segunda-feira, 4 de maio de 2015
Lula bate prego sem estopa e Dilma inova na Comunicação
Gilberto de Souza
Lula não poupou críticas à mídia conservadora, durante discurso no dia 1º de Maio deste ano
O discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no 1º de Maio, guarda – além do tom elevado, na voz rouca do líder brasileiro – as contradições que cingiram o seu governo e, agora, o de sua sucessora, a presidenta Dilma Rousseff. Em um determinado momento do discurso, Lula afirma:
– Não tem um ‘cara’ da elite brasileira, um (só), que já não tenha recebido favor do Estado brasileiro, que tenha sido salvo pelo Estado brasileiro.
Conheci muitos meios de comunicação falidos e ajudei porque acho importante ajudar. Porque a comunicação tem que ser forte, tem que ser democrática e tem que funcionar.
Nestas simples frases, o ex-presidente deixa claro que ajudou a salvar as Organizações Globo de um ‘embroglio‘ financeiro gravíssimo, nos EUA – onde já se cogitava a execução do maior conglomerado de Comunicação do país – e confessa o seu ledo engano ao acreditar que as famílias Marinho, Frias, Mesquita etc acreditam que a democracia, na mídia, exista de fato ou que algo funcione, neste setor, senão para perseguir e tentar derrubar o mínimo de justiça social que ele e Dilma ajudaram a construir, ao longo da última década.
Lula deixou translúcida, na mensagem exaltada aos trabalhadores, a sua decepção com a elite brasileira que, durante todo o tempo, recebeu o afago do Planalto e hoje retribui com demonstrações de ódio, pelas ruas do país, ao partido dele, o PT, a Dilma, sua protegida, e agora, sai em seu encalço na Operação Lava Jato. O plano do empresariado e das forças aliadas à direita, no Brasil, já estava escancarado desde o ‘mensalão‘, mas somente agora o ex-presidente parece ter acordado para o seu objetivo golpista.
Nos oito anos de governo Lula e, hoje, na prorrogação, tanto o ex quanto a atual mandatária nacional tentaram, em vão, negociar com a mídia conservadora. Lula, justiça seja feita, enquanto colocava as bondades do BNDES ao dispor da família Marinho, para livrá-los de uma dolorosa falência, ou dos Civita, para uso da editora de Veja, a revista semanal de ultradireita que lhe morde os calcanhares, orientava seu ministro da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, a idealizar um modelo que permitiria aos jornais independentes alguma fonte de oxigênio. Esta iniciativa, porém, foi logo abortada no Ministério das Comunicações do governo que o sucedeu.
Ao longo de seus dois mandatos, Globo e Veja foram campeãs na captação de recursos do Planalto. Somadas, embolsaram quase 90% de toda a publicidade estatal. E, desde sempre, mantiveram uma linha editorial voltada à defesa de seus próprios interesses, contrários aos dos trabalhadores e favoráveis às classes dominantes. Agora, Lula diz: “pegue todos os jornalistas da Veja, da Época (editada pelas Organizações Globo), enfie um dentro do outro que não dá 10% da minha honestidade”. Parece ter sido sincero, diante da multidão que o ouvia, em São Paulo. Mas foram necessários mais de 12 anos para ele perceber que não há canal de diálogo possível entre as forças populares e o establishment.
– Quando diziam que o BNDES não podia financiar prédio de editora (referindo-se à propriedade dos Civita), eu dizia: ‘Pode’. O dono de um jornal, se ele tiver direito a um financiamento, ele tem o financiamento e não é obrigado a falar bem do governo (referindo-se aos Marinho), porque ninguém está aqui para falar bem. Agora, eu queria dizer uma coisa: cada um olhe para o seu rabo – descontou.
Dilma, por sua vez, nem se preocupou em disfarçar. Nomeou Helena Chagas, uma jornalista identificada aos barões da mídia burguesa. Bloqueou todo e qualquer recurso à mídia independente, mantendo alguma quirera nos blogs de jornalistas que cavaram, cada um por si e os amigos por todos, um acesso à publicidade da Caixa Econômica Federal, do Banco do Brasil ou de uma estatal qualquer. Fritou ovos com uma globete no programa matinal da emissora. Recebeu os irmãos Marinho, fora da agenda e sem hora marcada, em seu gabinete. Foi capa de Veja, logo após as eleições de 2010, mesmo depois de ter apanhado feito coitada ao longo de uma das campanhas eleitorais mais sujas da História brasileira. Levou adiante a tentativa de compor com os conservadores a qualquer custo. E agora está vendo no que deu.
Após mais de uma década de erro em cima de erro, porém, neste 1º de Maio, Lula bate em prego na tábua da mídia, sem estopa, e Dilma inova ao falar aos brasileiros pela internet, inaugurando uma era de reconhecimento ao meio no qual se encontram mais de 90% dos blogs, sites de notícias, revistas eletrônicas e jornais independentes. O sucesso foi absoluto, pois repercutiu não apenas nas redes sociais, mas na mídia alternativa que, como de costume, apoia o governo eleito pela esquerda. E sem perder a audiência na mídia conservadora, que se viu obrigada a repercutir o pronunciamento inédito da presidenta da República.
Alvíssaras, pois os ventos parece que estão convergindo para arejar o processo político e midiático no país. O modelo no qual as forças da esquerda pagavam para apanhar da extrema direita, encastelada nas redações tradicionais, parece fadado a implodir nos próximos atos. Até 2018, quando Lula espera voltar como candidato petista, Dilma terá tempo suficiente para neutralizar o avanço do poderio conservador que, não se iludam, tem bala na agulha para fazer estrago semelhante àquele que, nas urnas, elegeu o Congresso mais retrógrado dos últimos tempos.
Gilberto de Souza é jornalista, editor-chefe do jornal
Correio do Brasil.
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