domingo, 11 de setembro de 2016

Contestação só pode aumentar se organizadores coibirem violência

Mario Sergio Conti

A passeata em São Paulo no domingo (4) foi maior e mais aguerrida do que as em defesa de Dilma. A presidente se tornara um empecilho à soberania popular porque era penoso defender o seu segundo mandato, calamitoso de cabo a rabo.

Agora, ninguém quer que Dilma volte. A conversa mole de reverter no Supremo o golpe tabajara (apud Joaquim Barbosa) é isso mesmo, conversa mole. A casta está hoje preocupada em separar o joio do trigo. Para proteger o joio.



Porque só então ela poderá reorganizar, em bases arejadas e sustentáveis, a corrupção. O bode expiatório da nata parlamentar é Eduardo Cunha. Se pegar bem, ela imolará o sumo-sacerdote do impeachment no altar da moralidade, adocicando o azedume geral.


Aí o pântano se esfalfará na excelsa missão de entregar a arraia-miúda à clarividência do mercado (privatização), para que ela trabalhe mais (reforma da Previdência) e ganhe menos (fim da CLT). Em troca, ofertará serviços de quinto mundo (congelamento dos investimentos em saúde e educação por 20 anos).


A política oficial não se reduz a isso. Há também Temer. Ele causou na China. Nosso Marco Polo vestiu uma camisa com listas verticais que nos anos 70 andou na moda em Tietê, berço de tantos fashionistas e estadistas. Garboso, fez-se fotografar com uma vendedora de sapatos ajoelhada a seus pés.


Por essas e por outras, a tônica do domingo foi a ressurreição das diretas já. Havia na avenida Paulista dezenas de milhares de pessoas de todo tipo, e não apenas a melancólica clientela sindical. Não faltou entusiasmo e sarcasmo –crianças levavam cartolinas onde estava escrito "Fora Michelzinho". No registro da passeata, contudo, o que sobressaiu foi o quebra-pau no Largo da Batata.


A Polícia Militar é tida como uma força que bate antes e pergunta depois, que se regozija em revidar, tendo motivo ou não. Na semana passada, por exemplo, ela não precisou de pretexto para jogar gás lacrimogêneo no Sujinho, na rua da Consolação. A brutalidade foi interrompida apenas na Marcha com Deus pela Família, em 1964, e nos atos pelo impeachment.


Mas há de fato quem queira brigar e depredar, os black blocs. Eles são poucos e vários. Há batedores de carteiras e celulares. Lumpens em busca de balbúrdia. Anarquistas que fariam Bakunin corar. E, como se viu em 2013, em ações documentadas por vídeos, há policiais provocadores. Uns querem adrenalina. Outros, que a contestação murche.


Um testemunho pessoal: na passeata de domingo, dirigentes da CUT e dos sem-terra interpelaram encapuzados. Obrigaram-nos a se descobrirem e os soltaram depois de averiguar se levavam pedras ou rojões.


A bagunça começou depois de encerrada a manifestação, quando funcionários do Estado fecharam a estação de metrô. Um grupinho atirou pedras e gritou. O tumulto piorou quando a polícia do Estado baixou o sarrafo em gregos e goianos.


A contestação só poderá aumentar se os partidos, sindicatos e organizações que a organizam coibirem a violência. Só elas podem proteger quem queira se manifestar, neutralizando os agressores. A violência é um problema para os contestadores, e não para a polícia.


Como a política extraparlamentar é a única que pode fazer face ao retrocesso civilizacional, é um problema e tanto. Fazer de conta que a questão inexiste ou é menor, e acreditar na neutralidade do Estado, foram ilusões que custaram ao PT a perda do poder.

Folha



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