domingo, 27 de setembro de 2009
Xingar alivia a dor, sugere estudo de psicólogo britânico
De vez em quando, vale a pena esquecer o que os pais e as aulas de boas maneiras ensinaram: em momentos de dor, xingar pode ajudar, e muito.
A descoberta partiu de um estudo coordenado pelo psicólogo Richard Stephens, da Universidade Keele, na Inglaterra.
Intrigado com o uso automático de palavrões como reação imediata ao sofrimento físico, Stephens decidiu investigar o papel das expressões ofensivas na resposta do corpo à dor.
Fez um experimento com 67 estudantes: mergulhou a mão deles em um recipiente com água extremamente gelada e deixou que proferissem todos os xingamentos que quisessem. Em um segundo momento, repetiu a experiência, mas não foi permitido que falassem palavrões. Quando xingaram, resistiram por 30 segundos a mais à baixa temperatura.
O estudo constatou que dizer palavrões aumenta os batimentos cardíacos e diminui a percepção da dor. Tais efeitos podem ocorrer porque praguejar induziria no corpo a anulação do vínculo entre medo e percepção da dor. Uma ressalva: recorrer a palavrões não amenizaria os padecimentos de homens acostumados a usar essa linguagem. Para se beneficiar da "boca suja", é necessário utilizá-la com moderação.
Antes de mergulhar no território do baixo calão, Richard Stephens, 41, já investigou os efeitos cognitivos da ressaca, das repetitivas cabeçadas realizadas por jogadores de futebol e até do hábito de mascar chicletes. Abaixo, trechos da entrevista concedida à Folha.
Folha - O que o levou a pesquisar a relação entre palavrões e dor?
Richard Stephens - Um dia, trabalhando no jardim da minha casa, acertei um dedo com o martelo e minha reação foi falar palavrões. Em outro momento, há quase cinco anos, enquanto minha mulher dava à luz nossa filha, ela xingou um pouquinho e então pediu desculpas. Foi quando uma enfermeira lhe disse: "Não se preocupe, a gente ouve palavrões durante o parto o tempo todo".
Isso me fez pensar na ligação entre xingamentos e dor. Comecei a ler sobre o que já existia escrito a respeito do tema e, ainda que houvesse trabalhos sobre o porquê de as pessoas xingarem, ninguém tinha se proposto a entender por que as pessoas tinham na dor um estímulo para dizer palavrões.
Folha - Xingar traz analgesia?
Stephens - Xingar é uma linguagem emocional. Quando xingamos, desencadeamos efeitos emocionais nas pessoas e em nós mesmos. E isso pode ser útil para fazer com que sintamos menos dor. O estudo mostra que xingar aumenta os batimentos cardíacos, o que sugere uma resposta emocional.
E outra pesquisa indica que, se você tem uma resposta emocional do tipo "lutar ou fugir" [reação de defesa do organismo quando percebe ameaças externas ou tensões psicológicas internas], então sua tolerância à dor aumenta. O que mostramos é a mesma coisa, mas usando meios diferentes para disparar essa resposta, que foi o palavrão.
Folha - Em seu trabalho científico, o sr. vem se ocupando de aspectos bastante triviais do cotidiano, como chicletes, futebol e palavrões. Por que estuda esses temas?
Stephens - Eu olho para o que acontece no dia-a-dia e penso nessas coisas a partir de uma perspectiva psicológica. E então estudo e investigo o que me parece interessante.
Como professor, descobri que a maioria das coisas são pesquisáveis, e esses assuntos sempre estimulam a imaginação dos meus alunos.
DENISE MOTA
colaboração para a Folha de S.Paulo
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