sexta-feira, 3 de abril de 2015

Política de alianças para enfrentar o golpe legislativo contra Dilma


José Reinaldo Carvalho *

Os comunistas e o conjunto das forças da esquerda consequente orientam-se no Brasil há muito tempo pelo princípio da acumulação de forças, no que joga papel decisivo uma bem formulada política de alianças com sentido estratégico e tático.

A saída da atual crise política depende da criação de uma frente ampla em torno do governo da presidenta Dilma Roussef, o que inclui todos os partidos, personalidades independentes e movimentos sociais que tenham compromisso com a democracia e os interesses nacionais.É indispensável a recomposição da base de sustentação do governo no parlamento, a confiança na coalizão governamental, a aliança com o PMDB ou com os setores desse partido dispostos a isto, a correta convivência entre os poderes Executivo e Legislativo. Até mesmo a neutralização de setores da oposição é válida, cultivando relações de alto nível no terreno administrativo com os governadores, independentemente dos partidos a que pertençam.

A questão chave é retomar a iniciativa política. isolar e combater, sem qualquer ilusão, o inimigo principal - o PSDB e o bloco de forças que lidera.

A ampla unidade das forças democráticas e patrióticas foi a linha política e a metodologia que construíram a vitória em quatro sucessivas eleições presidenciais e o êxito dos três mandatos, de 2003 até aqui.

O simbolismo maior desta linha e deste método foi a aliança com forças do centro democrático. Lula teve a ousadia de compor a chapa presidencial com o grande empresário nacional José Alencar, que transitou de posições políticas em partidos de centro-direita para uma relação leal com a esquerda. O político e empresário mineiro compreendia com clareza o quadro econômico e geopolítico mundial, no qual ressaltava o papel da China, cultivou estreitas relações de confiança mútua com o PCdoB e foi um incansável batalhador contra a especulação financeira e a política de juros altos, que tanto afetava a produção nacional, sendo o maior aliado de Lula no empenho para contornar os malefícios do neoliberalismo na política macroeconômica, então conduzida por Antonio Palocci.

Veio em seguida o grande acordo com o PMDB, cujo presidente, Michel Temer, muito embora tendo sido um dos mais engajados aliados do PSDB na campanha que resultou na reeleição de Lula, em 2006, foi acolhido pela coligação liderada pelo PT e a então candidata Dilma Rousseff, de quem o político paulista foi candidato a vice. Vitoriosa a campanha em 2010, Temer cumpriu com zelo e lealdade sua função de vice-presidente, o que o credenciou a permanecer nessa mesma condição nas últimas eleições de 2014.

Muito embora as naturais discrepâncias entre o PMDB, o PT e o conjunto das forças progressistas, inclusive os comunistas - porque o PMDB, como partido centrista, desde que aderiu à aliança governista sempre atuou em função de seus interesses próprios e muitas vezes como freio às reformas estruturais mais avançadas -, teve seus espaços sempre garantidos. Um dos seus maiores próceres, o senador Renan Calheiros, deve a posição que ocupa de presidente do Senado aos acordos selados e honrados pelo governo e seus principais aliados de esquerda – o PT e o PCdoB. O mesmo ocorrera com o ex-presidente José Sarney a quem – faça-se justiça - na relação com Lula e o PCdoB nunca faltou dignidade. Guardo no meu caderno de notas, antológicas frases do João Amazonas sobre a sua relação com o ex-presidente da República, durante cujo mandato (1985-1990) o PCdoB foi legalizado.

Destarte, não é justo que se debite a atual crise política e o divórcio entre o senador alagoano e o governo da presidenta Dilma a “erros de condução política” da mandatária, à qual Renan, em parceria com o presidente da Casa vizinha, decidiu unilateral e intempestivamente fazer furibunda oposição. Corrijo-me, intempestivamente não, porquanto o surto oposicionista do presidente do Senado tem registro em horas, minutos, segundos e até os décimos de segundos: o exato momento em que passou a figurar na lista de investigados da Operação Lava Jato, com o que inaugura um novo princípio dos cânones de vendeta – o “direito” de vingar-se de quem nunca lhe fez mal.

As colunas políticas estão recheadas também de atribuições de culpa à presidenta Dilma e até da exigência de “autocrítica”, por não ter concertado uma aliança com o deputado Eduardo Cunha, que venceu as eleições à presidência da Câmara dos Deputados. Ora, Dilma, o PT, o PCdoB e qualquer outro partido digno de ser rotulado como de esquerda não poderiam, sequer por hipótese, apoiar o deputado peemedebista, pois isto equivaleria a dormir com o inimigo. Cunha é um conotado direitista, para ficarmos apenas na discussão ideológica. Defende o que há de mais retrógrado – política e culturalmente. Está dando sobejas demonstrações disso no exercício da presidência da principal casa legislativa. Sem cerimônia ataca diuturnamente o governo, faz aberta campanha oposicionista, no parlamento e nas ruas. Revela-se como furioso opositor da esquerda e os valores republicanos progressistas.

A mudança de posição de Renan Calheiros – de situacionista a oposicionista - e a vitória de Cunha na Câmara criaram uma situação nova na relação entre o governo e o legislativo. Seria exaustivo enumerar aqui a quantidade de ações deletérias que em poucas semanas a dupla cometeu contra o governo e os interesses nacionais. De tal maneira que resulta ingênuo considerá-los aliados que estão apenas demonstrando “insatisfação” a supostos ou reais maus tratos deste ou daquele senador, deputado ou ministro da base aliada. Não. Falemos claro, estão tentando chantagear o governo. Inglório empenho, conhecendo-se o caráter da principal mandatária do país, reeleita em outubro passado.

Estas considerações não ignoram a gravidade da situação política nem divergem da opinião de que para superá-la é necessário recompor a base de sustentação do governo no parlamento. Com a palavra a presidenta Dilma e o vice-presidente Michel Temer no rearranjo dos laços com o PMDB. Quanto aos chefes de turno das duas casas congressuais, deve falar mais alto a Constituição, que estabelece o presidencialismo como forma de governo. Se desejam implantar o parlamentarismo, têm a prerrogativa de propor uma revisão constitucional por meio de plebiscito. Fora desses ritos, o “parlamentarismo de facto” de Renan e Cunha não passa de projeto de golpe legislativo contra Dilma.

Ledo engano afirmar que Dilma não domina o mister político. Estadista, defende a soberania nacional e luta por um novo lugar do Brasil no mundo, cultiva a boa governança, tem senso de justiça, perspicácia, visão progressista e noção de que é necessário unir o povo e a nação. É criticada por suas virtudes, pois não se vende nem se rende às chantagens dos politiqueiros. Está movendo-se com maestria. Saberá contornar a crise e liderar o país.

* Jornalista, Diretor do Cebrapaz, membro da Rede de Intelectuais em Defesa da Humanidade e editor do Vermelho.

Vermelho


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