quarta-feira, 2 de outubro de 2013

A Construção do SUS


Casa

Jandira Feghali

Dar forma a uma legislação ou a uma política pública a nível nacional é uma tarefa desafiadora. É como a construção de uma casa que, tijolo a tijolo, toma forma, mas que nunca chega ao fim. Um sonho se concretiza, mas há sempre um detalhe, uma correção, um aprimoramento. Recursos, gestão eficiente e bons profissionais são essenciais neste processo.

As leis e as políticas públicas são ferramentas poderosas no combate às desigualdades sociais, mas, a exemplo de nosso Sistema Único de Saúde (SUS), precisam de uma construção sólida, com alicerces fortes e planejamento.

Em três dias, nossa Carta Magna completa 25 anos de existência, feita a muitas mãos, opiniões, ideias e grande participação popular. Passados todos esses anos, a Constituição cidadã carece, ainda, de amarras. O SUS, criado à época, prossegue subfinanciado, com seus pouco mais de R$ 70 bilhões anuais. Valor bastante insuficiente para que postos de saúde, vacinas, hospitais, atendimentos especializados, equipamentos, insumos e bons profissionais, valorizados e bem remunerados, se transformem em acesso universal e de qualidade. Para tanto, seria necessário dobrar os investimentos.

Há caminhos para a saúde. Aliás, já galgamos alguns degraus com a promulgação da Emenda constitucional nº 29, que vinculou recursos para saúde. Outra vitória foi a destinação de parcela dos royalties do pré-sal para a saúde. No entanto, a própria OMS estabelece valores maiores para um sistema universalizado de saúde, e este tem sido o discurso dos governantes, sem que a solução viesse.

Os movimentos sociais organizados coletaram assinaturas para um projeto de iniciativa popular Saúde +10 destinando 10% da receita bruta do país. Temos visto propostas de alteração para 15% das receitas líquidas, e aqui agrego um debate fundamental e que traria, aproximadamente, R$ 20 bilhões a mais para a saúde: a contribuição social sobre grandes fortunas.

A proposta de taxação sobre grandes fortunas, projeto de lei complementar que relatei na Câmara dos Deputados, é uma realidade vivida em países como França e Espanha. No Brasil, grande parte do valor total, viria de menos de mil pessoas físicas, cujo patrimônio declarado ultrapassa os R$ 150 milhões.

É preciso reafirmar que o SUS é um modelo justo, democrático e universal. É um modelo que atende a um país de dimensões continentais e uma diversidade enorme. Mas, por isso mesmo, precisa de fôlego e um novo olhar sobre suas prioridades e necessidades. A taxação de grandes fortunas é uma saída viável e justa, visto seu caráter progressivo. O projeto tramita no Parlamento brasileiro, mas sem uma grande mobilização não avançará, pois enfrenta os interesses do capital em detrimento de uma política centrada em salvar vidas.

A Carta Magna nos deu garantias de que saúde, previdência e assistência social seriam integradas, formando um grande sistema de proteção social. Comemoramos, sim, esta construção democrática, mas queremos, precisamos e a Constituição nos garante muito mais. É uma obra trabalhosa e complexa. Um desafio que só se concretizará com muita disposição, recursos e, principalmente, com a aprovação das leis necessárias. Só assim os tijolos, fundamentais para estruturar a nossa casa, finalmente, se converterão em realidade para os milhões de brasileiros que dependem do SUS.

*Jandira Feghali é médica, deputada federal (PCdoB/RJ) e presidenta da Comissão de Cultura da Câmara.

Jornal do Brasil


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