quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Anjo da História versus Sono da Razão



Rogério Lustosa Bastos



Walter Benjamin, criticando um tipo de progresso que destrói toda a vida ao redor, vai debatê-lo através de uma metáfora: há um anjo que caminha entre os homens e toma ciência de um tipo de progresso industrial e tecnológico. Assim, depois disto, esse anjo, que é o “Anjo da história”, fica bastante triste e vira as costas para esse modelo. Então, de repente, abate-se sobre o mundo uma ventania forte que acaba se transformando em um ciclone. Tal ciclone, que ocorre em decorrência desse suposto desenvolvimento humano que prejudica o planeta, é tão forte que mata milhares de pessoas e também arranca as asas desse anjo e o impede de voar. 


Há muita confusão em torno dessa discussão de progresso, de forma que cabem alguns esclarecimentos: Benjamin, de maneira alguma quer negar a razão humana e muito menos que devamos existir sem desfrutar os ganhos da tecnologia e de todos os avanços conquistados pela civilização através da ciência, da economia e assim por diante. Ao contrário, é por valorizar a razão e os valores iluministas, mas de uma maneira crítica que esse autor se opõe ao tipo de progresso citado. Na realidade, talvez a dificuldade em se aceitar essa crítica é que, diante dela, faz-se necessário romper com um tipo de racionalidade que sustenta tal modelo, pois que ela é destrutiva e nociva para todos.

Traduzindo: o “anjo da história” vira as costas para esse tipo de progresso e desenvolvimento porque na ânsia de obter lucros e vantagens cada vez maiores, reduzem-se todos e tudo em mercadoria. Obviamente, seguindo tal lógica, se porventura o homem descobrisse uma formula para acabar com todo oxigênio em todo planeta, a fim de que se obtenham maiores ativos para o mercado e para o crescimento das empresas transnacionais, sem dúvida isso seria realizado.

Além disso, o “anjo” é surpreendido e ao perder a asa, é impedido de voar talvez para nos lembrar do seguinte: (1º) esse tipo de progresso que pode nos destruir é uma escolha histórica, assim, ele pode ser revertido; (2º) para tanto, é necessário que além de rejeitá-lo, longe de nos auto-isolarmos, precisamos nos organizar e compor com os afins e os não afins em favor da construção de uma sociedade anticapitalista;(3º) se a sociedade capitalista, buscando sempre o lucro é destrutiva, quando despertamos nossas consciências críticas para combatê-la, o sonho de lutar por superá-la, antes de tudo, não deve ser feito sob pretensões teleológicas, tal como se fosse o projeto de um rio que caminha com precisão para o mar. Ora, se buscarmos uma sociedade contrária ao capitalismo, afora requerer muita luta e persistência, esse projeto não é um pacote cristalizado, o qual tem um conjunto de certezas inquestionáveis e predeterminadas; (4º) ao contrário, caso queiramos concretizar tal projeto, sobretudo, faz-se necessário usarmos de crítica constante, exceto se queiramos desastrosamente realizá-lo sob o sono da razão crítica, o qual, como já nos disse Goya, criaremos novos monstros.

Finalizando, para quem quiser aprofundar nessa argumentação, além de sugerirmos a leitura do livro discutido aqui (BENJAMIN, W. O anjo da história. Belo Horizonte: Autêntica, 2012), trazemos à baila uma reflexão: “Não há”, como diz Benjamin, “nenhum documento da cultura, que não tenha sido escrito com a barbárie”.

Rogério Lustosa Bastos Lustosa 


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