada adesão de Luciano Coutinho, até então discreto à frente dos bilhões que administra autonomamente, e criticou a política cambial nada menos que em reunião com os mais altos membros da plutocracia capitalista no país.

Tanto a incompletude quanto as intrigas são produto e herança de Lula da Silva, que fez a proeza de transformar pobreza em ativo financeiro, isto é, em termos clássicos, vendeu a luta de classes no balcão dos negócios: o fiador dos bilhões transferidos aos detentores dos títulos da dívida pública interna é o Bolsa-Família. A velha fórmula romana do “pão e circo” se atualiza: LCDs das Casas Bahia para o “povão” – foi FHC que disse – e quase 300 bilhões para quem tem títulos da dívida pública interna. Quem vai fazer oposição a essa fórmula mágica?

Do outro lado, na oposição, a confusão não é menor: Aécio, tentando repetir as proezas do seu avô, um político conservador cuja morte o transformou em herói popular, morde e sopra. Prometeu um furacão no discurso inaugural do Senado e saiu uma espécie de “muito pelo contrário”, ou o conhecido “a montanha pariu um rato”. Serra debate-se num eterno “ser ou não ser”, sem nenhuma das qualidades shakesperianas para manter a chamada patuléia (o termo é de Elio Gaspari)em suspense. FHC voltou à carga na semana que passou, com um montão de platitudes, reconhecendo, só agora, passados quase vinte anos de fundação do PSDB, que ele é uma UDN reeditada, agora sem nenhuma chance de voltar ao poder. A velha UDN, desde o início já sabia de seu destino, e logo começou a chamar os militares para lhe darem o poder que os votos lhe negavam. Começou mesmo com o Belo Antonio Eduardo Gomes e terminou com o Corcunda do Nosso Drama, chamado também de Castelo Branco que por Ato Institucional cassou a existência da própria UDN e dos outros partidos políticos. Brincar com fogo queima, menino, dizia minha saudosa mãe há décadas.

Nada desse quadro se resolverá com a tão badalada reforma política. A questão é outra: é o tipo de crescimento econômico do nosso capitalismo periférico que colonizou inteiramente a política. Os partidos são a agonia dessa colonização. Não sem base popular: o crescimento econômico acelerado está levando a uma exasperação da luta entre os pobres, que lutam, depois de quatro séculos de abandono, por um lugar ao sol, isto é, por um LCD das Casas Bahia. Há uma degradação imensurável da luta de classes: de um lado, a burguesia transformou-se em gangues, e de outro os pobres, de classe regrediram para a pobreza mesmo; de São Marx para São Francisco. Há uma espécie de fascismo societal no ar. Oito milhões de espectadores assistiram ao Tropa de Elite 2, para se compensarem da frustração de que as Forças Armadas, subindo os morros do Rio, não cumpriram a promessa de liquidar com o crime organizado. Quer dizer, não cumpriram a promessa de acabar com a pobreza liquidando os pobres.

Wellington de Oliveira entrou em sua antiga escola e atirou, não a esmo, como ele já confessou através de vídeos previamente gravados, mas em membros de sua classe social, e, sobretudo, em garotas (é evidente o componente sado-masoquista que Freud explica). Ele não atirou em escolas do Leblon, mas em Realengo.

Viva o Brasil! Deve gritar Lula da Silva agora do alto dos milhares que cobra de empresas que sabem o que estão comprando, que não são as platitudes de Lula, mas o caminho dos fundos públicos.



Boitempo

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