sábado, 11 de abril de 2015

Acabar com os Financiamentos Empresariais de Campanha



Em defesa da ética e da democracia 

 Raul Pont 


Os partidos que se reivindicam a favor dos princípios democráticos devem dar um exemplo concreto de que não são coniventes com nenhuma forma de corrupção.

Os fatos e os desdobramentos recentes da Operação Lava-Jato, a denúncia de que milhares de brasileiros aparecem na lista das contas da agência suíça do HSBC e o escândalo das empresas sonegadoras no CARF (Conselho de Administração de Recursos Fiscais) demonstram o caráter sistêmico da corrupção em que o país está imerso há décadas e que agora vem se revelando de maneira aberta e transparente.


Nos últimos anos, os governos vêm fortalecendo as instituições de controle e repressão ao crime e elas agem com liberdade e sem constrangimentos governamentais, amparadas em legislações mais rigorosas. Nos governos petistas acabou a figura do “engavetador geral”.

A ampliação e a total autonomia do Ministério Público e da Polícia Federal para cumprirem suas funções constitucionais, conquistas da nossa democracia nos governos Lula e Dilma, comprovam, tanto no episódio da Petrobrás, quanto no das contas secretas na filial do HSBC na Suíça, o envolvimento de grandes empresários, da tecnoburocracia das empresas públicas, da máfia operadora de paraísos fiscais e, agora, de dezenas de parlamentares.

A Operação Zelotes revela uma prática antiga. Não se paga em dia os tributos, sonegam-se contribuições para depois discuti-las administrativamente ou em juízo. O CARF era um velho instrumento para diminuir débitos ou eliminá-los através de consultorias ou escritórios de advocacia em conluio com os dirigentes do próprio órgão. Grandes empresas gaúchas estão envolvidas: Gerdau, RBS e Marcopolo. Comprova, ainda, que a prática da corrupção vem de longe sem que as instituições do Estado estivessem preparadas e aparelhadas para combatê-la.

A crítica meramente moralista, como ocorreu nas recentes manifestações de março, a este estado de coisas ao criminalizar a política e, em particular, responsabilizar o governo e o principal partido que o sustenta, adquire um caráter hipócrita, preconceituoso e intolerante. Conduz, unicamente, à negação da política e a um niilismo que se expressa em ódio e irracionalidade.

Hipócrita porque o sistema capitalista que vem destruindo as conquistas do mundo do trabalho e sua cultura cotidiana estimulam o ganho fácil, a vantagem esperta e, no caso brasileiro, ainda temos um sistema eleitoral que facilita e estimula a corrupção.

O TSE informa-nos que, nas eleições de 2014, mais de R$ 5 bilhões de reais de empresas, pessoas jurídicas, financiaram e elegeram centenas de candidatos em todo o país. A análise dos dados comprova a relação entre poder econômico, as campanhas mais caras e os eleitos.

Objetivamente, financiamento de candidatos escolhidos, doações eleitorais, propinas, compra de votos, separam-se por uma linha quase invisível do “financiamento legal” das empresas.

Preconceituoso e intolerante porque o monopólio midiático escolhe seus alvos e os pré-julga, condena e expõe à execração pública, sem que os ofendidos tenham direito às mesmas manchetes e aos mesmos espaços usados para atacá-los.

Um exemplo concreto é a lista dos parlamentares denunciados pela Operação Lava-jato. Durante semanas os vazamentos seletivos das “delações premiadas”, protagonizadas por corruptos réus confessos, transformaram-se em julgamentos idôneos e terminativos sobre apenas alguns denunciados e partidos.

Não separar, intencionalmente, instituições que agregam milhões de cidadãos e cidadãs de indivíduos que no interior dessas organizações cometem erros e crimes, não ajuda nem constrói uma sociedade verdadeiramente democrática. Não há democracia sem Partidos Políticos, não há democracia sem o direito à pluralidade e diversidade de opiniões e projetos sociais.

Nós queremos defender os Partidos, fortalecê-los, pois com isso fortaleceremos o regime democrático, plural e tolerante.

Para melhorá-los é necessário acabar com os financiamentos empresariais aos candidatos e aos partidos. A maioria do STF já considera inconstitucional essa prática. A ausência do Acórdão, pelo pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes, compromete a instituição que tem o dever de julgar a ADIN e defender a lisura e a honradez do processo democrático. Quem quer mantê-los é o PMDB, o PSDB, o PP e outros Partidos, como ouvimos no recente seminário sobre a Reforma Política promovido pela Assembleia Legislativa.

Para torná-los mais programáticos, ideológicos e coerentes, é necessário o voto em lista partidária, democraticamente construída em convenção de filiados.

Se são muitos, inconsistentes ou simples “balcões de negócio”, o fim das coligações proporcionais garantirá aos eleitores decidir quais os que terão representatividade, por seus programas e coerência.

Neste momento, em que é imperioso fortalecer a democracia, defender suas instituições e seus processos de escolha e de deliberação, os partidos políticos que se reivindicam dos princípios democráticos e da soberania popular devem dar um exemplo concreto de que não são coniventes, não pactuam com a corrupção, não aceitam o enriquecimento ilícito por meio da fraude licitatória, dos benefícios privilegiados ou da propina pelo exercício dos mandatos eletivos e de cargos públicos.

De nossa parte, como militantes históricos e construtores dessa experiência singular e inovadora que é o Partido dos Trabalhadores na história política do país, queremos cumprir nosso papel. Continuar na luta pela reforma política, pela extinção do financiamento empresarial das campanhas e dos partidos e pela (re)construção programática, política e ética do PT.

Em sintonia com a decisão da direção estadual do partido e de acordo com nosso estatuto que garante medida cautelar de suas direções diante de situações graves e de grande repercussão, defenderemos na reunião da Direção Nacional do Partido a aplicação imediata da cautelar estatutária.

Isto é, todo filiado, dirigente ou portador de mandato, denunciado em processos judiciais deve ser afastado do seu cargo e/ou função partidárias, sem nenhum prejuízo ao seu direito à defesa e ao contraditório, enquanto os fatos não forem totalmente esclarecidos.

Nosso objetivo, em consonância com a medida cautelar estatutária, é de que não paire nenhuma dúvida, não reste nenhuma ilação de conivência, omissão ou cumplicidade do Partido, de seus milhões de filiados e de seus milhares de representantes eleitos com qualquer ação irregular ou criminosa de alguns de seus membros.

Temos a convicção de que exemplos concretos valem mais que interpretações e justificativas. Se nós e outros partidos agirmos dessa forma, estaremos consolidando nossas agremiações e a democracia brasileira.

Raul Pont é professor aposentado e membro do DN/PT.

Carta Maior


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