Cunca Bocayuva
Marcelo Freixo define sua posição para o voto em Dilma em termos bem precisos:
O meu voto crítico em Dilma é um veto a Aécio.
Nesse segundo turno, não posso deixar de me posicionar. Tenho profundas divergências com as gestões do PT e com o governo de Dilma. Não saí do partido à toa. Não houve avanços nas reformas que acredito serem necessárias ao país, como a agrária, urbana, política e tributária. Além disso, Dilma não colocou o debate sobre a democratização da comunicação, a desmilitarização da polícia e a auditoria da dívida na pauta do governo. Por outro lado, tenho plena convicção de que um governo do PSDB representa um grande retrocesso ao Brasil, especialmente na defesa e garantia dos direitos humanos.
Aécio defende duas propostas inaceitáveis: a redução da maioridade penal e a privatização do sistema prisional. A redução da maioridade representa um maior encarceramento da juventude pobre e preta das favelas e periferias. Ela confunde Justiça com vingança e reforça um ciclo cruel de violência. A medida não representa qualquer avanço para superarmos os problemas com Segurança Pública. O governo tem que trabalhar para colocar a juventude no banco das escolas, não no banco dos réus.
A privatização dos presídios transforma a privação de liberdade em fonte de lucro, o que é perverso e, somada a redução da maioridade, fará crescer ainda mais a população carcerária. O Estado não pode mercantilizar a liberdade e se eximir da responsabilidade de garantir a dignidade humana e a ressocialização dos presos. Há medidas previstas pela legislação que poderiam ser adotadas para enfrentar os graves problemas do sistema prisional, como as penas alternativas, a garantia da progressão de regime, a valorização das defensorias públicas e a criação de mais Varas de Execução Penal. O Brasil tem cerca de 230 mil presos provisórios. São homens e mulheres que estão ilegalmente encarcerados há anos em condições desumanas sem que seus processos sejam julgados. Essa deve ser a principal preocupação do governo. Sou militante dos direitos humanos há 30 anos e por 27 trabalhei como educador dentro das cadeias do Rio de Janeiro. Em respeito ao meu passado, à minha história e à minha luta, quero barrar este projeto.
Além disso, Aécio não assinou a carta de compromisso redigida pela Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, órgão vinculado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. O documento, assinado por Dilma, Luciana Genro, Marina Silva e Eduardo Jorge, reúne 12 propostas com as quais os candidatos se comprometem para enfrentar este crime. A negativa do tucano mostra seu vínculo com o agronegócio, cuja bancada ruralista no Congresso Nacional impede a votação da emenda constitucional que desapropria, para a reforma agrária, terras onde o trabalho escravo é explorado. Desde 1999, o projeto está engavetado no Senado. É com essas forças que Aécio está comprometido.
Sou questionado sobre as denúncias de corrupção envolvendo membros do governo petista e respondo: o debate sobre corrupção não pode ser reduzido ao campo comportamental, mas deve ser enfrentado como um problema estrutural. E, neste sentido, o PSDB não pode se apresentar como solução para a corrupção, pois faz parte da mesma lógica. Basta lembrar a compra de parlamentares para aprovar a reeleição de Fernando Henrique Cardoso; o Dossiê da Pasta Rosa, que reunia informações sobre doações financeiras ilegais do Banco Econômico a políticos da base tucana; o escândalo do Banco Marka, que envolveu o presidente do Banco Central no governo FHC; o caso do superfaturamento dos trens comprados pelo governo paulista e o mensalão tucano em Minas Gerais. A corrupção é sistêmica e assim deve ser combatida. Portanto, é fundamental uma reforma política, que garanta o fim do financiamento empresarial de campanhas, acabe com os partidos de aluguel e permita mais participação popular e fiscalização sobre as atividades do Estado.
Acredito que a vitória de Aécio significaria o triunfo de um projeto elitista e conservador, a intensificação da criminalização dos movimentos sociais e o retrocesso na pluralidade da política externa. As gestões do PSDB sucatearam as universidades públicas, desmantelaram o Estado, deixaram o funcionalismo sem reajustes, arrocharam salários e provocaram desemprego em massa.
Na perspectiva da luta pelos direitos civis e pelo respeito à diversidade, é assustador ver o tucano aliado às forças mais conservadoras do país dentro e fora do Congresso Nacional. Ele tem o apoio dos deputados federais Marco Feliciano e Jair Bolsonaro e do pastor Silas Malafaia. O trio representa o que há de mais retrógrado, obscurantista e violento nos ataques ao Estado Laico e à defesa dos direitos humanos, sobretudo, quanto aos direitos reprodutivos das mulheres e às múltiplas identidades de gênero e sexualidade.
Que fique claro, meu voto em Dilma não significa que farei parte do seu governo. Pelo contrário. Eu e o PSOL continuaremos fazendo oposição de esquerda ao governo federal. Continuaremos pressionando para que as reformas de base sejam realizadas e pautas como a descriminalização das drogas, a defesa dos direitos LGBT, a promoção de igualdade e autonomia das mulheres, ampliação do efetivo direito à moradia e à cidade, melhoria da qualidade da educação e saúde pública sejam atendidas. Da mesma forma, meu voto em Dilma não significa uma aliança com o Partido dos Trabalhadores no Rio de Janeiro. Qualquer diálogo com o PT no Rio só poderia acontecer conosco depois do partido deixar a administração de Eduardo Paes e não retornar a um possível governo Luiz Fernando Pezão.
Por fim, a polarização nessas eleições é evidente e assusta. Espero que a democracia saia fortalecida e que a intolerância, o ódio e o preconceito não tenham mais espaço no processo eleitoral. Neste momento, Aécio recebe o apoio do que há de mais retrógrado. E se eles estão de um lado, me posiciono do outro. Meu voto é um veto, com convicção.
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