sábado, 11 de junho de 2016

Associação de Juízes manifesta preocupação com operação contra o magistrado Luís Carlos Valois


Populismo Penal
Ontem, 9 de junho, foi executado mandado de busca e apreensão no gabinete e na casa do Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas Luís Carlos Valois, em Manaus. Valois, assim como a desembargadora Encarnação das Graças Salgado, são alvos da chamada operação "La Muralla", da Polícia Federal, deflagrada no último ano, cuja investigação se dá sobre suposto envolvimento dos juízes "com organização criminosa".

A busca da PF causou comoção nas redes sociais entre magistrados e ativistas pelos direitos humanos, uma vez que Valois têm uma carreira na magistratura e na academia em favor de posições mais progressistas no Direito, em especial pela defesa dos direitos dos encarcerados e encarceradas.

O desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo e colunista do Justificando Marcelo Semer salientou que o momento, no país, é delicado e caminha ao retrocesso. Para ele, no entanto, "tudo o que não podemos fazer é confundir ideologia com suspeita, nem independência com submissão", e que o momento, agora, é de se "esclarecer quem é Valois".

Na mesma esteira de pensamento, a Associação Juízes para a Democracia, entidade não governamental e sem fins corporativos, publicou hoje nota de "preocupação" pelas ações policiais empreendidas contra o Juiz, uma vez que suas decisões costumam ter viés garantista e contrárias ao populismo penal.

"Diante disso, a Associação Juízes para a Democracia espera que a ação policial de busca e apreensão, ocorrida em 09 de junho de 2016, sobre a autoridade judicial em questão, não tenha sido tomada com base em suas posturas libertárias. A defesa das liberdades públicas é dever constitucional atribuído a todo magistrado, não podendo servir de suporte, ostensivo ou oculto, para tornar um juiz suspeito ou investigado", afirmaram os juízes na nota.
 

Leia a carta na íntegra

A ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA, entidade não governamental e sem fins corporativos, que tem por finalidade estatutária o respeito absoluto e incondicional aos valores próprios do Estado Democrático de Direito, vem a público externar preocupação decorrente das ações policiais empreendidas contra o Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas Luís Carlos Valois, em 09 de junho passado, nos seguintes termos.

O Juiz de Direito Luís Carlos Valois tem, ao longo dos anos, realizado importante trabalho jurisdicional na garantia dos Direitos Humanos, especialmente em relação a uma parcela absolutamente excluída da população, que é aquela que lota o sistema carcerário do país.

Sua postura garantista não é uma postura recente e nem tampouco dirigida especificamente a um ou outro custodiado. Trata-se de postura permanente e coerente com princípios de prevalência das liberdades públicas sobre um Estado policial que, em que pese as garantias previstas na Constituição Federal de 1988, tem mostrado preocupante crescimento, simbolizado pelo fato do Brasil ter alcançado a posição de quarta maior população carcerária do mundo.

Essa mesma postura é a adotada na atividade acadêmica de Luís Carlos Valois. O doutorado em Direito Penal que conquistou na Universidade de São Paulo também focou a defesa das liberdades públicas imprescindíveis a qualquer Estado Democrático de Direito, seriamente ameaçadas pela irracional guerra às drogas, discutida na tese que publicou.

Infelizmente, em plena democracia, muitos ainda enxergam com estranheza juízes que têm a coragem de não aderir ao populismo penal; que preferem a liberdade sobre a prisão; que se opõem ao tratamento da questão social como caso de polícia ou que fiscalizam, com o rigor exigido pelo vigente texto constitucional, a atividade punitiva do Estado.

Diante disso, a Associação Juízes para a Democracia espera que a ação policial de busca e apreensão, ocorrida em 09 de junho de 2016, sobre a autoridade judicial em questão, não tenha sido tomada com base em suas posturas libertárias. A defesa das liberdades públicas é dever constitucional atribuído a todo magistrado, não podendo servir de suporte, ostensivo ou oculto, para tornar um juiz suspeito ou investigado.

Tal como constante em outros documentos já publicados, a Associação Juízes para a Democracia reitera que Judiciário adaptado à Constituição é o Judiciário que aceita o pluralismo de ideias a aperfeiçoar o próprio funcionamento dos tribunais. O livre debate e as opiniões divergentes, exteriorizadas em decisões judiciais, configuram exigências democráticas.

São Paulo, 10 de junho de 2016.

A Associação Juízes para a Democracia

Justificando

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