quarta-feira, 29 de maio de 2013
A farra dos novos municípios
O Estado de S.Paulo
Está prevista para a próxima semana a votação, na Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei Complementar (PLC) 2008/416, que devolve às Assembleias Legislativas estaduais a prerrogativa de decidir sobre a criação de novos municípios. Há 17 anos, a Emenda Constitucional 1996/15 transferiu esta autorização para o Congresso Nacional. Há 410 cidades à espera da providência.
Não é difícil de calcular o custo eventual dessa liberalidade: os novos municípios com até 8 mil habitantes, e cuja criação de 2001 a 2010 ficou na dependência de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), têm orçamentos anuais de R$ 20 milhões. Por aí se estima que o rombo no orçamento federal dos novos 410 municípios seria de R$ 8 bilhões por ano. Como nenhuma dessas cidades tirará seu sustento de impostos cobrados de seus munícipes, mas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), todos os cidadãos brasileiros pagarão a conta pesada.
O Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM), da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), composto com dados dos Ministérios do Trabalho, da Educação e da Saúde, calcula que em 58 prefeituras criadas entre 2001 e 2010 foram abertos 31 mil novos cargos públicos, pagos em cinco anos por R$ 1,3 bilhão do FPM.
Segundo o mesmo IFDM, contudo, 45% dos 58 municípios emancipados registraram piora de desempenho no último decênio. "A criação de novas cidades implica custos, sim. Gerar novos municípios não implica necessariamente obter nova arrecadação. Ela vai é subtrair dos recursos já existentes, e distribuir entre essas administrações.
Ou seja, a divisão vai ser maior. Para solucionar isso, a União tem que aumentar repasses e, para isso, terá que haver aumento de impostos", criticou o gerente de estudos econômicos da Firjan, Guilherme Mercês. O alerta do técnico deveria ser levado em conta pelos parlamentares que decidirão sobre o PLC.
No entanto, a criação de novos municípios interessa a muita gente no mundo político. Basta ver que existe uma Associação Nacional de Apoio à Criação de Novos Municípios, como se esta atividade fosse de grande interesse público. E mais: a entidade diz ter o apoio de 350 deputados federais de diferentes partidos, entre os quais o autor do PLC, José Augusto Maia (PTB-PE).
Como não poderia deixar de ser, este garantiu que não se repetirá agora a farra da criação de municípios de antes da transferência moralizadora da incumbência para o Congresso. "Fizemos um substitutivo global que melhora e dá critérios muito mais rígidos à criação de novos municípios, levando em consideração o número populacional e a viabilidade de cada um como geração de emprego e renda", disse ele. Mas o parlamentar omitiu um detalhe: os empregos a serem criados serão públicos e a renda a ser "gerada" virá do aumento de impostos pagos por cidadãos que nem sequer conhecem tais cidades.
Como acontece em iniciativas do gênero, envolvam elas cidades ou Estados, não será difícil obter em plebiscito o aval das populações locais a essa bondade que só beneficia os políticos interessados em votos dos eleitores dos novos municípios.
E isso explica o apoio majoritário com que conta o autor do projeto. Seu argumento de que as secretarias estaduais de desenvolvimento "ficarão responsáveis pelo estudo de viabilidade econômico-financeira, a depender das receitas de arrecadação própria de cada município", carece de uma explicação: por que não deixar com o Congresso a prerrogativa de avaliar tais estudos?
"A urgência do projeto tem clara intenção de privilegiar as eleições do ano que vem. Os corredores do Congresso estavam tomados por prováveis candidatos desses novos municípios", denunciou o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), que constatou o óbvio: a farra da criação de municípios vai voltar se a lei for aprovada. Se isso acontecer, os deputados federais renunciarão à prerrogativa de proteger o contribuinte, de que não deveriam abrir mão.
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