O sistema hospitalar brasileiro é um retrato do país, pelos seus contrastes. De um lado, pacientes aguardando atendimento em macas nos corredores, emergências fechadas por falta de produtos básicos e, principalmente, de médicos. De outro, centros de excelência, nos quais pacientes recebem tratamento equivalente ao dos melhores hospitais do mundo. A boa notícia é que a preocupação com a qualidade e a segurança do atendimento ganha força tanto nos estabelecimentos públicos quanto nos privados.
Dados do Ministério da Saúde (MS) indicam a existência de 7.211 hospitais no Brasil em 2013, dos quais 5.674 fazem atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) - 2.907 são públicos, 1.811 filantrópicos, 954 privados e dois de entidades sindicais. No ano passado, foram realizadas 11,4 milhões de internações pelo SUS. Apenas com essa despesa, o ministério gastou R$ 11,6 bilhões, 14,85% a mais do que em 2011.
Chama a atenção o fato de o número de leitos ter diminuído 5% desde 2008, para os atuais 354.171. O de internações também caiu de 11,7 milhões em 2010 para as 11,4 milhões do ano passado. "A queda nas hospitalizações é uma tendência mundial. A prioridade é o atendimento ambulatorial ou em casa, principalmente no caso de doenças crônicas", diz Helvécio Magalhães, secretário de atenção à saúde do MS. Para isso, o governo reforça as redes de atenção de Estados, municípios e do setor privado, a porta de entrada do sistema, na tentativa de detectar e tratar os problemas, evitando a hospitalização. "Nos últimos dois anos, o MS investiu cerca de R$ 1 bilhão em redes de atenção."
Em um nível intermediário estão as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), que funcionam 24 horas, têm cerca de 20 leitos e resolvem até 97% das ocorrências. Hoje, 274 UPAs estão ativas, 324 em ação preparatória e 224 em construção. A rede tem capacidade para 90,7 mil atendimentos diários. As hospitalizações acontecem nos casos de emergências, urgências, atendimento de idosos e de doenças crônicas com intercorrências. Os leitos destinados às Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs) aumentaram 32% desde 2008, somando 17.609 unidades. "Cada estrutura tem um papel definido para agilizar e melhorar a qualidade do atendimento", explica Magalhães.
Uma das grandes preocupações do governo é o financiamento do SUS, um dos maiores serviços públicos de assistência médica do mundo. Pela Constituição, todos os brasileiros têm direito ao atendimento - e pelo menos 146 milhões dependem dele. Parte dos 48 milhões de usuários de planos de saúde também usa o sistema, especialmente quando precisa de serviços como transplantes e de tratamento de câncer. "O governo presta uma excelente assistência nessas áreas", afirma Luiz Aramicy Pinto, presidente da Federação Brasileira de Hospitais (FBH). "Mas ninguém consegue fazer uma operação de amígdalas porque os preços da tabela estão aviltados e não atraem os médicos."
Os clientes de planos de saúde enfrentam problemas com a recusa de operadoras para procedimentos mais caros - recentemente, o MS adotou medidas para coibir a prática. Os preços são alvos de queixas por parte de médicos e hospitais. "Quem precisa de atendimento hospitalar enfrenta dois problemas: dificuldade de acesso aos serviços e de conseguir um atendimento de qualidade", explica Francisco Balestrin, presidente do conselho deliberativo da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp).
O governo investe para melhorar o acesso aos hospitais nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e no interior do país, locais onde o atendimento é ainda mais precário. "Nas regiões com boa cobertura dos hospitais filantrópicos, a ordem é otimizar a capacidade instalada", diz Magalhães.
Já a iniciativa privada está investindo cerca de R$ 1 bilhão em ampliações, reformas e compras de equipamentos. Para garantir a qualidade do atendimento, hospitais públicos e privados vão em busca da acreditação. O MS coloca em prática outras estratégias, como a assinatura de novos contratos hospitalares. Nesse modelo, a tabela do SUS será apenas uma referência. "Um hospital que aliar produção à melhoria de qualidade poderá receber até 60% a mais do que o estipulado na tabela", informa Magalhães.
O Hospital do Subúrbio é um exemplo de excelência entre os hospitais públicos. Localizado em área carente de Salvador (BA), atende casos de urgência e emergência. Em dois anos e meio, fez 293 mil atendimentos, 31,1 mil internações, 19,3 mil cirurgias e 1,2 milhão de exames. O índice de satisfação dos clientes fica entre 92% e 96% e a instituição foi certificada no nível 1 da Organização Nacional de Acreditação (ONA).
"A qualificação de nossa equipe explica o desempenho", afirma Lícia Cavalcanti, diretora do hospital. "Nada menos que 82% dos 403 médicos que trabalham aqui têm titulação." Um dos diferenciais do Hospital do Subúrbio é a figura do médico-hospitalista que acompanha o paciente durante todo o tempo da internação. "Assim, é possível ter controle do atendimento, garantindo maior segurança", afirma.
A Beneficência Portuguesa de São Paulo, complexo formado por três hospitais, começa a preparar o Santo Antônio, com 243 leitos, para a acreditação. Inaugurada no ano passado, a instituição dedica-se aos atendimentos de média complexidade para o SUS. O São Joaquim, com 1.200 leitos, recebe clientes de convênios e realiza procedimentos de alta complexidade do SUS, já passou pelo processo e conseguiu, no ano passado, o nível 3, o último, da ONA. Já o São José, inaugurado em 2007, recebeu, a certificação internacional da Joint Commission International (JCI), em 2011. Com 65 leitos, a instituição é destinada exclusivamente a clientes de planos de saúde de melhor padrão.
A diversificação da clientela e de serviços foi a forma encontrada pela Beneficência para buscar equilíbrio financeiro. "Esperamos melhorar a receita, reduzindo o déficit causado pelo atendimento ao SUS", diz Fábio Teixeira, superintendente corporativo. Para melhorar a arrecadação do Santo Antônio, a Beneficência negocia a ativação de 90 leitos para atender o programa Rede Hora Certa, da prefeitura de São Paulo.
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