Vendendo a alma ao Diabo |
O que está em jogo não é futebol, mas o país, suas instituições, o futuro de todos nós
Rio - O ódio de setores da sociedade ao PT gera situações que lembram o gesto de amigos alvinegros em 2009, às vésperas da última rodada do Brasileirão. Eles diziam torcer por uma derrota do Botafogo para o Palmeiras, o que levaria o clube para a segunda divisão. Faziam isto porque, se vitorioso, o time paulista poderia conquistar o título e impedir que o Flamengo ficasse com a taça. Achavam o rebaixamento mais suportável do que a alegria rubro-negra.
Na ânsia de mandar petistas para Cuba ou de reservar para eles lugares no próximo foguete que for se desintegrar, muitos passaram a considerar amigos todos os inimigos do partido de Lula. Assim, chegam a comemorar vitórias oposicionistas que prejudicam seus próprios interesses. Analistas políticos entraram na torcida. Não perdoam que deputados da oposição pratiquem o fair play e votem aqui e ali com o governo — em se tratando do PT, pontapés estão liberados, a canela começa logo abaixo do pescoço.
Nas últimas semanas, a Câmara dos Deputados comandada por Eduardo Cunha aprovou medidas como a que estimula a terceirização de mão de obra. Outra, torna mais discreto, em rótulos de produtos alimentícios, o alerta sobre a presença de transgênicos em sua composição (o PT era contra, de seus 60 deputados presentes, apenas dois, entre eles o fluminense Luiz Sérgio, votaram a favor do projeto). Se é para enfraquecer os petistas, vale trocar a carteira assinada por relação precária de trabalho, é aceitável não notar a existência de componente geneticamente modificado na papinha do filho
O negócio ficou tão esquisito que tem gente irritada com a aprovação do arrocho fiscal não por seus efeitos, mas por conta de o resultado da votação ter representado uma vitória do governo. Até mudanças constitucionais entraram na dança, como a que altera a aposentadoria de integrantes do Judiciário, medida casuística que visa apenas impedir a nomeação, por Dilma, de outros ministros do Supremo.
Ao adotar a lógica do torcedor, muitos relevam escândalos que envolvem oposicionistas, parecem interessados não em acabar com a corrupção, mas em promover uma troca de ladrões. Ignoram também pedaladas processuais no caso do Petrolão, parecem esquecer que qualquer um pode ser vítima de abusos por parte do Estado. O que está em jogo não é futebol, mas o país, suas instituições, o futuro de todos nós. É legítimo berrar e fazer barulho contra o governo, mas não custa ter cuidado para não comemorar gol contra nem confundir bater de panelas com chicotadas no próprio lombo.
E-mail: fernando.molica@odia.com.br
O Dia
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