Extremistas católicos e evangélicos querem agora vetar lei que regulamenta atendimento do SUS às vítimas de estupro. Decisão está com Dilma
Gabriela Leite
Certas leis podem, no máximo, reduzir danos. É o caso de um texto aprovado no último dia 11, no Congresso Nacional. Proposto no século passado (em 1999) pela deputada Iara Bernardi (PT-SP), ele estabelece as normas para atendimento, no Sistema Único de Saúde, das mulheres que foram vítimas de estupro. É um problema sabidamente grave, mas crescente. O número de casos deste crime no Brasil aumentou muito nos últimos anos. Só no primeiro semestre de 2013, a média na cidade de São Paulo foi de nove denúncias por dia. No Rio de Janeiro, os casos aumentaram 56% nos últimos quatro anos. Nestas situações, como os médicos da rede pública devem proceder?
O projeto da deputada Iara, aprovado por unanimidade após quase quinze anos de protelação, estabelece alguns procedimentos. Exige que todos os hospitais da rede do SUS atendam imediatamente as vítimas. Garante amparo social e psicológico, informações sobre direitos legais e acesso a exames de HIV e medidas necessárias para evitar doenças e gravidez. Não resolve o problema, mas assegura o direito à saúde das mulheres que sofrem com o crime.
Porém, grupos religiosos e conservadores parecem compreender que elas não têm esse direito. Para eles, um dos parágrafos da lei representa, na verdade, uma aprovação escondida do aborto: o que fala da “profilaxia da gravidez”. Carlos Alberto di Franco, membro da organização católica Opus Dei, sustenta, em artigo para O Estado de São Paulo (22/7) que, como não é necessária prova de que a mulher foi realmente estuprada, ela pode fingir o abuso para poder realizar o aborto. Argumento semelhante é o do deputado Marco Feliciano. Para ele, o termo “profilaxia” pode ser interpretado de maneira dúbia, e garantir a interrupção da gravidez. Ele também acredita que não é papel dos hospitais dar informações às vítimas de estupro sobre seu direito legal e sanitário, que elas devem procurar uma delegacia. Sugere que este ponto também deve ser vetado pelo Executivo.
A Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia explica que a profilaxia da gravidez não significa aborto — mas sim a administração de Levonorgestrel, a chamada “pílula do dia seguinte”. Ela evita a fecundação e deve ser tomada até três dias após o ato sexual. Esta medida funciona como técnica contraceptiva, e é totalmente legalizada no Brasil. No caso de estupro, evitaria um provável futuro aborto — mais perigoso para a vítima. De qualquer maneira, interromper uma gravidez que aconteceu por um ato de violência sexual já é um direito garantido por lei.
A proposta foi encaminhada para sanção da presidente Dilma Rousseff e deve ser aprovada até 1º de agosto. Define, para os devidos fins, que violência sexual é qualquer forma de atividade sexual sem consentimento. Resta agora à presidente decidir: optará pelos direitos ou pelo fundamentalismo?
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