segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Como se reposicionar à esquerda no Brasil ?

Qual é a tua?

Como se reposicionar à esquerda no Brasil de tantas lutas e depois de um ciclo de 3 governos sob a direção do PT: pela via da Onda Dilma Já ou pela via do voto crítico dos Petistas com Luciana Genro?

Cunca Bocayuva

No texto que segue tentamos apresentar os argumentos e posicionamentos que sugiram numa reunião realizada no sábado dia 27 de setembro, entre um pequeno grupo de pessoas, na maioria professore(a)s universitários. Reunião que originariamente estava aberta para uma polêmica com uma grande variedade de posições, que iria desde o argumento do voto nulo até o voto em Marina. Mas só compareceram as pessoas situadas em campos que partem do petismo e, que concordam quanto ao papel positivo desempenhado pela experiência do reformismo fraco no Brasil. Considerando que este é necessário e de impacto incalculável, devido aos deslocamentos e benefícios gerados em matéria de superação da pobreza e de mobilidade para vários segmentos.

Foram apresentadas duas linhas de reflexão crítica sobre o processo eleitoral. Examinamos a conjuntura nacional e internacional desde questões que passamos a resumir.

Apesar do consenso quanto ao fato da importância da experiência da mobilidade social e da distribuição de renda no país, o debate foi polarizado. Nos dividimos entre as duas posições expressas no título dessa reflexão/relato: a opção do voto em Dilma Já versus o voto em Luciana Genro no primeiro turno, a segunda opção é uma forma e meio de expressar a necessidade da cobrança e mesmo da superação do quadro político atual. Houve divergência quanto ao papel e função do segundo turno nas eleições presidenciais, opondo posição que considera positiva sua realização para qualificar melhor as políticas e programas e uma posição, diante da posição contrária que considera os riscos de retrocesso.

A divergência girou sobre pontos decisivos em torno da interpretação sobre o andamento e duração do processo dos ciclos de governos sob comando do PT.

Ao avaliar esse quadro, manifestamos duas posições bem distintas. Em primeiro lugar aquela que busca marcar um contraponto crítico ao PT governista, utilizando o voto na candidata do PSOL, de modo a reafirmar uma posição crítica em relação ao quadro centrista e fisiológico do governo que se distancia muito da prática de um projeto de esquerda. O voto em Luciana Genro no primeiro turno pretende pressionar e cobrar uma posição mais avançada de governo no segundo mandato de Dilma. Na busca de uma tonalidade reformista mais nítida, que deve ser exercida sob formas mais democráticas de governar orientadas por uma visão modificada da qualidade do desenvolvimento. Em segundo lugar, foi apresentada outra posição que afirma ser mais vantajoso, responsável e viável cobrar, desde a base, um novo mandato de Dilma com posição mais sólida e segura, por força do resultado que pode advir de uma vitória e reconhecimento no primeiro turno. Reafirmando assim a obra do PT como ponto de partida seguro para avançar na via das mudanças.

Os presentes na reunião concordaram que as saídas pela esquerda devem partir de uma apropriação crítica do experimento petista e de uma continuidade e aprofundamento de mudanças na direção da reforma política e social. Mas discordamos quanto ao grau de risco que podemos ou devemos passar, diante da argumentação expressa na posição de não aderir a um novo governo Dilma sem colocar exigência programática.

Apesar da concordância com o fato de que as condições para uma vitória no primeiro turno permitem que Dilma sofra menos pressão para negociar e abrir espaço para a direita e o capital, existe também uma divergência acerca do papel que pode ter um segundo turno para qualificar o debate no processo eleitoral.

Ao final da reunião, foi dito que uma operação crítica unificada dessas duas posições teria de se explicitar em matéria de posições e avanços que devem ser realizados num novo governo.

Examinamos a questão das contradições e dinâmicas da forma da revolução passiva, vista desde a contradição entre forças de mudança e forças e contrarreforma. No calor das controvérsias surgiu o velho questionamento sobre o peso e o papel da postura de “independência” que podem ter os intelectuais como grupo, ou ainda, sobre o peso eleitoral da intelectualidade. Se questionou o peso e a relação entre processos que poderiam ser gerados desde a Universidade, para redefinir rumos e agregar forças para os dois caminhos possíveis. O quadro atual mostra que o PSOL não se credenciou para a eleição, e o PSDB rompeu com o véu centro-desenvolvimentista de Serra, o PCB retornou para uma retórica de dualismo de poder, o PSTU faz uma campanha de propaganda da nacionalização dos meios de produção, e Marina parece materializar uma operação que combina arrivismo, udenismo, ativismo localizado, com forças regionais negociando seu ingresso no governo, através da via do capitalismo verde e do retorno ao “Ocidente”, rompendo com a agenda sul-sul.

Neste quadro observamos que Dilma se ancorou no centro e explora a sua posição de Presidenta, reage aproveitando o desgaste das manobras de desestabilização. Falham as manobras engendradas pela combinação da questão da corrupção na e pela Petrobrás, com o mito do PT chavista e golpista, e com o ataque especulativo vidando desclassificar a posição do ranking do Brasil com “grau de investimento”. Falha o intento de culpar o PT e Dilma enquanto os responsáveis pela crise de crescimento. O desgaste com a Copa, a luta e pressão inflacionária, os indicadores, a falta de água, a violência urbana e todos os temas lançados no período tem efeito de manejo das subculturas do medo. As redefinições e excessos discursivos são retroalimentados por manobras midiáticas, mas tudo isso acabou “empatando” o quadro e socializando as perdas entre todas as forças e movimentos.

Não se pode assim pendurar o guizo no gato, nem desenhar um cenário mobilizador, num processo que faz tudo retornar ao centro, com resultados previsíveis e mensuráveis que projetam peso e manobra para a verdade revelada e construída a partir dos cenários projetados de segundo turno pelas empresas de pesquisa de opinião. Apesar da imprevisibilidade do efeito da morte do Governador de Pernambuco e do efeito Marina, vemos um vazio programático da direita que naufraga, já que só pode postular governar no limite dado pelo mesmo centrismo. O retrocesso e a insegurança aparecem nos sinais neoliberais piorados que podem se manifestar por sinais travestidos à sombra de Marina.

O problema do Dilma Já, na via do primeiro turno, é que nos limitaremos sempre a esperar a Presidenta da República achar oportuno colocar a reforma política e o tema da participação no centro das questões, completando com a mudança cosmética nos ministérios (como na Cultura) e secretarias, ou olhando a nova composição do Congresso para ver o que fazer

No quadro, onde a falta de nitidez e a perda de crédito na política tornaram as maiorias descrentes continuaremos rompendo com as novas gerações? Continuaremos dando razão ao quadro de direitização e moralismo, de combinação entre fascismo social, com narcisismo e individualismo possessivos, com a retórica de criminalização do outro? Como fazer para gerar uma práxis que leve em conta a convergência do ponto de resistência e o ponto de mutação? Como gerar um deslocamento de forças e consciências para que o eterno retorno não opere um giro de projeção, que desloque a esquerda para uma derrota na proporção da que se operou?

A luta interna e o debate do petismo se desenham entre a zona da mudança possível e a mensagem na direção de um passo adiante (na medida de nossas pernas). Como ampliar o campo dos possíveis a partir da relação com todas as variáveis da responsabilidade histórica? Como fazer, por onde andar, onde ir? Buscar encerrar o processo no primeiro turno com a onda “Dilma já”, “Dilma na Cabeça” ou, cobrar mais e forçar a politização do processo votando em “Luciana Genro agora” e “Dilma depois…, no segundo turno? Prolongar e reabrir esse processo beneficia Marina mas, paradoxalmente, pode beneficiar a Democracia também. Ou será que derrotar todos não coloca o PT numa posição de vantagem, com mais uma oportunidade para a possibilidade histórica de repensar os seus erros, de melhorar a qualidade de seus acertos, de escutar a demanda por retomada do projeto democrático inscrito no modo petista de governar e no artigo 6 da Constituição?


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