terça-feira, 23 de maio de 2017

Concertação nacional: distribuição de renda, ajuste fiscal e lava jato

O impeachment deste ano

Celso Rocha Barros

Como parte das comemorações de um ano do impeachment de Dilma Rousseff (PT), Michel Temer (PMDB) resolveu cair.

Temer ainda está lá, Moreira e Padilha ainda o chamam de presidente, o porteiro do palácio o deixa estacionar o carro, de vez em quando ele usa faixa. Mas desde quarta-feira passada (17) sua agenda é não ser preso. Não é fácil durar assim até janeiro de 2019.

Não é impossível. Temer pode se oficializar como o governo do acordão e partir para cima das investigações. Facilitaria aprovar as reformas, inclusive. Mas a opinião pública talvez ficasse meio chateada, e em 2018 tem eleição.


O áudio de sua conversa com Joesley Batista, executivo da JBS e bandido, deixa margem a algumas dúvidas. Por exemplo, Temer diz "tem que manter isso aí" pouco depois de ouvir Joesley dizendo que pagou suborno atrasado para Eduardo Cunha. Talvez Temer estivesse apoiando um cala-boca. Mas talvez só estivesse elogiando que suborno seja sempre pago em dia.

É inteiramente fora de dúvida, entretanto, que Temer respondeu "ótimo" quando Joesley lhe contou que comprava procuradores e juízes. Não há qualquer dúvida de que Temer indicou o deputado Rodrigo Loures (PMDB-PR) para fazer o meio de campo para Joesley junto ao primeiro escalão do governo.

Durante algumas horas de quarta-feira a queda pareceu iminente. PSDB e PPS romperam com o governo, MBL e Vem pra Rua convocaram manifestações. Mas o surto de coragem passou rápido, e logo a turma toda estava dando a Temer um grau de benefício da dúvida que, se aplicado ao caso de Lula, o absolveria mesmo se aparecesse um vídeo do petista fazendo ménage à trois com Léo Pinheiro e Satã no pedalinho de Atibaia.

O recuo foi rápido e bem orquestrado. A movimentação por eleições diretas apavorou a centro-direita, que não tem um candidato forte para agora.

Mas a trégua não deve durar. O mais provável é que Temer tenha só ganhado tempo até que se ache uma solução política que preserve as reformas.

O que eu gostaria que acontecesse?

Que se encontrasse uma saída constitucional para realizar eleições diretas. Que seguíssemos a sugestão de Clovis Rossi na semana passada: eleições com uma concertação nacional que garanta que o governo eleito aplique um programa minimamente consensual. Na minha versão, esse programa preservaria as linhas gerais do ajuste e a Lava Jato, conciliando-o com medidas de redistribuição de renda, como as sugeridas por Laura Carvalho.

O que é provável que aconteça?

Uma eleição indireta que garanta a continuidade disso aí até 2019. Há dúvidas se o presidente-tampão será eleito pelo Partido do Acordão com Suruba (PDACS), pelo Partido do Ajuste e o Resto que se Dane (PDAEORQSD) ou pelo Partido do Pelo Amor de Deus Pelo Menos Alguém Honesto (PPADDPMAH).

Enfim, o impeachment desse ano é ainda mais melancólico do que o teatro tosco do ano passado, mas pelo menos não tem aqueles balõezinhos idiotas.

Que pelo menos a falta de entusiasmo nos torne lúcidos: a crise é sistêmica, como já explicado aqui. Nenhum desses sujeitos é pior do que nós. A maioria deles seria honesta sob outras regras e/ou sob risco de punição. Tanto as regras quanto o risco de punição estão mudando, e a questão é como atravessar essa transição até que outra geração já entre jogando o jogo novo.

http://www1.folha.uol.com.br/

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