quarta-feira, 25 de julho de 2018

Reencantar a educação

Michel Zaidan Filho

1. A escola como palco de disputas de projetos de hegemonia

É um grande equívoco, senão má fé, conceber a escola sem partido, tal como propôs o ex-ministro da Educação, Mendocinha, junto com o MBL e o deputado responsável pelo projeto de lei no Congresso. A escola é um aparelho atravessado por uma contínua luta de projetos de hegemonia, ou de uma hegemonia dominante e de contra-hegemonias. A escola não é um quartel, uma igreja ou um curso de formação de quadros partidários. É o espaço da disputa entre diversos projetos e leituras do mundo, a partir do processo argumentativo, do diálogo discursivo entre pessoas de boa fé e verazes. Aqueles que defendem a escola sem partido querem, na verdade, impor um único projeto de hegemonia, o seu. E proibir ou censurar os outros, criminalizando-os ou demonizando-os. Numa época em que o respeito à alteridade e diferença de gêneros, orientação sexual, etnia é um imperativo moral e pedagógico, esse projeto é autoritário.



2. Educação para vida/educação para o trabalho



Trabalhando com educadores e educadoras de meninas de ruas, no Recife, chegamos à conclusão que o ideal pedagógico para a escola pública, em tempo de exclusão social, é uma pedagogia do desejo, não do trabalho, em razão do processo de marginalização da sociedade e da própria escola. Este projeto pedagógico - que rejeita a educação de resultados e uma concepção triunfal da história - tem como principal objetivo o resgate da autoestima dos alunos, a sua fala, a sua história de vida, seus sonhos e a valorização de seu corpo. Seu escopo é a felicidade, não o sucesso profissional, a qualquer custo. E tem no mundo da cultura seu eixo principal. Lembrar o projeto integrado de educação, cultura e trabalho



3. Neste sentido foi proposto para a secretaria de Educação de Estado, através do programa "Protagonismo Juvenil" - uma agenda pedagógica adaptada a esses nossos tempos de globalização e mundo da cultura. Seus elementos principais seriam: A oralidade como forma de expressão; a cotidianeidade como estrutura social; a sociabilidade como fator de aprendizagem; o uso expressivo da linguagem; saber ler a escrita do mundo. E conceito de cidadania planetária ou cidadania em rede, cujos pilares é o ser-do-cuidado e o respeito à diferença. Parte-se do pressuposto que o mundo da juventude é o mundo da cultura, da informação, da economia política do signo ou da palavra.



4. Um projeto para as Universidades Públicas:



1.O imprescindível financiamento público-estatal ao ensino público de qualidade. Não pensar o gasto com a educação na relação custo-benefício, mas como investimento nas capacidades humanas. A PEC da morte. E a privatização do ensino público.

2. A inadiável necessidade da interiorização da Universidade Pública. A visão cosmopolita e universalista do saber não pode dar as costas às necessidades do local, regional. O global e o local sem fetichizar as raízes locais ou regionais, utilizar a ampla formação humanística a serviço das pessoas e comunidades locais.

3. Aprofundar a cultura inter, multi, transdisciplinar, que não separe o conhecimento, da beleza e da ética. Isto implica num novo conceito (ampliado) de razão. E não apenas sua limitação à chamada racionalidade instrumental. Avançar para o campo de uma razão lúdica, sensível.



4. A universidade como lugar da Utopia, do sonho, dos projetos de alteridade social. Não de atender às demandas do mercado ou do governo. Mas ter uma agenda aberta ao imaginário da sociedade.



FONTES:

A PEDAGOGIA DO DESEJO. Recife, Pindorama, 2000

Educação. Multiculturalismo e Globalização. NEEPD, 2006

"Em defesa da Universidade Pública". Diário de Pernambuco. 23/9/1999



Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia



Blog do Jolugue

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