Empresa sólida com notável “espírito de corpo” |
Delfim Netto
A qualidade da administração e do controle financeiro dos projetos de investimento da Petrobras colide brutalmente com a competência perseguida com sucesso desde a sua origem por seus quadros técnicos. De fato, ela é um exemplo das vantagens da integração empresa-universidade e da capacidade inovadora produzida por programas de pesquisas executados com determinação e seriedade.
O seu acionista majoritário (o Tesouro Nacional e, portanto, todo cidadão brasileiro) e os acionistas minoritários (os cidadãos que, por acreditar no seu sucesso, colocaram parte do patrimônio nas ações negociadas nas bolsas de valores, no Brasil e no exterior) estão espantados diante do que aconteceu.
Na melhor das hipóteses, e a mais ingênua, é que se tratou de um caso clássico em que o “principal”, ou seja, os acionistas, foi miseravelmente traído por seus “agentes” (alguns dos administradores), o que ocorre com alguma frequência no setor privado.
O agravante é que os “agentes” (extraídos do quadro técnico da empresa) foram escolhidos pelo acionista majoritário (o Tesouro Nacional) por indução político-partidária, o que seguramente comprometeu a sua governança.
Infelizmente hoje tudo conspira contra a boa execução do pré-sal, desde as exageradas demandas colocadas sobre a Petrobras no apoio à indústria nacional (um objetivo legítimo quando feito com moderação e inteligência) e o controle dos preços dos combustíveis para reduzir a taxa de inflação, o que lhe impôs um custo que só vai ser recuperado ao longo do tempo.
A Petrobras encontra-se muito endividada e carente de mais financiamento no momento em que a imprensa mundial divulga os desagradáveis fatos com ilações sobre o que fará a Security Exchange Commission (SEC) dos Estados Unidos. Isso aumenta a dificuldade de captação de novos recursos, eleva os seus custos e repercute sobre o equilíbrio econômico e financeiro dos seus fornecedores nacionais. Para se ter uma ideia do problema, basta dizer que ela deve mais de 300 bilhões de reais e o seu Ebitda anda em torno de 4 vezes.
Acrescenta-se à delicada situação interna, uma enorme incerteza sobre os preços futuros do petróleo. As explicações vão desde fórmulas conspiratórias que unem o interesse político do Ocidente em “civilizar” a Rússia de Vladimir Putin com o interesse econômico dos países do Golfo de desestimularem a produção de pequenos fornecedores e inibir o desenvolvimento tecnológico de energias alternativas, até explicações “técnicas” que apelam para o aumento da oferta da qual fazem parte a Líbia, o Iraque, o Brasil, o México e, especialmente, os Estados Unidos, cuja produção, recentemente, tem crescido a 15% ao ano.
Esse aumento da oferta tem sido acompanhado por uma simultânea queda da demanda da China e a estagnação do continente europeu. A redução do preço do petróleo, se durar, deve ser um fator positivo no crescimento do PIB no Brasil e no mundo, mas deve criar problemas para a exploração do pré-sal.
Reduzirá as mirabolantes expectativas criadas pela possibilidade de uso do excedente que deveria “salvar” o Tesouro Nacional dos imprudentes, mas já comprometidos, gastos “certos”, financiados por recursos “incertos”, por definição fora de nosso controle.
O fato positivo é que, diante de todas essas dificuldades e da destruição da sua imagem pública, a Petrobras “técnica”, aquela que inova, que extrai petróleo, que é fator decisivo no progresso da economia nacional, tem aumentado a oferta do petróleo extraído do pré-sal.
A despeito da confusão interna, a Petrobras ampliou sua capacidade de refino, reduziu o valor das nossas importações e deu algum alívio à balança comercial brasileira. Isso testemunha a favor de uma empresa sólida com notável “espírito de corpo”, cuja maioria absoluta de colaboradores merece nosso respeito e será o suporte da necessária e segura superação da tragédia que a sedução político-partidária irresponsável lhe impôs.
Jorge Viana.com
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