terça-feira, 23 de julho de 2013

Saúde é direito de todos e dever do Estado


Jandira Feghali

Nunca é demais repetir o que diz o artigo 196 da Constituição de 1988, onde, após grandes debates nacionais e mobilizações amplas e transversais da sociedade brasileira, ficou impresso um sistema de proteção social onde a saúde passou a ser direito universal para todo cidadão independente de contribuição direta ou de qualquer outra exigência, exceto ser cidadão.

Estamos em 2013 e nesses 25 anos podemos dizer que percorremos um caminho difícil para ampliar o sistema público, mas acredito que avançamos considerando a complexidade e o tamanho do país e da população brasileira. No entanto, ainda é dramática a realidade de boa parte do povo que se angustia na infindável espera, na peregrinação desumana ou na carroceria de uma ambulância correndo estradas atrás de uma vaga em cidade mais próxima.

Falta muito. Segundo o Ministério da Saúde há em nosso país 700 cidades nas periferias das metrópoles e regiões do Norte e Nordeste sem médicos. Situação que merece resposta das autoridades públicas.

As soluções, todavia, devem se pautar por formulações equilibradas, que evitem polarizações extremadas e rupturas de diálogo. Os problemas vividos pela saúde pública brasileira têm razões estruturantes relacionadas com a falta de prioridade na aplicação suficiente de recursos, na aplicação de um modelo de financiamento que privilegia o setor privado, uma atenção básica fragilizada e precarização da relação com recursos humanos. Há décadas não temos uma justa política de fixação e interiorização de profissionais de saúde e nem relacionamos a formação dos estudantes à realidade epidemiológica e às necessidades do povo brasileiro, muito menos os estimulamos ao trabalho no SUS.

Muitos são os depoimentos de profissionais reveladores da impotência que sentem diante da falta mínima de estrutura, mesmo na atenção básica ou na emergência, tendo como única saída a busca desesperada de uma ambulância que permita a transferência do paciente para alguma cidade que possua capacidade maior de atender com equipamentos, centro cirúrgico, medicamentos ou UTI.

A medida provisória que cria o programa Mais Médicos aponta alguns conceitos interessantes, mas peca nas soluções. Cabe ao Estado brasileiro valorizar a atenção básica como porta de entrada do Sistema Único de Saúde e, para isto, deve garantir estímulo para que profissionais qualificados queiram abraçar esta área de atenção, que é complexa e importante. Como construir esta política negando segurança jurídica e direitos aos médicos brasileiros que se inscreveram no programa, já que a MP veda expressamente qualquer vínculo trabalhista? O curso de medicina tem seu tempo ampliado em dois anos pelo instrumento da medida provisória sem que as universidades brasileiras sejam envolvidas - há professores e estrutura? É correto que sejam os estudantes colocados na cobertura da atenção básica, inclusive no setor privado, ou é mais correto que pensemos este critério já na residência médica? Como aceitar, como está no texto, que faculdades de medicina privadas sejam criadas com toda estrutura de treinamento em saúde sendo construída pelo gestor público sem ressarcimento pelo dono da faculdade?

Por que o Revalida, criado no Governo Lula para avaliar currículos e capacitação de médicos que se formam fora do Brasil precisa ser desprezado na contratação dos médicos que venham atender o povo pobre do Brasil? Sinceramente, penso que são razoavelmente fáceis as possibilidades de acordo, se todos colocarem os desassistidos no centro das preocupações. O Governo pode sim criar uma carreira multiprofissional para a atenção básica nas cidades vulneráveis, a formação dos cursos ser discutida num projeto de lei envolvendo as universidades e a representação da residência médica, e há que se retomar o critério de avaliação de médicos que entrem no Brasil, substituindo a adaptação proposta de três semanas na universidade, para que não tratemos de forma diferenciada a população de menor renda deste país.

Acima de tudo é necessário que encaremos as grandes questões, que não serão resolvidas por esta MP. Alguns caminhos são urgentes: é preciso financiar a Saúde através de tributação sobre grandes fortunas – financiando melhor o setor – qualificar e profissionalizar a gestão, valorizar os profissionais de saúde e ampliar a rede universalizando o acesso. Essas são lutas que unificam e dão força real às verdadeiras soluções. Precisamos, mais do que nunca, defender a vida e a saúde de nosso povo. É o que todos queremos, no Congresso e nas ruas.

Vermelho

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