sexta-feira, 27 de março de 2009
Mais do que paredes e teto
O Brasil conviveu, a partir do final do século XIX, com um dos processos de urbanização mais acelerados e improvisados do planeta. Dezenas de milhões de habitantes migraram das áreas rurais, que durante os primeiros séculos da vida do País eram o centro da vida econômica e social, para núcleos urbanos.
São Paulo, que um autor de meados do século XIX definia como “uma vila medíocre”, passou à condição de maior cidade da América do Sul. O Rio de Janeiro, graças à audaciosa intervenção do prefeito Pereira Passos, respaldado diretamente pelo presidente Rodrigues Alves, assumiu a condição de “cidade maravilhosa”.
O efeito correlato, no Rio, foi o surgimento das primeiras favelas, em que se instalou a população expulsas das localidades insalubres que deixaram de existir no centro urbano. E a transformação de São Paulo no núcleo mais dinâmico da economia semeou, ao redor do centro, primeiro a periferia e depois um colar de cidades dormitórios, com graves problemas urbanísticos.
Mudanças na economia jogaram populações enormes de um canto para outro de nosso território em períodos cada vez mais curtos. Nordestinos que, tangidos pela seca, vieram tentar a sorte no norte do Paraná, depois de algumas décadas de prosperidade, viram-se sem perspectiva de sobrevivência com a substituição das culturas do café pela soja. Reuniram o pouco que possuíam e foram tentar a sorte nas cidades do sudoeste paulista, nelas originando bairros desprovidos de estrutura, habitados por pessoas despreparadas para as exigências da vida urbana.
Fruto desse longo e desordenado processo é o nosso déficit habitacional que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva agora se propõe a enfrentar com uma proposta ainda precariamente alinhavada de construção de um milhão de moradias, boas partes das quais produzidas com custos subsidiados.
Num momento em que o País convive com as seqüelas de uma crise sem precedentes na economia mundial, a proposta de injetar pesados recursos na área habitacional - que absorve grandes quantidades de mão de obra e dinamiza dezenas de indústrias fornecedoras dos insumos necessários - tem pontos positivos.
Há, também, desafios enormes que não se sabe como serão enfrentados: a articulação com milhares de municípios, que nos planos subsidiados serão parceiros do projeto, fornecendo os terrenos; a garantia de que os novos bairros se integrem às áreas urbanas previamente existentes sem tornarem guetos.
indispensável definir os programas de saneamento que assegurem água e esgoto às populações que nele se instalarão; vencer a nossa falta de experiência com a produção em grande escala de moradias para os grupos sem condições de acesso a elas pela via do mercado e, último, mas não menos importante, o gerenciamento do bom uso dos recursos investidos e a fiscalização que garanta a qualidade da obra construída.
A moradia tem uma dimensão social e de qualificação para a cidadania. É bem mais do que um conjunto de paredes e teto. Garantir os recursos para construir um milhão de casas é apenas parte do desafio que o governo terá de enfrentar. O mais difícil é garantir que cada uma delas se torne um núcleo animado pelo sentimento de cidadania e pertencimento a uma comunidade. Esse, talvez, seja o maior desafio da proposta e o mérito desta depende de como ele venha a ser equacionado.
Antonio Carlos Pannunzio é deputado federal pelo PSDB-SP, membro da Comissão de Constituição e Justiça.
do blog do Noblat
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