Domingos Jorge Velho |
A proximidade do aniversário de São Paulo nos traz à memória uma das figuras mais emblemáticas da história e da historiografia paulistas: o bandeirante. As expedições que partiam pelos sertões do Brasil, desde o século XVI até meados do XVIII, em busca de riquezas – metais, pedras preciosas e índios para o cativeiro – tornaram-se um símbolo da bravura e da ousadia do povo paulista.
O interessante é que esta glorificação das bandeiras – que receberam este nome devido ao costume tupiniquim de levantar uma bandeira em sinal de guerra - ocorreu no final do século XIX, quando São Paulo já havia atingido uma grande importância econômica, mas, continuava ocupando papel secundário na esfera política. Começava então a valorização dos bandeirantes como responsáveis pela integração nacional e pela conquista do interior do País. A Revolução de 1932 foi o ápice desta leitura histórica paulista, quando a atuação destes desbravadores foi invocada como justificativa para o combate que buscava a derrubada de Getúlio Vargas.
O que chama a atenção é que, no processo de construção do mito, os bandeirantes passaram por uma mudança total no que se refere ao vestuário e aos costumes. A imagem construída pelos historiadores e políticos paulistas mostra o bandeirante como um homem imponente, de longas botas, chapéus de abas largas, capas, armas na cintura, empunhando um mosquete poderoso e galopando em garbosos cavalos. A realidade era bem mais dura e violenta. As tropas, compostas por uma maioria de escravos indígenas, caminhavam descalças por distâncias inimagináveis. A fome era companhia constante. As roupas se resumiam a calças e camisas de tecido grosseiro, o gibão de couro de anta (espécie de colete fechado e acolchoado), chapéu de palha, mosquetes, pistolas e espingardas (geralmente enferrujadas) para os que lideravam; forquilhas, arcos e flechas como armas para a maioria. Os bandeirantes assimilaram os costumes dos índios e mamelucos para conseguir sobreviver.
As tropas eram lideradas pelos “capitães do arraial”, sertanistas experientes que tinham poder absoluto sobre os demais. Os capitães reuniam filhos, parentes mais próximos e agregados para acompanhá-los nas expedições, para ajudá-los a comandar. Havia também as figuras do capelão, do alferes-mor (que repartia os índios capturados) e do escrivão. Os mamelucos eram guias e intérpretes, pois, falavam a “língua geral” (tupi) e podiam se comunicar com as diversas tribos. O restante do grupo era formado por escravos indígenas, inclusive mulheres que seguiam junto à tropa.
Em “Capítulos de História do Império”, Sérgio Buarque de Holanda discorre sobre os conflitos e contrastes do nosso Império. Chamou-me a atenção a abordagem do autor em relação aos atritos entre portugueses (de primeira geração ou não) e brasileiros, no final do período colonial e no pós-independência. Sérgio Buarque aponta diferenças ”idiossincráticas” entre os grupos, que incluem discrepâncias no modo de falar e de vestir. Tais discrepâncias alimentavam as hostilidades já arraigadas nos séculos de vida colonial.
O autor destaca que os “naturais de São Paulo”, os bandeirantes, costumavam andar descalços pelas matas em busca de índios e riquezas, causando estranheza entre os portugueses que não se conformavam com aqueles pés nus e aqueles modos “selvagens”. Sérgio Buarque faz a seguinte análise da Guerra dos Emboabas (1707-1709): este nome seria um apelido pejorativo que os paulistas teriam dado aos portugueses que tentavam roubar-lhes o ouro recém-descoberto nas Minas Gerais. Emboaba, na língua geral era o nome das “aves calçudas”, que representariam os forasteiros ambiciosos – e calçados – que chegaram rapidamente às terras onde se escondiam os metais tão sonhados pelos colonos.
Os paulistas logo seriam expulsos das minas e perderiam o direito de explorar as riquezas descobertas originalmente por eles. O episódio mais dramático da derrota dos paulistas, liderados por Borba Gato, foi a batalha do “Capão da Traição”. Logo depois, a Vila de São Paulo seria fundada e uma relativa paz passaria a reinar, depois de muitas mortes, infelizmente.
Historiahoje.com
O interessante é que esta glorificação das bandeiras – que receberam este nome devido ao costume tupiniquim de levantar uma bandeira em sinal de guerra - ocorreu no final do século XIX, quando São Paulo já havia atingido uma grande importância econômica, mas, continuava ocupando papel secundário na esfera política. Começava então a valorização dos bandeirantes como responsáveis pela integração nacional e pela conquista do interior do País. A Revolução de 1932 foi o ápice desta leitura histórica paulista, quando a atuação destes desbravadores foi invocada como justificativa para o combate que buscava a derrubada de Getúlio Vargas.
O que chama a atenção é que, no processo de construção do mito, os bandeirantes passaram por uma mudança total no que se refere ao vestuário e aos costumes. A imagem construída pelos historiadores e políticos paulistas mostra o bandeirante como um homem imponente, de longas botas, chapéus de abas largas, capas, armas na cintura, empunhando um mosquete poderoso e galopando em garbosos cavalos. A realidade era bem mais dura e violenta. As tropas, compostas por uma maioria de escravos indígenas, caminhavam descalças por distâncias inimagináveis. A fome era companhia constante. As roupas se resumiam a calças e camisas de tecido grosseiro, o gibão de couro de anta (espécie de colete fechado e acolchoado), chapéu de palha, mosquetes, pistolas e espingardas (geralmente enferrujadas) para os que lideravam; forquilhas, arcos e flechas como armas para a maioria. Os bandeirantes assimilaram os costumes dos índios e mamelucos para conseguir sobreviver.
As tropas eram lideradas pelos “capitães do arraial”, sertanistas experientes que tinham poder absoluto sobre os demais. Os capitães reuniam filhos, parentes mais próximos e agregados para acompanhá-los nas expedições, para ajudá-los a comandar. Havia também as figuras do capelão, do alferes-mor (que repartia os índios capturados) e do escrivão. Os mamelucos eram guias e intérpretes, pois, falavam a “língua geral” (tupi) e podiam se comunicar com as diversas tribos. O restante do grupo era formado por escravos indígenas, inclusive mulheres que seguiam junto à tropa.
Em “Capítulos de História do Império”, Sérgio Buarque de Holanda discorre sobre os conflitos e contrastes do nosso Império. Chamou-me a atenção a abordagem do autor em relação aos atritos entre portugueses (de primeira geração ou não) e brasileiros, no final do período colonial e no pós-independência. Sérgio Buarque aponta diferenças ”idiossincráticas” entre os grupos, que incluem discrepâncias no modo de falar e de vestir. Tais discrepâncias alimentavam as hostilidades já arraigadas nos séculos de vida colonial.
O autor destaca que os “naturais de São Paulo”, os bandeirantes, costumavam andar descalços pelas matas em busca de índios e riquezas, causando estranheza entre os portugueses que não se conformavam com aqueles pés nus e aqueles modos “selvagens”. Sérgio Buarque faz a seguinte análise da Guerra dos Emboabas (1707-1709): este nome seria um apelido pejorativo que os paulistas teriam dado aos portugueses que tentavam roubar-lhes o ouro recém-descoberto nas Minas Gerais. Emboaba, na língua geral era o nome das “aves calçudas”, que representariam os forasteiros ambiciosos – e calçados – que chegaram rapidamente às terras onde se escondiam os metais tão sonhados pelos colonos.
Os paulistas logo seriam expulsos das minas e perderiam o direito de explorar as riquezas descobertas originalmente por eles. O episódio mais dramático da derrota dos paulistas, liderados por Borba Gato, foi a batalha do “Capão da Traição”. Logo depois, a Vila de São Paulo seria fundada e uma relativa paz passaria a reinar, depois de muitas mortes, infelizmente.
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