domingo, 14 de julho de 2013

Milagre no Piauí: cartório multiplica terra ou grilagem e escrituração.



‘Milagres’ fazem terras no Piauí beneficiarem esquemas em todo Brasil

Grilagem de terra no Estado tem conexões nacionais

Há 2 anos, uma correição no Cartório da cidade de Gilbués identificou o que já está se tornando um grande escândalo financeiro no Brasil, com conexões no Piauí. Realizada em cartórios do sul do Estado, onde se concentram terras férteis, jazidas de minerais e outras riquezas, a correição conduzida pelo Juiz Luís Henrique Rêgo, identificou uma sequencia de “irregularidades de todos os tipos, desde pequenas omissões e equívocos sem consequências, até adulterações dolosas...” E o relatório continua: “prática conhecida como grilagem, onde são registradas áreas de até 40.000 hectares”. As comarcas de Avelino Lopes, Gilbués e Parnaguá passaram pela correição em 2011. O relatório da corregedoria falou em “fabricação de escrituras”. O relatório, transparente e conclusivo, é surpreendente.

Caso Gilbués. Cidade de terras milagrosas

No escândalo do Banestado (1998) foram indiciadas mais de 14 pessoas, dentre elas, Maria Cristina Ibraim Jabur, da Jabur Toypar Incorporação e Comércio de Veículos. Cristina Jabur é proprietária desde 2000, através de outra empresa da qual é sócia, a Jabor Informática S/A, de um imóvel agrário de 7mil e seiscentos hectares em Gilbués, município piauiense distante 742km da capital Teresina. Por acaso, ela foi envolvida em mais uma grave denúncia, conforme o relatório da Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça do Piauí.

O que moveu a correição do Tribunal de Justiça naquele cartório foi uma determinação contida no processo 316/2006, um pedido de providência referente a um imóvel registrado sob a matrícula R05/103, no livro 2-A, fls 197 que estava sob suspeita de duplicidade com as áreas de propriedade da senhora Ignez Tremea. Conforme o relatório da Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Piauí, a denúncia era procedente. E além delas, muitas outras. Inclusive a que envolve as terras da empresária Maria Cristina Ibraim Jabur.
Primeiro milagre: a volta no tempo

Ademar Fernandes da Silva começou a trabalhar no cartório de Gilbués em 1980. Através de uma adulteração grosseira no livro de registros do cartório, Ademar, que já não trabalha mais no cartório, “voltou no tempo” e matriculou em 1966, sem ação demarcatória e por escritura particular, um imóvel de 1.920 hectares cuja origem é uma área primitiva de Cr$ 20,00 (vinte cruzeiros). Mas Ademar conseguiu fazer outra mágica. Através de uma escritura pública que nunca foi localizada, ele se tornou dono do terreno.
Segundo milagre: a multiplicação das terras

A correição continuou. De forma aleatória, o então juiz corregedor auxiliar do Tribunal de Justiça do Piauí, Luís Rêgo, encontrou o imóvel de propriedade da empresa de Maria Cristina Ibraim Jabur. Matriculado sob o número 108 do livro 2-A-9-A, os 7.639,00 hectares, segundo a corregedoria, não tem origem. As matrículas 2293 e 2294, supostamente originárias , apontadas no livro 09 e 10, correspondem a um lote urbano de 10x20 metros e a um imóvel rural de apenas 50 hectares. Como um imóvel tão pequeno se multiplicou para se tornar uma gigantesca área de quase 8 mil hectares?

Essas terras ‘mágicas’, adquiridas por Cristina Jabur em 2000 pelo valor de R$ 14.250,00, estão hipotecadas com finalidade de penhora desde 2005, em favor do Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS, por decisão da 1a Vara Federal de Execuções Fiscais da Comarca de Londrina no Paraná.
Terceiro milagre: transmutação de pessoas

O corregedor auxiliar, na inspeção realizada em 2011, constatou no livro 2A9A as matriculas 167, 168 e 169, cujas áreas somadas chegam a 15.000.00.00 hectares de terras e que, supostamente, teriam origem anterior na transcrição do livro 758 fls. 87v/88. As respectivas matriculas informam que três escrituras de compra e venda foram lavradas no registro de notas do cartório de Gilbués, no livro 47-N, nas folhas 87,88 e 89. Mas, os três contratos de vendas ali registrados tratam de outras pessoas e o objeto dos negócios é um terreno de apenas 13,5 hectares.

Na Bahia, Marcos Valério, o do ‘mensalão’, foi denunciado por grilagem. No Piauí, até agora, ninguém.

O relatório da Corregedoria do Tribunal de Justiça que gerou esta matéria do Capital Teresina foi assinado pelo juiz corregedor auxiliar Luís Rêgo em 14 de dezembro de 2011. Naquela época, o juiz requereu e recomendou uma série de providências, inclusive o bloqueio e o cancelamento de matrículas de uma série de imóveis.

Quatro dias depois de Luís Rêgo entregar o relatório ao TJ do Piauí, o Ministério Público da Bahia denunciou à justiça o empresário Marcos Valério, o mesmo do ‘Mensalão’, por grilagem de terra verificadas na ‘Operação Terra do Nunca.’ Segundo o Ministério Público baiano, a empresa de Marcos Valério e de seu sócio Ramon Hollebarch conseguiu produzir escritura de cinco gigantescas propriedades de terra a partir de um terreno de 360m2. No Piauí, apenas um inquérito foi aberto.
Juízes querem a transferência da Vara agrária para Teresina, OAB não

Conforme nota oficial do presidente da Associação de Magistrados Piauienses, juiz José Airton Medeiros, a existência de uma Vara Agrária em Teresina é defendida desde o início de sua implantação pela AMAPI: “Desde o início das tratativas, a Amapi manifestou-se pela criação de uma Vara com competência em todo o Estado, localizada em Teresina, mas a ideia não foi aceita pelo então Presidente(Edvaldo Moura – TJ) e não foi sequer levada ao plenário do Tribunal.”

Na nota, o juiz continua: “A mudança da Vara Agrária, se acontecer, não será retrocesso, pelo menos do ponto de vista da resolução dos conflitos. Do mesmo modo, não será a solução para o problema: simplesmente será um item facilitador, em razão, especialmente, do melhor relacionamento com os demais órgãos - como INCRA, INTERPI e MDA - que não dispõem de estrutura em Bom Jesus.?Esses órgãos detêm a grande maioria das informações necessárias à solução dos problemas relativos aos conflitos agrários, assim como poderão contribuir com seus profissionais especializados, auxiliando o juiz na tomada de decisões.”

Ainda, Airton faz uma séria de perguntas que, na verdade, esclarecedoras sobre a razão de alguns não quererem a mudança da Vara Agrária para Teresina: Quantos votos foram conseguidos com o dinheiro ganho com as fraudes sem tamanho no registro imobiliário do Sul do Estado do Piauí? A quem interessa que as coisas fiquem exatamente como sempre foram? Disse o Juiz na nota oficial.

Os Juizes Heliomar Rios e Luís Henrique Rêgo, o primeiro, titular da Vara Agrária de Bom Jesus e o segundo, o Juiz Corregedor que assinou o relatório e viu em loco as irregularidades, ambos, são a favor da transferência da vara agrária para Teresina. Justificam estrutura melhor, proximidade com outros órgãos e celeridade e aparato. Entre os magistrados, o corregedor geral de Justiça Francisco Paes Landim é contra a transferência.

A presidente da Comissão de Direito Agrário da OAB-PI, Joselda Nery, expôs que a entidade solicitou a permanência da Vara na cidade de Bom Jesus atendendo a um pleito dos advogados das cidades do sul do Estado. “Nós recebemos a solicitação das Subseções e entendemos que a mudança para Teresina dificultará a resolução dos processos na região. A proximidade com o juiz em muito facilita a resolutividade dos casos”, disse Joselda Nery.

O presidente da Ordem, William Guimarães pede mais tempo para discutir o assunto. “Não queremos um confronto. A OAB-PI e a AMAPI são instituições parceiras. Estamos estudando a Lei de Organização Judiciária e, dentro desse estudo, nos comprometemos a discutir a transferência da Vara Agrária de Bom Jesus com maior profundidade até alcançarmos um equilíbrio entre as partes”, concluiu.
Investigações estão ocorrendo

Muito dinheiro envolvido. Muitos interesses e relações ocultas. A grilagem de terras no Piauí já chegou ao CNJ, ao Ministério Público Federal e Política Federal. Cerca de 28 inquéritos já foram abertos. E segundo fontes do Capital Teresina, tem muita gente poderosa envolvida. Para o presidente da AMAPI, “Deve ficar claro que a grave situação da grilagem de terras no Piauí é culpa exclusiva de pessoas que, no exercício de seus relevantes cargos, cometeram crimes, ganharam e continuam ganhando muito dinheiro”. Disse José Airton a um veículo de comunicação local.

Capital Terezina

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