sábado, 21 de julho de 2018

Rancor contra os funcionários públicos


Valerio Arcary

O tema da unidade da classe trabalhadora para lutar deve ser uma questão central para a esquerda. Esta unidade não é fácil de construir. Há uma luta ideológica por fazer. O rancor contra os funcionários públicos ainda é muito grande. Repousa na ideia que ganham, injustamente, mais do que os trabalhadores do setor privado da economia, e trabalham pouco. O barnabé preguiçoso, com o paletó descansando na cadeira, é uma caricatura clássica. O funcionalismo público era uma das poucas janelas de oportunidade para a melhorar de vida, se você nasceu em uma família de assalariados, humilde ou remediada, mas teve a oportunidade de acesso à educação. 

A demonização do funcionalismo público, nos meios de comunicação, começou com Collor e a denúncia dos "marajás", uma manipulação política para defender que o problema do Brasil era um Estado demasiado grande, corrupto, ineficiente. E, portanto, a legitimação da defesa de privatizações. 

Os salários no Brasil não são homogêneos, nacionalmente. Variam muito de região para região. São em geral muito baixos. A distorção nos salários entre o setor privado e público é real, e tem uma história. É muito maior no Brasil do que nos países vizinhos do Cone Sul. Mas não é tão incomum quanto se pensa. As razões são variadas e conhecidas. Uma das razões é que são um estímulo material para atrair talentos. Por isso, os concursos públicos são tão disputados. Salários mais altos na função pública não devem ser confundidos com corrupção. Isso é, simplesmente, falso 

No passado não existia contratação por concursos. Empregos públicos foram durante décadas uma sinecura. Uma sinecura era uma forma de manter aliados políticos recompensados e preservando lealdade. Mas, a partir de determinado momento da urbanização, a dinâmica da contratação foi mudando. O Estado passou a competir com o mercado pela mão de obra qualificada disponível. E ela era muito pequena. E a classe dominante precisava que alguns serviços públicos funcionassem, Não todos. Por isso, a tragédia educacional se mantém, O Estado paga, historicamente, salários mais altos do que o setor privado em função do atraso da transição de uma sociedade com uma economia agrário-exportadora, para uma sociedade urbanizada e industrializada. 


O peso esmagador da fração agrária até à revolução de trinta atrasou o país em tal escala, que até a oferta de mão de obra, minimamente, qualificada ficou comprometida. O atraso educacional brasileiro é, até hoje, abominável. Menos de 10% da população adulta tem proficiência alta na língua portuguesa. Quase um terço da População Economicamente Ativa é iletrada em graus variados. Educação pública foi e continua sendo um serviço caro. Essa é uma das razões pelas quais devemos todos cerrar fileiras na defesa das reivindicações dos professores por aumentos de salários.

O ressentimento social contra o funcionalismo, em especial em camadas inferiores da classe média urbana, de heranças pequenas, quase sempre de origem imobiliária, e níveis médios de escolaridade permanece, portanto, grande. E exerce pressão sobre trabalhadores do setor privado. Este rancor tem sido uma das bases sociais da direita reacionária. Precisamos construir pontes para que a unidade seja possível.

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