quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Médicos em conflito de interesses



Artigos científicos omitem relações de autores de estudos com laboratórios
Análise publicada na revista "Archives of Internal Medicine" mostra que a relação entre fabricantes de produtos médicos e pesquisadores é falha no que diz respeito à transparência.

Na análise, pelo menos 25 cientistas, de um grupo de 32, receberam valores acima de US$ 1 milhão por trabalhos de consultoria prestados em 2007 para essas empresas, mas não mencionaram isso ao escreverem seus artigos em revistas especializadas no ano seguinte. Um comportamento nem um pouco transparente, dizem os autores.

A maioria desses médicos não divulgou que prestou serviços para as companhias, segundo o professor David J. Rothman, da Universidade de Columbia e um dos autores da análise. "Uma grande, dramática falha", disse.

Ele chama a atenção para a necessidade de se determinar normas mais rígidas de divulgação científica, incluindo a citação de valores exatos recebidos em consultorias. E afirma que os leitores precisam ser informados para considerarem conflito de interesses.

Marcia Angell, ex-editora da revista "New England Journal of Medicine", disse que a investigação é muito bem elaborada e traz resultados surpreendentes.

- É mais uma indicador de corrupção generalizada na área médica com o dinheiro da indústria - afirma.

Já o Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas declarou que tem proposto políticas aprimoradas de divulgação nos últimos dois anos. Mas cada revista decide a sua própria norma e os críticos dizem que muitas delas ainda não avançaram o suficiente.

A revista "Journal of Arthroplasty", por exemplo, não informou a relação entre consultores e empresas em 17 de 24 artigos publicados. Glen Campbell, diretor de ciências da saúde de periódicos da Elsevier, disse que esse tipo de dado é imprescindível:

- Estamos impressionados com a qualidade da investigação, que mostra claramente a necessidade de maior adesão por parte dos autores e editores para cumprir as normas.

Maioria omitiu dados sobre valores recebidos

Já os editores da "Journal of Bone and Joint Surgery" revelaram as relações financeiras em sete dos dez artigos. E disseram, num comunicado, que planejam anunciar um reforço das políticas de divulgação.

- É importante que nossos leitores estejam plenamente conscientes das fontes de apoio para a pesquisa - disse o editor, Vernon T. Tolo.

O estudo pegou dados de cinco fabricantes de produtos médicos, revelados principalmente devido a investigações do governo. As empresas pagaram cerca de US$ 250 milhões para consultores em 2007, incluindo royalties. A Zimmer pagou US$ 87 milhões; a DePuy, US$ 63 milhões; a Stryker, US$ 45 milhões; a Biomet, US$ 27 milhões, e a Smith & Nephew, US$ 24 milhões.

Desse total, US$ 114 milhões foram para 41 médicos, dos quais 32 assinaram como autores ou coautores artigos em revistas de ortopedia em 2008.

A análise incidiu sobre uma amostra representativa de 95 artigos. E 51 deles, ou 54%, não mencionaram a relação financeira com uma empresa. O estudo não identifica os médicos ou os seus artigos. Para Rothman, essa falta de transparência revela "um sistema quebrado, independentemente de quem foi a culpa".

Os representantes das empresas Stryker, Zimmer e DePuy não quiseram comentar a pesquisa, que se concentrou nos médicos que receberam mais de US$ 1 milhão, o que indica significativo conflito de interesse. Outra crítica de Rothman é que as revistas não exigiram dos autores a informação de quanto haviam recebido em consultorias, valores que variavam de US$ 10 mil a US$ 8,8 milhões.

(Do New York Times)
(O Globo, 15/9)

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