terça-feira, 10 de setembro de 2013

Chile, 40 anos depois


Vladimir Safatlee

Amanhã fará 40 anos que o Chile passou por um dos mais brutais golpes de Estado da história recente. País historicamente avesso a intervenções militares, o Chile era, até 11 de setembro de 1973, um dos mais inovadores laboratórios de transformação social do Ocidente.

Salvador Allende liderou um governo que procurava, ao mesmo tempo, superar índices vergonhosos de desigualdade econômica, enquanto aprofundava mecanismos de democracia direta e de respeito às estruturas da democracia parlamentar.
Seu caminho era uma via inovadora entre as sociedades burocráticas do Leste Europeu e as dos países capitalistas.

Na verdade, tal caminho encarnava o medo mais profundo de países como os EUA em plena Guerra Fria. Tratava-se do medo de uma experiência capaz de aproximar práticas socialistas de redistribuição de riquezas com uma democracia pluripartidária.

Por isso, Salvador Allende foi vítima de um conjunto de ações de sabotagem econômica e de criação de clima de instabilidade política que mereceriam levar Henry Kissinger, então secretário de Estado norte-americano e hoje saudado como grande diplomata, ao banco dos réus do Tribunal Penal Internacional. Tais ações encontram-se fartamente registradas em documentos norte-americanos que passaram, nos últimos anos, ao domínio público.

Mesmo sendo vítima dessa política covarde, os votos aos partidos da base de Allende cresceram nas eleições legislativas de 1973, o que redundou em aumento da participação parlamentar. Estava claro que a única saída para derrubá-lo seria o golpe.

Alguns gostam de relativizar o período Pinochet, apelando para a falácia de que, apesar da ditadura, foi um momento de crescimento econômico e riqueza. Eles procuram esconder que, entre 1950 e 1971, o PIB chileno cresceu, em média, 2% ao ano. Já entre 1972 e 1983, ele recuou (sim, recuou) 1,1%. Foi apenas nos últimos cinco anos, com o comando econômico de Hernán Büchi, que o governo Pinochet conseguiu recuperar-se parcialmente desse abismo.

Mesmo assim, em 1970, a relação entre o PIB por habitante do Chile e o dos EUA era de 35,1%. Em 1992, esse mesmo índice era de 33,6%. O mínimo que se pode dizer é que os liberais latino-americanos têm uma concepção bastante peculiar do que devemos entender por "sucesso".

Hoje, com os chilenos voltando a descobrir a força das ruas, que redundou em manifestações populares massivas por serviços públicos de qualidade, e prestes a despachar o impopular único governo direitista de sua história recente, pode-se dizer que a experiência de Allende não foi em vão.
 

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