Adital
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), no relatório inédito ‘Sobre o Uso da Prisão Provisória nas Américas’, denuncia que, no Brasil, cerca de 40% dos presos não tiveram condenação definitiva. O relatório também aponta que o país possui a segunda maior população carcerária das Américas, de aproximadamente 550 mil presos, perdendo apenas para os Estados Unidos. O documento, que apresenta um diagnóstico sobre o uso deste instrumento jurídico no continente americano, foi lançado nesta segunda-feira (08).
Analisando o relatório, a organização Justiça Global afirma que o tema da realidade carcerária em geral e da prisão preventiva em específico vem recebendo mais atenção na esfera pública brasileira. Desde a recente reforma no regime das medidas cautelares penais, pela Lei 12.403/2011, passando pelos episódios no Complexo Penitenciário de Pedrinhas [Estado do Maranhão], o debate sobre o uso, em regra indevido, do instrumento da prisão preventiva é central para formulação de políticas de segurança e penitenciárias para o país e na superação da prática do superencarceramento que se consolidou no Brasil nas últimas décadas.
Na ocasião do lançamento, Sandra Carvalho, coordenadora-geral da Justiça Global, também apresentou a campanha "Prisão Não! Liberdade para os presos provisórios”, promovida pela organização. A campanha procura conferir visibilidade ao uso abusivo e ilegal da prisão provisória no país, prática que favorece o encarceramento em massa da população pobre e negra.
Conheça a campanha "Prisão Não!”
Além disso, a campanha busca pressionar pela alteração de políticas de segurança e criminal que favorecem o encarceramento em massa da população pobre e negra e reforçam a crença na necessidade do aprisionamento.
Conforme a Justiça Global há em torno de 230 mil pessoas presas no Brasil que nunca tiveram a chance de se defender, os chamados presos e presas provisórios. Isso representa mais de 40% do total da população carcerária, de cerca de 560 mil, sendo que o sistema prisional conta com aproximadamente 300 mil vagas. A prisão provisória é toda prisão anterior à condenação definitiva da pessoa e teria, em tese, como fundamento, um risco à investigação ou processos em curso. "Na prática, ela tem se tornado uma grave fonte de inúmeras violações de direitos humanos, promovendo o superencarceramento, a violência e tortura nas unidades prisionais e condições de detenção desumanas e degradantes”, avalia a entidade.
Presas e presos aguardam por meses – e em mais casos do que se pode imaginar, por anos – até uma primeira sentença. O contato com a Defensoria Pública, para a grande maioria que não tem dinheiro para contratar advogado particular, é raro e não é difícil encontrar exemplos de pessoas que apenas conhecem seus defensores minutos antes da primeira audiência. Em todo o país, 95,4% das comarcas não possuem defensor público ou possuem em número insuficiente.
Nesse meio tempo, provisórios e condenados, com raras exceções, compartilham as mesmas celas e unidades prisionais, apesar da Lei de Execução Penal exigir a separação entre esses dois tipos de pessoas privadas de liberdade. Ambos submetidos a condições de detenção degradantes: celas superlotadas, pouco ou nenhum acesso à saúde, violência e tortura – por agentes dos Estado ou em razão da omissão destes – são apenas alguns dos exemplos desta realidade.
"Uma cultura punitiva – na sociedade, nas polícias, no Judiciário, Ministério Público e nos governos – incentiva o endurecimento penal e o supercencarceramento como solução para os problemas de violência e conflitos sociais. Pessoas que nem ao menos seriam condenadas à privação de liberdade aguardam seu julgamento presas e a recente reforma legal no regime da prisão provisória, realizada pela Lei 12.403/2011, não conseguiu frear o volume de prisões em massa, mesmo com o surgimento de alternativas, como a prisão domiciliar, o monitoramento eletrônico e outras restrições de direitos, como vedação de se ausentar da cidade e obrigatoriedade de se reportar regularmente perante o juiz ou delegado”, denuncia a Justiça Global.
Ademais, preconceitos de raça e classe marcam a atuação das instâncias estatais, tendo como resultado uma grande massa carcerária de jovens, negros e pobres, reforçando a falsa ideia de que esses representam um perigo para a sociedade e que o Estado precisa controlar o que eles podem vir a fazer. "Precisamos alterar as políticas de segurança dos governos federal e estaduais, que favorecem o encarceramento e reforçam a crença na necessidade do aprisionamento, sendo as principais responsáveis pelo alto número de presos provisórios e pela permanência destes preconceitos”
Como ponto de partida mínimo para se começar a reversão desse quadro, a Justiça Global defende: implementação da audiência de custódia em nível nacional, fazendo com que toda pessoa presa seja prontamente apresentada perante o juiz para analisar a legalidade daquela prisão e casos de tortura ou maus-tratos pela autoridade policial; ampliação dos quadros da Defensoria Pública na área criminal e da execução penal, com a criação de uma dinâmica de atendimento presencial e efetivo a toda pessoa privada de liberdade; efetiva implementação da Lei 12.403/2011, garantindo que a prisão provisória seja, de fato, a última alternativa e não o ponto de partida; e revisão nos métodos de atuação do Ministério Público, cuja tarefa de fiscalizar, monitorar e controlar a atividade policial tem sido prejudicada pela aceitação quase automática de inquéritos policiais mascarando falhas e ilegalidades graves na investigação.
Com informações da Justiça Global.
Controvérsia
Nenhum comentário:
Postar um comentário