segunda-feira, 4 de junho de 2018

Ivandro Sales: para pensar o Brasil, recomendações de Marx

Recomendações de Marx, ao completar 200 anos, para entender e resolver a crise do Brasil

(Uma homenagem)

Ivandro da Costa Sales [1]

1. É necessário e urgente tentar Identificar os objetivos, as estratégias, os desejos, os sonhos, as táticas, vitórias e derrotas os grupos econômicos importantes. São grupos econômicos importantes: os trabalhadores masculinos, femininos, autônomos, empregados, desempregados, sub-empregados, trabalhador coletivo, trabalhador universal e os empresários (grandes e pequenos, nacionais e internacionais) das finanças, das indústrias, do comércio e da agricultura. Cuidado! É comum esquecer que os trabalhadores são grupos econômicos importantes. E lembrar que ser trabalhador é uma honra, enquanto ser mercadoria e nem conseguir se vender como força de trabalho, é uma desgraça.


2. A história é o resultado das parcerias, alianças, oposições e antagonismo de interesses, desejos, sonhos e direitos (econômicos, políticos, culturais, afetivos, religiosos, estéticos...) desses grupos econômicos importantes. Os interesses econômicos, além de importantes, nunca podem deixar de ser pesquisados.

3. Conhecer as organizações econômicas, políticas, culturais e religiosas dos grupos econômicos dominantes e dos grupos explorados e subalternizados. Quais dessas organizações dispõem de mais e melhores meios materiais e financeiros? Quem tem assessores mais competentes? (Ter bons assessores é essencial).

4. Assessores são estudiosos, que (com ou sem diploma, oriundos da própria classe ou de outras classes e categorias), se dedicam a pensar, expressar e organizar os interesses dos grupos a quem eles devem prestar um serviço, em busca permanente de soluções para seus problemas. Os grandes grupos econômicos dominantes não dispensam os serviços desses bons e competentes auxiliares.

5. Qualquer proposta que não inclua a socialização dos meios de produção e também o planejamento da produção e distribuição individual e coletiva do produto, é uma proposta reformista que, quando muito, faz alguns retoques na ordem capitalista atual, ordem que é a grande responsável pela exploração e dominação que se quer acabar.

6. Socialização não se identifica com a atual estatização É uma "associação de pessoas livres". As estatais no capitalismo nunca foram, nem são, nem serão do povo. São instituições do capital nacional e internacional. É também oportuno não identificar governamental com público. As organizações governamentais podem muito bem ser fundamentalmente um serviço a interesses privados.

7. A cada dia os capitalistas precisam mais do governo (e sempre são atendidos) para definir e "aperfeiçoar" as leis trabalhistas, previdenciárias, fiscais, cambiais, penais... Eles, os capitalistas, nunca dispensaram o apoio definitivo do governo. Cuidado, portanto, ao falar superficialmente em liberalismo e neoliberalismo.

8. É preciso e urgente tentar resgatar e reforçar a função estatal das organizações trabalhistas e populares da sociedade civil, função estatal que poderia assim ser resumida: definir, fiscalizar e executar, (em parceria com o governo), as políticas públicas. Infelizmente essa função tão importante foi usurpada e monopolizada pelo governo, tido erroneamente, durante muito tempo e ainda agora, como único responsável pela gestão da sociedade e do "Bem Comum".

9. O fim da exploração econômica e dominação social será conduzida por organizações autônomas, compostas e dirigidas por representantes das diversas organizações populares. Algumas dessas organizações são destinadas à realização de objetivos específicos (econômicos, políticos, culturais, afetivos, religiosos, estéticos...). Outras terão como objetivo político, não a realização de objetivos específicos, mas a gestão da sociedade com vistas ao fim da exploração e da dominação em todas as práticas sociais.

10. Os representantes das organizações trabalhistas e populares que perseguem fins específicos (econômicos, políticos, culturais, religiosos, estéticos...), como os sindicatos, associações e tantas outras formas associativas, não devem esquecer que a consecução de seus objetivos não pode deixar de estar conectada com a construção de uma sociedade sem exploração e dominação. Quem se contenta só com a realização de objetivos específicos, consegue vitórias importantes, mas fica pelo caminho, e é só reformista.

11. Organização não significa colar uma grelha na realidade, ou impor pacotes vindo dos cartórios eleitorais, ou copiar formas de outros tempos e outros contextos. Organização não é imposição de fôrmas. É, sim, criação de formas adequadas para discutir e resolver problemas. Para a solução de cada problema devem, então, ser buscadas formas oriundas do aperfeiçoamento do que, em cada situação, é ou já foi vivido como sucesso ou fracasso.

12. Que formas organizativas criar para acabar a exploração e a dominação na agricultura e nas empresas nacionais? E para planejar a produção e distribuição de bens? E para gerir todo o excedente que surgirá necessariamente de uma economia planejada e que use tecnologias avançadas? A esse respeito convém saber que o excedente que não for apropriado privativamente, como se dá no capitalismo, não é mais-valia ou exploração. E deve se transformar em fundo de reserva para saúde, segurança. bem estar. infra-estrutura e tudo mais de bom.

13. Não acontecerá nada de importante e eficaz para a mudança da atual ordem capitalista, se não se conseguir enfrentar as corporações internacionais e transnacionais. Como seria esse enfrentamento urgente e necessário? Será que tem, ou daria para se ter representantes dos trabalhadores e dos movimentos populares em organismos internacionais como Fundo Monetário Internacional, Organização Mundial do Comércio e outras do mesmo nível? Urge pensar.

14. Como transformar a pequena produção individual e os pequenos negócios individuais ou coletivos, pouco produtivos, em grande produção e grandes negócios, geridos democraticamente, "por homens e mulheres livres e associados"?

15. A gestão de uma sociedade sem exploração e dominação inclui a criação um modo específico e democrático de administrar os interesses e direitos da sociedade, modo esse que administrará a instauração de um modo coletivo e democrático de produzir e distribuir bens e serviços.

16. Não alimentar, entretanto, a ilusão de que a gestão do fim da exploração e dominação seja feita pelas instituições atuais da democracia burguesa. A "Democracia" no capitalismo, sob qualquer de suas formas, (representativa, parlamentarista, monarquia representativa etc.) é, e não pode deixar de ser, um serviço à manutenção e desenvolvimento da ordem capitalista.

17. No período de transição do atual modo capitalista para um outro modo mais democrático e planejado de produzir e distribuir bens e de gerir a sociedade, é de toda a conveniência que se elejam representes competentes para ocupar espaços nas instituições da atual ordem burguesa. Atenção! Que lá estejam para, com firmeza, e sem alianças com adversários, (a não ser alianças pontuais e passageiras), discutir, exigir, pressionar e fazer conhecidas suas reivindicações. E preparados para as muitas derrotas, sabendo, entretanto, que sua atuação firme e competente pode minar o poder dos exploradores e reforçar um outro modo de gestão da sociedade.

18. O novo modo de gestão da sociedade não precisará de personalidades salvadoras e não terá profissionais da política. Os representantes serão eleitos para, num prazo definido, cumprir determinadas tarefas, e serem substituídos, se não conseguirem realizá-las. Algumas das instituições da velha ordem serão mantidas e aperfeiçoadas, outras serão extintas.

19. Que se faça uma diferença ente Reforma e Revolução. A Reforma faz retoques na ordem estabelecida. A Revolução é uma mudança radical no modo de produzir bens e serviços e no modo de gerir a sociedade.

20. Uma Reforma pode ser feita em pouco tempo. Uma Revolução Social exige muita paciência e tempo para mudança das estruturas e das pessoas. Uma Revolução exige clareza e profundidade sobre as possibilidades objetivas e subjetivas das mudanças, sobre os fundamentos, objetivos, estratégias e táticas da ação revolucionária. Não basta querer ou esperar que as mudanças caiam do céu. É loucura ter objetivos para os quais não existam os meios adequados para conseguí-los.

21. É provável que, dada a complexidade das sociedades atuais, com suas múltiplas, complexas e diferenciadas instituições e formas organizacionais, (suportes da ordem vigente), a luta pelo fim da exploração e da dominação se dê pela ocupação de espaços, em vez de tomada de poder pela força das armas. Aliás, mesmo na ocupação de espaços, só haveria uso da violência armada, em última instância e em resposta à violência dos adversários.

22. Nada impede, entretanto, e talvez seja até aconselhável, que, a partir de vivências existentes em qualquer lugar da humanidade, se pense em formas alternativas de produção e distribuição de bens e de gestão da sociedade.



NOSSA SITUAÇÃO

Não é animador o nosso estágio. Não conhecemos bem os adversários nacionais e internacionais da revolução pretendida. E muito menos sabemos, com precisão, de que armas eles dispõem e como as utilizam.

Não temos dado a devida importância à formação teórica, política e organizativa das bases trabalhistas e populares e nem a de seus representantes nas diferentes organizações.

Ainda acreditamos que nossa revolução seja feita pelas instituições da democracia burguesa.

No momento atual não temos uma organização política forte, autônoma e independente. Estamos num estágio de depender de um ou algum "salvador da Pátria.

Quase todas as análises e propostas de autores e grupos, que pretendem mudanças na sociedade, param, (para desgosto de Marx), ao chegar nas reformas (trabalhista, política, previdenciária...). Tratam, na verdade, de reformas necessárias e importantes, mas insuficientes para a solução definitiva dos problemas do Brasil, solução que virá, segundo a principal recomendação de Marx, de um modo de gestão que coloque de imediato a socialização dos meios de produção e a gestão coletiva de todas as práticas e instituições da sociedade.




[1] Sítio Mãe Liquinha, Taperoá PB. Professor aposentado da UFPE. Assessor de Educação Popular e Gestão Democrática. Texto resultante de leituras e sobretudo de discussões realizadas durante muitos anos na OFICINA DO SABER. Maio de 2018.


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