sexta-feira, 21 de junho de 2013

A periferia sempre esteve acordada



Natasha Ísis

Enquanto muitos gritam que “o Brasil acordou”, a periferia avisa que nunca dormiu. A repressão ao movimento que ocupou as ruas do Rio de Janeiro é rotina nas favelas cariocas e as pautas levantadas pelos manifestantes também têm muito a ver com os direitos exigidos há anos pelos moradores da periferia.

Por isso, líderes comunitários têm mobilizado os moradores desses lugares para fortalecer a cidadania que desfila pelas avenidas da cidade mais uma vez nesta quinta-feira (20). De forma mais organizada para ganhar visibilidade, os grupos já estão reunidos no Largo São Francisco de Paula para irem juntos ao ato. A redução das tarifas de transporte público, anunciada na última quarta-feira, 19, não desanimou a população, que considera a atitude dos governantes apenas uma primeira (e pequena) vitória.

- O prefeito obviamente cedeu à pressão e viu nisso uma chance de desmobilizar o movimento. Mas vamos continuar lutando não só pela redução da passagem, mas também pela melhoria do serviço, que aqui em Campo Grande, por exemplo, é extremamente precário – diz Tainá Gamelheiro, membro do Núcleo Socialista de Campo Grande.

Junto com um grupo de estudantes e educadores de Campo Grande, Gamelheiro realizou uma panfletagem pelo bairro da Zona Oeste para alertar a população local sobre o que está acontecendo. O grupo também levará para o ato outros eixos de reivindicação, como o debate sobre a democratização dos meios de comunicação, já que o aumento da passagem declaradamente não é a única questão para os manifestantes.

- O aumento da passagem foi o estopim, temos outras coisas para discutir. Só no Alemão temos diversas pautas a serem abordadas. A principal questão que vamos levar é a paralisação das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). As obras custaram R$ 1 bilhão e 80% disso foi gasto no teleférico. O que você vê hoje aqui é uma cidade fantasma. Tudo abandonado, quebrado, zero saneamento. Inclusive a mobilidade piorou por aqui, já que deixaram muitas obras abertas. – conta Maycom Brum, morador do Complexo do Alemão e parte do movimento Ocupa Alemão.

De acordo com Maycom, a população do Alemão já participou de outras manifestações, além dos movimentos pontuais realizados na própria comunidade. Hoje, os diferentes grupos da periferia irão levar as suas reivindicações, cada grupo com seu grito. É o que confirma também Diego Santos, jornalista nascido e criado no Borel:

- Vamos levar cartazes, com nossas bandeiras. É desta forma que vamos dar visibilidade a nossas reivindicações. Eu e muitos outros jovens aqui do Borel, vamos pra rua reivindicar desde saneamento básico, até o combate ao extermínio de jovens negros.

A falta de infraestrutura nas favelas é grande e a violência, especialmente nas que têm UPP. Nessas favelas tem muita arbitrariedade da polícia.

No Borel, a convocação para o ato também foi feita via rede social, atitude que tem caracterizado todo o movimento. Segundo Diego, muitas favelas da cidade combinaram pontos de encontro dentro da comunidade para irem juntos à manifestação. Os moradores sentem a necessidade de aproveitar o momento para frisar o que têm reivindicado há

- Não foi a rua que nos pautou, já estamos pautados por nossas próprias vicissitudes desde sempre – lembra Mônica Francisco, do grupo Arteiras e membro da Rede de Instituições do Borel.

É também o que aponta Aline da Cunha, estudante de Serviço Social e moradora do Borel:

- Até então, as lutas eram divididas. A manifestação foi um estopim. Com a explosão veio à tona a precariedade na saúde, educação, habitação e tantas outras coisas. Como moradores de favelas, sabemos que tudo isso, saúde, educação, é muito mais precarizado onde moramos.

Por sua vez, o momento de explosão da cidadania que as ruas estão testemunhando é considerado de grande importância para a periferia. É o que acredita Igor Soares, 17 anos, estudante do ensino médio e morador do Borel:

- Se minha voz como morador de favela não era ouvida antes, agora são cem mil pessoas gritando junto comigo. É um momento rico. Sei que precisamos avaliar muitas coisas ainda, mas é agora. O fato de as tarifas terem baixado, quer dizer que a rua tem força. Reivindicar a favela neste momento é uma oportunidade. Me dá mais força para lutar pela minha comunidade.

Ibase

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