sábado, 11 de junho de 2016

Ativismo Político na Justiça fere Constituição


Rene Carvalho

Um beco sem saída.
 

O ritmo da política brasileira vem sendo ditado pelas ações da lava a jato e da Procuradoria Geral da República. É uma avaliação quase consensual entre os que procuram acompanhar a política nacional. Qualquer dúvida se por ventura ainda houvesse, poderia ser facilmente dirimida pela leitura dos principais jornais e revistas dos últimos quinze meses. A magnitude dos atos de corrupção investigados, o desprestígio da classe política e o bombardeio permanente da mídia acabaram tornando quase natural essa transformação de investigadores e promotores nos atores mais relevantes da política nacional.
 


É preciso estar atento ao fato de que isso representa, no entanto, uma dupla inversão que afeta os fundamentos da democracia. Uma inversão da legitimidade das decisões políticas, que constitucionalmente é dada por mandatos que o povo determina através do voto. Têm-se aqui, ao invés, atores que se tornam relevantes e mesmo decisivos, tendo sido apenas concursados, e não dispõem de qualquer delegação popular. Uma inversão de prioridades: por mais relevo que se dê ao combate à corrupção, todos temos de convir que o combate à crise econômica, o aperfeiçoamento da democracia e a continuidade do processo de inclusão social são pautas prioritárias.
 

As instituições públicas têm a obrigação e o dever de imparcialidade e do respeito à Constituição. Em investigações que envolvem temas políticos nacionais a imparcialidade separa a investigação da manipulação política. Em investigações desse tipo há muitas oportunidades de desvio. A definição das linhas prioritárias de investigação e interrogatório, a escolha de quem será investigado e de quem não vem ao caso, penas de prisão diminutas ou excessivas. Os vazamentos de informações sob sigilo são uma séria falta profissional. Mais grave ainda, entretanto é a escolha de que depoimentos vazar e o planejamento dos momentos políticos mais indicados para fazê-lo.
 

Quando isso acontece, e de forma sistemática, ninguém mais fica ao abrigo das leis e da Constituição. Hoje são atingidos inimigos políticos. Quem virá depois? Mas são corruptos. Sim, mas há corruptos em muitos horizontes políticos, porque escolher matizes? Além de ser contraditório: quando se prioriza efetivamente a luta contra a corrupção não se deve abandonar a imparcialidade e o estrito cumprimento da legislação sob pena de invalidar informações obtidas e condenações. Comete-se assim um grande desserviço à luta contra a corrupção.
 

Em resumo: o ativismo político de instituições públicas de investigação e justiça fere a Constituição e tende a fazê-las se substituir à população na definição dos rumos do país. Ataca a corrupção, mas invalida os resultados que contra ela obtêm. Tem forte impacto político, pois opera uma inversão de atores relevantes e de pautas políticas. Mas conduz a um beco sem saída democrática. Ao se substituírem ao voto popular, tornam-se prisioneiros da armadilha autoritária que elas mesmos criaram: não há solução democrática sem dar de novo voz à população, mas o que fazer se novas eleições “trazem o risco” de que sejam eleitos presidente e deputados em quem os investigadores e promotores não confiam?



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