sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Aporofobia: termo para "aversão aos pobres" é eleito palavra do ano na Espanha

O neologismo, recentemente incorporado ao dicionário em espanhol, foi criado pela filósofa Adela Cortina. "Creio que é oportuno que esse fenômeno seja reconhecido, e que tenha um nome", disse a acadêmica.

Por Silvina Friera

Aporofobia, a aversão aos pobres, foi eleita a palavra do ano pela Fundação Espanhol Urgente (Fundéu), em evento promovido pela agência de notícias Efe e pelo banco BBVA. Este neologismo – recentemente incorporado à versão digital do dicionário pela Real Academia Espanhola (RAE) – foi criado pela filósofa espanhola Adela Cortina e usado em vários dos seus artigos jornalísticos e em livros onde ela adverte sobre o fato que se usa termos como “xenofobia” ou “racismo” para classificar o rechaço a imigrantes ou refugiados, quando na verdade essa aversão não se produz por sua condição de estrangeiros, e sim porque são pobres. “Creio que é oportuno que se fale de um fenômeno existe e que este tenha um nome. Me chama a atenção quando se diz que é preciso dar nome às tormentas, por exemplo, ou aos ciclones, porque assim as pessoas se previnem contra eles. A aversão aos pobres, a atitude de relegá-los socialmente, também é algo que se deve prevenir, porque é o mais contrário à dignidade das pessoas e um desafio contra a democracia. Não pode ser que uma parte da população despreze a outra e a considere inferior”, explicou a autora do libro Aporofobia, el rechazo al pobre (“Aporofobia, a aversão aos pobres”).



Como surgiu este neologismo? Cortina o utilizou pela primeira vez em um artigo que publicou em 1995. Em um dicionário de grego, ela encontrou o vocábulo “áporos”, que se usa para designar as pessoas pobres, que não possuem recursos, e a uniu com o sufixo “fobia”. Desde então, o emprega em diferentes artigos nos que se refere aos problemas do Mediterrâneo, “que eram de xenofobia até certo ponto, porque o turismo é a principal riqueza da Espanha, e quando se trata destes estrangeiros ricos não há xenofobia, há hospitalidade. Contudo, quando chegam refugiados, imigrantes, se produz outro tipo de aversão”, comparou a professora de ética e filosofia política da Universidade de Valência.



A acadêmica espanhola adverte que a aporofobia é uma patologia social que existe em todo o mundo e o primeiro que se deve fazer é “reconhecê-lo, saber como ele acontece e trabalhar para desativar esse fenômeno”, o qual ela define como “absolutamente corrosivo”. “A maneira de começar a pensar se parece correto que um sociedade rejeite os que nela vivem com menos recursos econômicos é saber que isso é uma realidade dos dias de hoje, e que temos que combater esse sentimento”, afirmou ela, agregando que o ódio ao pobre “é o mais contrário à democracia que pode existir, mais contrário aos direitos humanos, mais à ideia de dignidade do ser humano”.



“As palavras são importantíssimas em nossas vidas, e fico feliz em saber que se criam palavras para poder definir melhor a realidade. A gente sabe facilmente quando usar a palavra `mesa´ ou `cadeira´ quando as vemos, mas como saber quando apontar que existe um caso de `aporofobia´, ou de `democracia´?” perguntou Cortina. O termo criado por ela ganhou vem ganhando popularidade no meio acadêmico, e também entre organizações solidárias e até no Observatório del Ministério do Interior, que analisa os casos de xenofobia, homofobia e outros.



Cortina reconhece com preocupação o crescimento de movimentos que ela classifica como aporófobos, que estão ganhando terreno nos Estados Unidos e na França, como o discurso anti mexicano de Donald Trump e da Frente Nacional de Marine Le Pen contra os imigrantes. “É um dos grandes problemas do nosso tempo, porque desde 1948, ano da Declaração Universal dos Direitos Humanos, nós dizemos que isso era inadmissível, e agora está voltando a ser uma tendência”, concluiu a filósofa espanhola.



Esta é a quinta palavra eleita anualmente pela Fundéu. Em 2013, a palavra do ano foi escrache (“escracho”). No ano seguinte, a escolhida foi selfi (versão espanholizada do estrangeirismo usado no Brasil. Em 2015, a palavra escolhida foi “refugiado”, e em 2016, “populismo”. O prêmio à palavra do ano é organizado de forma a selecionar os termos que estiveram presentes de forma destacável na atualidade informativa durante o ano, concentra interesse também do ponto de vista linguístico. Antes da seleção definitiva, a fundação que organiza o concurso dá a conhecer uma lista com 12 candidatas. Além de aporofobia, participaram da parte final do concurso deste ano as palavras aprendibilidad (“aprendibilidade”, em tradução também a partir de um neologismo), bitcóin (outra espanholização de uma estrangeirismo brasileiro), destripe, machoexplicación (algo como “justificativas machistas”), noticias falsas, odiador, soñadores, superbacteria, trans, turismofobia e uberización.





Carta Maior
















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