quinta-feira, 3 de março de 2016

A caça ao ex-presidente Lula e a banalidade do mal



Nicolas Chernavsky*

O mal não é necessariamente a maldade. O mal também surge das coisas funcionarem mal, como a grafia das palavras nos indica. Quando alguém compreende mal a realidade, pode muito bem fazer o mal. Daí surge a banalidade do mal.

Na caça ao Lula atualmente em vigor no Brasil, apesar de haver algumas mentes que arquitetam a caça, uma infinidade de elos na cadeia que tenta levar Lula à prisão é realizada por pessoas que nada têm de conservadorismo sofisticado. São pessoas extremamente parecidas a uma infinidade que conhecemos durante a vida, sendo que muitas dessas até são nossas amigas. Em geral são antipetistas convictos(as) que alcançaram um alto nível de hostilidade ao PT (entendido “PT” como um conjunto composto por PT, PCdoB, grande parte do PSOL, CUT, MST, qualquer coisa comunista, socialista ou que use muito a cor vermelha, entre outros movimentos sociais).


Assim, uma vez que a caça ao Lula e sua eventual condenação sem provas por qualquer coisa com o intuito de tirá-lo da eleição de 2018 seria um prejuízo enorme para a qualidade da democracia brasileira (pois Lula é um eventual pré-candidato presidencial com chances reais), a defesa da democracia brasileira passa por trazer esta caça ao Lula à luz, justamente para que essa infinidade de pessoas que fazem os elos desta caça quase automaticamente reflitam sobre a diferença entre “achar” que Lula é culpado e haver provas incontestáveis no processo legal de sua culpa. “Achar” é uma questão política que se expressa nas urnas. Prender alguém é algo diferente, que precisa de provas.


Se analisarmos os movimentos nas instituições, veremos que, apesar de algumas pessoas chaves provavelmente terem uma ideia estratégica de como caçar o Lula, essa estratégia não daria certo se não houvesse inúmeras pessoas, entre procuradores(as), delegados(as), juízes(as), policiais, jornalistas e burocratas de todos os tipos que foram chancelando como correias de transmissão as decisões estratégicas da caça. E porque chancelam essas decisões? Será que é só porque são muito antipetistas? Ou há algo mais? Há algo mais.

As pessoas estão imersas em um caldo de cultura no qual têm um trabalho, que lhes dá um salário, com o qual fazem suas compras, vão à praia no fim de semana, jogam videogame ou vão naquele restaurante legal. E nesse cotidiano, a televisão que está no consultório médico, no bar, no cabeleireiro e no clube dá a entender que Lula é culpado. Não é fácil ver muito mais além dessa bolha: ver que coisas como a caça ao Lula são o que limita seu salário, o que enrijece e estende seu horário de trabalho, o que destrói a natureza e envenena sua comida, o que lhe tira a possibilidade de viver pra sempre já que se investe tão pouco proporcionalmente na longevidade humana.

Nessa caça ao Lula, o que podemos fazer é não só tentar fazer com que a lei seja cumprida, mas também mostrar o quão forte é o componente antipetista nessa caça. Se isso for conseguido, ou seja, se o povo brasileiro entender que esta caça está sendo feita com aquele espírito de opinião política que deveria se expressar nas urnas, e não nas instituições estatais, este povo será capaz de, nas urnas, desfazer qualquer equívoco dessas instituições. Pois o mal pode ser banal, mas o bem não.

*Nicolas Chernavsky é jornalista formado pela Universidade de São Paulo (USP), editor do CulturaPolítica.info e colaborador do Pragmatismo Político

 

 Pragmatismo Político







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