quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Conectas aponta conivência com tortura por Judiciário e MP em audiências de custódia


Foi lançada hoje, 21, a pesquisa Tortura Blindada: Como as instituições do sistema de Justiça perpetuam a violência nas audiências de custódia, no Memorial da Resistência de São Paulo. Realizado pela ONG Conectas Direitos Humanos, o estudo traz dados alarmantes sobre a prática da tortura durante as audiências de custódia, através de depoimentos, estatísticas e investigação.



As audiências de custódia foram implementadas após muita resistência pelas carreiras jurídicas. Prevista no Pacto de San Jose da Costa Rica, significa da apresentação do preso e da presa a um juiz de direito em até 24h após a prisão. A medida visa tanto desafogar o sistema prisional, para evitar prisões mantidas de forma desnecessária, como também para fiscalizar ocorrência de abuso e tortura em sede policial.



No entanto, o que o estudo da Conectas revela é que muitas pessoas são vitimas de tortura na audiência de custódia não encontram amparo no sistema de justiça. Rafael Custódio, coordenador da pesquisa, afirmou durante o evento que as torturas em audiências de custódia não estão sendo identificadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).



“Pela primeira vez no Brasil fomos descobrir institucionalmente o que acontecia nessas audiências. Só coletamos os dados em que houve relato, ou por outras fontes, como marca de sangue e hematomas”, disse. Outro aspecto apontado por Rafael que a pesquisa revela são relatos de “kits torturas” dentro da viatura policial no momento da prisão.



Em 80% dos casos em que na audiência de custódia houve denuncia de tortura, houve omissão promotor em não transmitir o relato ao juiz. Nos outro 20% dos casos em que a denuncia foi levada adiante, o Ministério Público deslegitima e arquiva como denuncias caluniosas.



Embora o estudo também traga relatos e vídeos em que o promotor pressiona o preso para que não faça a denuncia, Rafael afirma que também há grande responsabilidade do juiz, que deve questionar. Os dados mostram que 60% das perguntas dos juízes giravam nesse sentido, outros 40% para desqualificar.


Vivian Calderoni, que também participou da coordenação da pesquisa, afirma que as audiências de custódia não estão desenhadas para cumprir o papel que deveriam. “Audiência fantasma, são inusitadas, casos em que a pessoa não é apresentada por conta de um ferimento muito grande, hospitalizada. A cadeira fica vazia, e o promotor ou defensora falando com a parede”, denuncia.


Neste sentido, Vivian pontua que o juiz, a promotoria e a defensoria compactuam com um sistema de violência policial, e que o próprio Instituto Médico Legal (IML) também participa. Ela cita que em um dos casos em que o promotor passou adiante a denuncia de tortura, ele afirmou: “não quero que depois olhem a imagem do cara todo arrebentado e digam que eu não pedi para investigar”. Outra frase que ficou famosa vindo de um promotor foi: “se não tivesse roubando não tava matando”.


André Augusto Salvador Bezerra, presidente da Associação de Juízes para a Democracia (AJD), acredita que ainda temos um Judiciário com uma estrutura autoritária e que pouco compreende a Constituição de 88, criada para garantir que acabassem as violações dos direitos humanos. Para ele, a magistratura tem uma carreira extremamente hierarquizada, quase militar. Além disso, os magistrados que são considerados “libertários” são perseguidos.



“Isso ocorre porque a visão do mundo do juiz ainda é muito punitivista. O direito não nasceu da árvore, não é apolítico. Quando pensamos em termos de formação, as apostilas de Fernando Capez e Alexandre de Moraes é que são passadas para que as pessoas estudem e passem em concursos públicos”, afirma.



O jornalista Bruno Paes Manso acrescenta que as audiências de custodia foram incorporadas na engrenagem e vem para legitimar o sistema. “O que assusta é a eficiência e naturalidade com que isso foi feito, 80% das prisões são feitas em patrulhamento ostensivo. A tortura vem para o cara confessar o crime. Da década de 90 para cá, 30 mil para 230 mil presos em SP. É a indústria de encarceramento”, afirmou.



Deborah Duprat, Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, alerta que estamos vivendo um momento de profunda violação dos direitos humanos. “Tortura sistemática e invisível. Nós somos uma sociedade em sua gêneses violenta, escravocrata e colonial. O Ministério Público foi concebido nessa Constituição como o grande defensor dos direitos humanos e ele não poderia se distanciar disso”, considerou.



Justificando



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