segunda-feira, 5 de novembro de 2018

O que pode vir por aí.

Rene Carvalho

Palpites sobre o que se pode esperar [ou temer] da primeira fase do governo Bolso. O ponto de partida é tentar identificar os principais grupos que compõem o movimento que levou Bolsonaro à presidência e seus projetos. Vou dividi-los, para simplificar em três grandes anéis. No primeiro temos a extrema direita militante atuante: nas instituições públicas: deputados - bancadas BBB, membros do judiciário - juízes, procuradores - militares da reserva [e da ativa] e membros de várias categoriais policiais; nas associações civis como UDR e Associação de caminhoneiros; e grupos na população.


A candidatura Bolsonaro tornou-se o ponto de convergência de todos esses grupos sem ter ainda uma organicidade melhor definida. Não há tampouco nesse anel um programa unificado, mas importantes focos de ação, como a escola, a moral e os costumes, a repressão ao “ativismo” político e social e o uso de violência na resolução de divergências e conflitos. Durante o processo eleitoral agregou-se a esse movimento o grupo de ultras do neoliberalismo na economia.

No segundo anel podemos encontrar a simpatia e apoio da cúpula e de expressiva parcela dos membros do judiciário, da procuradoria, do exército, do parlamento e da mídia. Mas aqui se articulam apoio à pauta bolsonariana e objetivos próprios de cada corporação em sua participação no poder. As lógicas corporativas são determinantes nesse grupo.

No terceiro anel, temos a massa dos votantes em Bolsonaro, seduzidos pelos slogans anticorrupção, de repúdio aos políticos, de reforço da segurança e da volta “ao que era antes” em termos de moral e costumes. São pessoas que também acreditaram que pondo a casa em ordem a economia prosperaria e o emprego se elevaria.

Bolsonaro vai assim assumir a presidência num contexto político e institucional de amplo apoio na população, no Congresso e nas instituições públicas federais. Esse apoio envolve endurecer o arrocho salarial, sucatear saúde e educação, privatizar parcela expressiva do patrimônio público e reprimir o ativismo de movimentos sociais e partidos de oposição. Ou seja, dar ainda maior profundidade às políticas aplicadas por Temer. Esse grupo é também marcado pela complacência apresentada aos entorses à Constituição e à legalidade democrática que tornou-se característica de nossas Instituições. Consideram que as Instituições funcionam desde que não sejam fechadas.

As convergências entre primeiro e segundo anel são importantes: há uma forte base política comum. Mas também se apresentam divergências. Dizem, sobretudo respeito ao alcance da participação das instituições no poder. Sua proposta é a manutenção das bases do atual arranjo institucional que estabelece certa divisão do poder. Essas instituições gostariam de poder impor certos limites à ação do governo e dos grupos bolsonaristas na população: que apliquem sua política, mas “guardem as formas” sem maior radicalização da legislação relativa aos direitos individuais, ou exageros na lógica repressiva. Manter-se no quadro de uma Constituição flexibilizável e com certo cuidado com repercussões externas. Querem poder “educar o capitão”

O redesenho institucional que parece se esboçar aponta, entretanto para o superdimensionamento do poder executivo e a uma tendência de relação direta do executivo com a opinião pública. É dela que vem a legitimidade do executivo e este gostaria, dentro de certos limites, de secundarizar os “intermediários”. A indicação de “super ministros” com expressivo respaldo no empresariado, forças armadas e igreja evangélica reforça a dinâmica de ligação direta com a população. Além do uso do Twitter... Ou seja: haverá composição, mas, sobretudo nos termos ditados pelo executivo. Que quer guardar sua liberdade de ação.

Esse “certo ‘bonapartismo” é, sobretudo reflexo, penso, da violência dos projetos dominantes no primeiro anel bolsonarista que lembram em vários aspectos, Pinochet e seus “Chicago boys”. Arrocho salarial, drástica redução das despesas sociais, proibição de manifestações e perseguição a lideranças, militarização do combate ao varejo de drogas, aumento da letalidade das intervenções policiais, desuniversalização da educação e forte controle ideológico, leis de segurança que criminalizem oposições, instalação da polícia de costumes, controles da população via internet.

Aplicar esse programa me parece difícil no quadro da Constituição, mesmo bastante flexibilizada. E é ainda necessário levar em conta os protestos e a insatisfação que, cedo ou tarde, esses programas produzirão na sociedade. E a tendência dominante é a repressão. Não tenho ideia das formas que acabaria assumindo esse Estado Forte, mas estaremos claramente num novo ciclo autoritário.

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