Brasileira como Jaboticaba |
Opções estratégicas
A estratégia libertadora seria a de buscar novos caminhos, vias próprias de um desenvolvimento próprio, sem pretender imitar os ricos do mundo.
R. Saturnino Braga
As velhas teses sobre desenvolvimento econômico indicavam que países como o Brasil teriam que percorrer, aceleradamente, o caminho anteriormente seguido pelos ricos para atingir o nível de renda e de consumo deles. Teríamos que realizar um esforço bem maior de investimento, sem pensar em distribuição prematura, atrair capitais de fora, fazer crescer o PIB a taxas elevadas e, assim, ao fim de 30 ou 40 anos, tornarmo-nos um país desenvolvido, sério, de primeiro mundo.
Celso Furtado, nosso maior pensador, mostrou o quanto esta visão era errada, determinando uma eterna dependência, criando a imitação dos padrões de consumo dos ricos, acentuando as diferenças internas de renda e de riqueza, criando tensões políticas, abrindo crises crônicas de balanço de pagamentos, inviabilizando a consecução das exigidas taxas altas de investimento e de crescimento, e perpetuando, ou mesmo aprofundando a nossa separação quantitativa e qualitativa das nações ricas.
O subdesenvolvimento, nesta perspectiva furtadiana, resulta de uma inserção característica da economia desses países no quadro mundial, uma inserção estruturalmente típica desses países periféricos, de fornecedores de matérias primas, nunca de produtores de bens complexos de tecnologia avançada, um tipo de inserção que se perpetua, significando que tais países são periféricos precisamente porque são periféricos e jamais deixarão de sê-lo, em condições normais, isto é, se não passarem por uma revolução, uma ditadura bismarquiana, ou meiji, ou stalinista, ou maoísta.
A estratégia alternativa, libertadora, seria a de buscar novos caminhos, vias próprias de um desenvolvimento próprio, sem pretender imitar os ricos do mundo.
Este é o grande debate que o Centro Celso Furtado busca promover, seguindo as linhas de pensamento do seu patrono. Claro que é um debate eminentemente político, que não pretende concluir por verdades científicas mas tão somente iluminar sendas de políticas alternativas capazes de nos libertar da subordinada condição periférica.
Esses novos caminhos contrariam frontalmente fortes interesses constituídos na associação de uma certa burguesia local com o grande capital internacional. Há um grande número de brasileiros que honestamente pensam que o único caminho viável, verdadeiro, é aquele velho de seguir os passos dos países ricos. Observam tudo o que se passa na vanguarda desses países, procuram estudar e formar-se culturalmente nesses grandes centros, viajam frequentemente para saborear um pouco dessa vida rica e limpa, cultivam o sonho de uma residência nesses lugares prósperos, avançados, éticos. Em último caso, preferem ver o Brasil dependente e subordinado mas pelo menos parecido com eles no modo de viver. É o que se retrata na grande mídia, uma espécie de síndrome de Calabar, que preferia os holandeses, mais ricos, mais produtivos, mais disciplinados, mais éticos; até mais bonitos.
Todavia, sendo outra a nossa opção, é preciso procurar, projetar e locar as diretrizes dessa nova estrada, fora da rota da inserção na periferia do mundo. Esta inserção característica da submissão periférica é a do Mercado, o grande mercado internacional, dominado pelo grande capital. E a primeira coisa a fazer é buscar, criar, cultivar e desenvolver mercados alternativos a este do grande capital. Sem romper frontalmente com ele, já que ainda precisamos dele para muitas coisas. O mercado interno brasileiro, o mercado sulamericano, o mercado dos BRICS, o mercado africano são alternativas válidas, libertadoras, que estão sendo experimentadas com sucesso. Cumpre avançar nelas com decisão e ousadia, rejeitando propostas de aprofundamento da submissão ao velho capital. Conseguimos rejeitar a ALCA e agora é importante evitar o acordo Mercosul -União Européia, a ALCA européia.
Além das novas inserções, há a trajetória interna, do mercado interno, da justiça social, da democracia efetiva, da intervenção do estado, nada de liberalismo, do velho mercadismo; intervenção direta para criar indústrias de ponta como a Embraer e a Petrobras; por exemplo, no setor farmacêutico. A trajetória de um modelo diferente de nação, de PIB médio, que seja, mas de bom atendimento de saúde para todos, gratuito; como de educação pública de qualidade, para todos, educação para o diálogo, educação para o respeito humano; país capaz de conhecer, estudar, aproveitar cuidadosamente a imensa riqueza de metade do seu território que é a Amazônia.
Eis o cerne da nossa luta política. Vencemos duramente a eleição de 2014 para confirmar a presença do estado, para manter a política distributiva e ampliar o mercado interno, para fixar a lei do pré-sal com o monopólio da Petrobras, para avançar na UNASUL e nos BRICS com o novo banco mundial e o novo FMI.
Veio a avassaladora onda golpista, renitente, poderosa, inspirada pela CIA, e o bombardeio devastador sobre a Petrobras. Foi necessário recuar com Joaquim Levy e negociar com o oportunismo direitista.
Foi difícil. É difícil. Política é realmente uma atividade muito difícil. Esperemos um pouco. Esperemos que no próximo ano consigamos continuar na abertura e no avanço dessas novas sendas libertadoras.
Carta Maior
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