sábado, 26 de setembro de 2015

O Discurso do Generoso Chico


Wagner Braga Batista

João XXIII foi marcantes na nossa adolescência. Descerrou novo horizonte para o cristianismo com suas encíclicas que celebravam a paz e a importância do progresso para os seres humanos. Desencadeou processo de atualização que inspirou movimentos eclesias aproximando-os de populações carentes. Oxigenou a igreja católica apostólica romana ao colocar em questão a soberba, a luxúria e a indiferença do alto clero, insensível aos clamores do povo.



Nesta conjuntura, a renovação e a aproximação da igreja com temáticas seculares torna a ocorrer. Em condições diversas do cenário político e econômico marcados pela guerra fria. A beligerância e a devastação sem limites assumem nova feição. Induzem polarizações de novo feitio. A dinâmica cumulativa e destrutiva das ditaduras sutis fomentam o fundamentalismo religioso, subliminar opressão perpetrada pelos softs powers, odiosas formas de discriminação, intensas ondas migratórias, criminalização de movimentos que resistem aos ardis da economia de mercado, a incessante degradação das condições de vida e do meio ambiente.



Porquanto credos confessionais credenciem-se por meio de artifícios do mercado, outros movimentos procuram resgatar princípios humanitários da religião. Da religação, que restaura o elo de seres humanos com a natureza perdida.



Nesta busca, a fé pode se converter em poderosa força motriz. Não move montanhas, tampouco vizualiza seculares muros que bloqueiam a sociabilidade necessária, no entanto pode sinalizar para fiéis sua incomoda e conflitiva existência.



Apesar destas limitações, admiramos a coerência de religiosos humanistas. De perseverantes homens de fé, que praticam honestamente suas crenças, sem diminuir seu animo e seu amor pela humanidade com o passar dos anos.



Reconhecemos a indissocialidade de sua prática com aquilo que os move, o que acreditam. Humanistas, por motivações que transcendem a razão, encontram fundamento em mística com fortes pulsões socializatórias. Estes impulsos, indispensáveis às transformações sociais, tornam-se cada vez mais escassos na esquerda, fascinada e seduzida por atraentes apelos da execrada economia do mercado.



Retornamos ao ponto de inflexão instaurado por João XXII na década de 1960.

O anátema dos diferentes deve ser superado pelo diálogo que conduza ao reconhecimento da alteridade. São alvissareiros os discursos e caminhos que transformam identidades em portais do reconhecimento e da valorização da diversidade.



Neste transito, preciosas lições de simplicidade, humildade e generosidade nos são ofertadas por gente como nós. Por homens, mulheres e crianças do tempo presente, posto que nos colocam num patamar da equidade.



Seres humanos com inclinações políticas, ideológicas e religiosas distintas mostram-se propensos ao diálogo e a valorização de virtalidades de seus interlocutores . Entre eles, destacamos um socialista, apóstolo da sobriedade e de seus cachorros, e um Papa, que demonstra inabalável apreço pela vida humana. Que revigora este sentimento entregando sua vida a própria sorte. Sem hesitação, sem temor.



Mujica, ex-presidente do Uruguai e Francisco, o Papa que vestiu a camisa dos pobres e oprimidos, têm inconfundíveis traços comuns, grandes afinidades e reconhecíveis virtudes, apesar de suas notórias diferenças.



Ontem, ao discursar no Congresso dos EUA, criticou o fundamentalismo religioso, condenou a pena de morte e reiterou sua defesa de migrantes, hostilizados em todo o mundo.



Nesta sexta-feira, 25 de setembro, em discurso na Organização das Nações Unidas, ONU, mais uma vez reiterou seu compromisso com segmentos mais vulneráveis da população e a vida planetária..



Denunciou a sistemática destruição do meio ambiente e deu um recado para especuladores, publicitários e designers ao criticar a cultura de descarte de seres humanos e produtos supérfluos. "O abuso e a destruição do ambiente são acompanhados da exclusão (...) pobres são os que mais sofrem (...) pelo afã egoísta e desenfreado por poder e bem-estar material"



.Asseverou: "Os excluídos são descartados pela sociedade e, ao mesmo tempo, obrigados a viver as conseqüências do abuso do ambiente” (Na ONU, papa defende ambiente e reforma do Conselho de Segurança URL: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2015/09/1686387-no-onu-papa-diz-que-ganancia-prejudica-o-ambiente-e-os-pobres.shtml?cmpid=compfb)



Ao celebrar a superação das necessidades e imperfeições como fonte de virtudes, o velho Chico antropoformiza liturgias e preceitos doutrinários da igreja católica.



Despojando-se da pompa e do distanciamento, que têm sido peculiares da Igreja, Francisco tenta aproximá-la de inquietudes e dramas humanos. Humaniza sua religião para que seja efetivo caudal da indispensável humanidade de seus fiéis.



* Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG


 

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