sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Modernidade neoliberal, uma modernidade transitória

Modernidade neoliberal
Ricardo Alvarez 

Este trabalho analisa a literatura recente sobre modernidade e pós-modernidade, relacionando-a com a ideologia neoliberal que por trinta anos foi dominante no mundo. Em relação à modernidade neoliberal, mostra que a maioria dos notáveis sociólogos que a analisaram e criticaram não compreenderam que se tratava de uma modernidade reacionária e, em consequência, transitória. Em relação a pós-modernidade, o artigo faz uma crítica a seu excessivo relativismo e pessimismo, como também sua rejeição das grandes narrativas e da possibilidade de progresso. O trabalho reconhece que a sociedade se tornou progressivamente complexa, porém enfatiza que este problema é enfrentado por um sistema coordenação social igualmente complexo, onde a regulação formal e informal estão interligadas.

Luiz Carlos Bresser-Pereira
Tanto a sociologia da modernidade quanto da pós-modernidade desenvolvidas por alguns dos sociólogos mais reconhecidos do presente não são uma sociologia neoliberal, mas uma sociologia que, ao fazer a análise competente da realidade social, reflete a realidade dos anos neoliberais do capitalismo. Ora, como esses anos foram marcados por uma tentativa radical de voltar ao passado – ao liberalismo do século XIX – esse foi um período reacionário que, por isso, teria caráter necessariamente transitório. A transitoriedade é uma condição do método histórico que é próprio da teoria social, mas essa transitoriedade não foi suficientemente assinalada. Trata-se de uma sociologia em que os temas centrais – o individualismo e a individualização, a falta de valores compartilhados e de solidariedade, a culpabilização das vítimas para explicar a pobreza e a exclusão, a reação crescente contra os imigrantes pobres, a insegurança e o risco por toda parte, o caráter líquido e indefinido das relações sociais, o relativismo generalizado combinado com o fundamentalismo de mercado – são sem dúvida características da modernidade, mas de uma modernidade neoliberal cujo colapso ocorreu com a crise financeira global de 2008 e a grande recessão que se seguiu.


Como uma espécie de alternativa às teorias da modernidade, desenvolveu-se, mais ou menos no mesmo período, a perspectiva pós-moderna – a reação de uma esquerda perplexa diante do avanço do neoliberalismo e da crise do marxismo. Uma abordagem que teve o mérito de se conservar crítica do capitalismo, e o demérito de, no entanto, adotar um relativismo e revelar uma descrença nas grandes narrativas e nas utopias possíveis, que negava a própria possibilidade da sociologia.


Neste trabalho faço um breve e certamente incompleto exame desses dois conjuntos de ideias, situando-as no quadro dos Trinta Anos Neoliberais do Capitalismo (1979-2008) – período no qual uma ideologia reacionária foi dominante em quase todo o mundo. Enquanto o liberalismo foi originalmente uma ideologia que nasce no século XVIII para defender os interesses da classe média burguesa contra a oligarquia militar e religiosa e o Estado absoluto ou autocrático, o neoliberalismo surge no último quartel do século XX para defender os interesses dos ricos contra os trabalhadores e os pobres e contra um Estado democrático. Após o fracasso do liberalismo econômico, que se patenteou no crash da Bolsa de Nova York em 1929 e na Grande Depressão dos anos 1930, tivemos no pós-guerra os Trinta Anos Dourados do Capitalismo (1949-1978) –período em que o Estado voltou a intervir na economia de forma ativa, ao mesmo tempo em que intervinha também na área social; período em que o Estado foi desenvolvimentista e voltado para o bem-estar social, apoiado na nova macroeconomia keynesiana e na teoria estruturalista do desenvolvimento; período de crescimento acelerado, grande estabilidade financeira e moderada redução das desigualdades econômicas nos países ricos; período no qual se formou uma ampla coalizão de classes, que a Escola da Regulação francesa denominou de fordismo, reunindo empresários, classes médias profissionais e trabalhadores. Entretanto, nos anos 1970, uma crise de proporções moderadas, caracterizada pela queda da taxa de lucro e da taxa de crescimento, e pela estagflação (inflação com baixo crescimento), permitiu que o liberalismo econômico se tornasse novamente dominante, patrocinado por uma estreita coalizão de classes formada por capitalistas rentistas e pelos financistas que administram a riqueza dos primeiros, e legitimado por um grupo de economistas e filósofos neoliberais entre os quais Friedrich Hayek, Carl Popper, Milton Friedman e James E. Buchanan. Esse neoliberalismo, que se fortaleceu com a queda do Muro de Berlim e o colapso da União Soviética, tornou-se nos anos de 1990 a tal ponto hegemônico que as políticas econômicas passaram a pouco divergir, independentemente do partido político no poder. Em nome de uma reforma que denominou "regulatória", desregulou os mercados em geral e, em particular, os mercados financeiros, o que deu origem a uma série de crises financeiras que chegaram ao auge na crise financeira global de 2008.


Diante dessa nova hegemonia, o pensamento sociológico contemporâneo reagiu, geralmente de uma maneira crítica, mas não deixou de ser por ela influenciada. Meu argumento não é o de que tenha defendido o receituário neoliberal; pelo contrário, vários sociólogos o criticaram – mas devemos assinalar que sua leitura da modernidade deixou-se impressionar em demasia por um estágio que entendo ter sido transitório do capitalismo.


Modernidade neoliberal* Neoliberal modernity Modernité néolibérale Luiz Carlos Bresser-Pereira

RESUMO Este trabalho analisa a literatura recente sobre modernidade e pós-modernidade, relacionando-a com a ideologia neoliberal


Controvérsia

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