A educação latina em evidência: Cuba x Brasil
Roberta Traspadini
Depois da queda do muro de Berlim e da ofensiva neoliberal na América Latina, propagandeia-se o fim do socialismo cubano e a vitória hegemônica do capitalismo monopólico transnacional.
Se é verdade que o fim Guerra Fria trouxe uma fragilização do socialismo real no âmbito mundial, também o é que o exemplo educacional cubano segue forte, na condução de um modelo educacional público, universalizado, gratuito e de qualidade.
1. O exemplo cubano:
A UNESCO, em seu relatório mundial sobre educação em 2011, fez uma radiografia do sistema cubano e explicitou porque este país é um exemplo concreto para o mundo de uma educação exitosa.
O artigo 205 da constituição cubana garante a educação pública, gratuita e de qualidade para todos os seus cidadãos, independente da posição socioeconômica na qual se encontram.
Mas é o artigo 39 o que chama mais atenção, quando afirma três princípios básicos revolucionários de uma educação de qualidade: a) garantia de avanço na ciência e na tecnologia; b) referencial marxista e martiano de ser social que se pretende formar; c. demarcação da tradição pedagógica progressista cubana e universal.
Juntos, os dois artigos explicitam o teor do público-gratuito de qualidade. A sustentação em conteúdo de um posicionamento político que garante o direito à reflexão crítica e à formação continuada, com centralidade dos gastos do governo em educação.
2. Os aspectos qualitativos dos dados cubanos
Com uma população de 11.247.925, Cuba conta com 2.193.312 matriculados nas respectivas faixas etárias educativas.
São 9.673 escolas públicas, 298.508 professores, 170 mil bolsistas e 908 mil estudantes em escolas semi-internas.
Segundo os dados oficiais referentes a 2010 e 2011, formaram-se 85.757 cubanos, 23,4% em cursos técnicos, 31,4% em ciências médicas, 14,9% em pedagogia, 9,9% em economia e 20,4% em outras áreas.
A participação em cursos de pós-graduação em 2010 merece destaque. Havia mais de 500 mil cubanos matriculados em cursos continuados após a graduação: 307.932 em cursos gerais; 144.640 em mestrados e especializações; 41.048 em diplomados; 27.047 em profissionalizantes, 5.776 em doutorados.
Para isto, são gastos 30% do PIB cubano, que é de U$60 bilhões, com educação, saúde e garantias sociais.
Vale destaque a ação internacionalista de Cuba, que recebe na escola latino-americana vários filhos da classe trabalhadora, tanto para cursos da área de ciências e humanidades quanto de ciências médicas.
Com uma política concreta de educação pública de qualidade, Cuba aparece, nos dados comparativos da ordem mundial burguesa, como o primeiro país em controle do analfabetismo e exportador do modelo de alfabetização “sí yo puedo”, em que, com recursos didáticos magistrais, ensina como ler nas letras o que já se lê no cotidiano.
Será o exemplo cubano um mero acaso? Um caso específico? Ou será a confirmação da incompatibilidade entre desenvolvimento do capitalismo e pensamento crítico, com educação pública universalizada e princípios políticos claros sobre o ser social que se deseja (trans)formar?
3. E o caso brasileiro? O que temos a dizer?
O modelo educacional brasileiro é oposto de Cuba. O cotidiano manifesta, por si só, o fracasso da universalidade, gratuidade e supremacia do público no sistema educativo brasileiro, sendo oposto ao modelo cubano.
A atual falência do modelo brasileiro de educação está diretamente relacionada à vitória do capital transnacional na conduta política da ordem e do progresso brasileiro, a partir dos anos 90.
As reformas educacionais foram revendo os princípios constitucionais de garantia pública, gratuita e de qualidade, e direcionando seu sentido para a privatização da educação, cujo rumo é dirigido pelos princípios ético-morais do capital, contando com o financiamento público, para a realização de sua orgia.
O vergonhoso piso mínimo salarial dos professores da educação básica e média, a política de contratação de temporários como regra e as inúmeras parcerias público-privadas são a gênese da atual educação “pública” brasileira.
Basta olharmos o cotidiano nacional de greves para constatarmos o absurdo. Nessa luta se insere a defesa dos 10% do PIB para a educação PÚBLICA.
O Brasil figura entre as sete maiores economias do mundo. O orçamento público de 2011 foi de aproximadamente R$1,5 trilhão. Deste total, 45% foram gastos com o pagamento de dívidas e amortizações e 3% foram gastos com educação, seja ela pública ou em parceria privada, segundo a auditoria cidadã da dívida.
O artigo 214 da Constituição não prevê ser obrigação total do Estado a universalização da educação. Tem como objetivos a erradicação do analfabetismo; universalização do atendimento escolar; melhoria da qualidade do ensino; formação para o trabalho; promoção humanística, científica e tecnológica do país; e estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto.
Chama a atenção, na página do MEC, o financiamento da educação, FIES, como outro aspecto claro de mercantilização deste direito social.
4. Exemplos concretos de mercantilização da educação
Para fortalecer a campanha pela melhoria da educação em que o poder público não assume seu protagonismo, a organização Todos pela educação apresenta-se como uma entidade-apoio ao desenvolvimento brasileiro. Entre seus mantenedores-parceiros estão: Instituto Camargo Corrêa, Santander, Fundação Bradesco, Rede Globo, Suzano Papel Celulose, Gerdau, Itaú BBA, Instituto Ayrton Sena, Faber Castell, BID, HSBC etc.
O canal Agência do Estado noticiou, esta semana, a fusão entre dois grandes capitais da educação brasileira: Kroton e Anhanguera. Juntas, faturam anualmente R$ 4,3 bilhões, através das 800 unidades de ensino superior e as 810 escolas associadas distribuídas pelo país.
No site da Anhanguera lemos sua missão: “ser uma das maiores instituições de ensino superior do mundo e oferecer aos seus alunos a melhor relação custo versus qualidade”. Para isto, conta com financiamento, crédito educativo e amplas formas de transações, enquanto uma empresa de capital aberto, para facilitar a permanência-conclusão dos estudantes no ensino.
O site da Kroton, além do mapa do Brasil ocupado pela empresa, reitera, via fundação Pitágoras, sua ação na “responsabilidade social”, tendo como parcerias para a autossustentação financeira: Embraer, Grupo Gerdau, Instituto Camargo Correia, Grupo Votorantim, Fundação Arcelor Mittal e Instituto Unibanco”.
5. Cuba x Brasil: dois modelos opostos de educação
A educação pública virou um grande negócio. Cantinas terceirizadas, venda de uniformes e de materiais escolares, sucateamento da merenda escolar. Isto, somado à falta de recursos para a qualificação profissional e às péssimas condições da superexploração da força de trabalho, mostra a real face mercantil da educação pública brasileira.
Esse Brasil da ordem e do progresso do capital transnacional evidencia o atual estágio de desenvolvimento do capitalismo brasileiro, em que a regra é a financeirização da riqueza e a internacionalização da produção-circulação das mercadorias, às custas de uma maior opressão das condições de vida da classe trabalhadora brasileira.
Entre o exemplo cubano e a realidade brasileira, façam suas escolhas. Nesse quesito, não tenho dúvida: sou cubana, bolivariana, latino-americana, na educação, na saúde, no modelo de desenvolvimento, antes que a morte anunciada pelo capital nos mate.
Roberta Traspadini é professora da Escola Nacional Florestan Fernandes e da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, além de integrante da Consulta Popular.
Correio da Cidadania
O modelo educacional brasileiro é oposto de Cuba. O cotidiano manifesta, por si só, o fracasso da universalidade, gratuidade e supremacia do público no sistema educativo brasileiro, sendo oposto ao modelo cubano.
A atual falência do modelo brasileiro de educação está diretamente relacionada à vitória do capital transnacional na conduta política da ordem e do progresso brasileiro, a partir dos anos 90.
As reformas educacionais foram revendo os princípios constitucionais de garantia pública, gratuita e de qualidade, e direcionando seu sentido para a privatização da educação, cujo rumo é dirigido pelos princípios ético-morais do capital, contando com o financiamento público, para a realização de sua orgia.
O vergonhoso piso mínimo salarial dos professores da educação básica e média, a política de contratação de temporários como regra e as inúmeras parcerias público-privadas são a gênese da atual educação “pública” brasileira.
Basta olharmos o cotidiano nacional de greves para constatarmos o absurdo. Nessa luta se insere a defesa dos 10% do PIB para a educação PÚBLICA.
O Brasil figura entre as sete maiores economias do mundo. O orçamento público de 2011 foi de aproximadamente R$1,5 trilhão. Deste total, 45% foram gastos com o pagamento de dívidas e amortizações e 3% foram gastos com educação, seja ela pública ou em parceria privada, segundo a auditoria cidadã da dívida.
O artigo 214 da Constituição não prevê ser obrigação total do Estado a universalização da educação. Tem como objetivos a erradicação do analfabetismo; universalização do atendimento escolar; melhoria da qualidade do ensino; formação para o trabalho; promoção humanística, científica e tecnológica do país; e estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto.
Chama a atenção, na página do MEC, o financiamento da educação, FIES, como outro aspecto claro de mercantilização deste direito social.
4. Exemplos concretos de mercantilização da educação
Para fortalecer a campanha pela melhoria da educação em que o poder público não assume seu protagonismo, a organização Todos pela educação apresenta-se como uma entidade-apoio ao desenvolvimento brasileiro. Entre seus mantenedores-parceiros estão: Instituto Camargo Corrêa, Santander, Fundação Bradesco, Rede Globo, Suzano Papel Celulose, Gerdau, Itaú BBA, Instituto Ayrton Sena, Faber Castell, BID, HSBC etc.
O canal Agência do Estado noticiou, esta semana, a fusão entre dois grandes capitais da educação brasileira: Kroton e Anhanguera. Juntas, faturam anualmente R$ 4,3 bilhões, através das 800 unidades de ensino superior e as 810 escolas associadas distribuídas pelo país.
No site da Anhanguera lemos sua missão: “ser uma das maiores instituições de ensino superior do mundo e oferecer aos seus alunos a melhor relação custo versus qualidade”. Para isto, conta com financiamento, crédito educativo e amplas formas de transações, enquanto uma empresa de capital aberto, para facilitar a permanência-conclusão dos estudantes no ensino.
O site da Kroton, além do mapa do Brasil ocupado pela empresa, reitera, via fundação Pitágoras, sua ação na “responsabilidade social”, tendo como parcerias para a autossustentação financeira: Embraer, Grupo Gerdau, Instituto Camargo Correia, Grupo Votorantim, Fundação Arcelor Mittal e Instituto Unibanco”.
5. Cuba x Brasil: dois modelos opostos de educação
A educação pública virou um grande negócio. Cantinas terceirizadas, venda de uniformes e de materiais escolares, sucateamento da merenda escolar. Isto, somado à falta de recursos para a qualificação profissional e às péssimas condições da superexploração da força de trabalho, mostra a real face mercantil da educação pública brasileira.
Esse Brasil da ordem e do progresso do capital transnacional evidencia o atual estágio de desenvolvimento do capitalismo brasileiro, em que a regra é a financeirização da riqueza e a internacionalização da produção-circulação das mercadorias, às custas de uma maior opressão das condições de vida da classe trabalhadora brasileira.
Entre o exemplo cubano e a realidade brasileira, façam suas escolhas. Nesse quesito, não tenho dúvida: sou cubana, bolivariana, latino-americana, na educação, na saúde, no modelo de desenvolvimento, antes que a morte anunciada pelo capital nos mate.
Roberta Traspadini é professora da Escola Nacional Florestan Fernandes e da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, além de integrante da Consulta Popular.
Correio da Cidadania
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