Francisco Carlos Teixeira
Não havia qualquer simetria entre o tratamento dado à destruição de uma dezena de fachadas de bancos e a tortura e morte de populares, como no Caso Amarildo.
Creio que mesmo os mais empedernidos defensores dos privilégios e do sistema de desigualdades sociais imperantes no país concorda que vivemos um momento único na história do Brasil. Houve, de fato, um forte movimento de ascensão social, de inclusão de milhões de trabalhadores e de miseráveis no “sistema produtivo” brasileiro. Malgrado as polêmicas entre críticos progressistas, como Marcio Pochmann, e entusiastas ao limite do ufanismo, como Marcelo Néri, concordamos todos que depois da pura e simples exclusão, exploração e subalternização (incluindo a incidência endêmica do trabalho escravo), no país viramos, na última década, uma triste página da história.
A novidade que ameaça a ordem
A estabilização da moeda, com o fim da hiperinflação durante as gestões de Itamar Franco/FHC, fez o trabalho (mínimo, deve-se dizer), que as administrações anteriores (Figueiredo, Sarney e Collor) não conseguiram fazer. Em torno desta vitória ergueu-se o decênio liberal/privatizante (Itamar Franco/FHC, 1990-2002) e criou-se um (ao menos um!) mito na gestão brasileira: o país não podia crescer (quer dizer, incluir, integrar pessoas ao “sistema produtivo”) de forma maciça.
Crescer era perigoso. Para evitar o retorno da inflação dever-se-ia manter altas taxas de desemprego e um câmbio que garantia a desindustrialização do país. Tratava-se de uma receita de falso médico: para acabar com a febre, mata-se o paciente. De fato, paciente morto não reclama!
Assim, o longo “decênio” liberal vangloriou-se da “estabilidade financeira” e profetizou um país de baixo crescimento, largo desemprego, salários miseráveis e ausência de equipamentos sociais mínimos. A Saúde Pública, a Educação e os Transportes foram abandonados, na ilusão (deles!) de que o mercado proveria. Deu-se um tremendo apagão elétrico, a indústria encolheu, o desemprego proliferou e se fez reformas-relâmpago da Constituição Federal, inclusive para garantir a reeleição de FHC.
O Lula da Silva, e sua complementação com Dilma, após sofrer um boicote internacional brutal (o “Lulômetro”, inventado pelo banco Goldman Sachs, um dos responsáveis pela crise de 2008) estabeleceu bases de cooperação com o sistema – aliança expressa na chamada “Carta aos Brasileiros”, leia-se, “Cartas aos Donos do Poder” – garantindo a manutenção das chamadas bases macroeconômicas: controle dos gastos públicos controle da inflação cumprimento dos contratos da dívida pública (interna e externa). Na verdade, o “tripé do poder”, bancos empreiteiras agronegócio, tranquilizaram-se com o perigoso governo comuno-socialista do PT. Em verdade, sem maioria parlamentar, enfrentando uma constituição e um sistema de governo ( um tal de “presidencialismo de coalizão”) que são em si um erro constitucional, o governo do PT apresentou uma administração de sucesso: índices de crescimento em ascensão; quitação total da dívida externa ( sem auditoria!), expansão da produção agrícola e industrial; criação de dezenas de universidades/campi públicos, geração de novos e melhores empregos, eliminação da fome endêmica e ações sociais afirmativas consideradas modelares até pelo Banco Mundial.
Quase no final de tal experimento adveio a crise internacional de 2008, toda ela fabricada nos Estados Unidos em função das políticas ultraliberais de Gorge W. Bush, somadas aos gastos astronômicos com guerras e armas. Contra todas as profecias de fim de mundo – e em face da paralisia patética do “mercado” que não sabia o que fazer – o governo optou por um modelo distributivista, com ênfase no consumo interno (o mercado externo ameaçava a total paralisia), com desoneração fiscal e incentivos via bancos estatais (BB, BNDES e Caixa Econômica). O Brasil cresceu 7.5% e mais alguns milhões de pessoas foram integradas aos sistema produtivo do país. Os empregos de má qualidade, o subemprego aviltante, deu espaço para o emprego formal, para o fim do trabalho compulsório e para um melhor nível de negociação de salários entre as partes.
Tudo isso imperdoável para “a ordem” e o “sistema produtivo”. A fúria contra o Programa Bolsa Família – uma “fábrica de vagabundos” – foi ao paroxismo. Claro, dever-se-á agora pagar salários decentes. Para o trabalhador, começava a ter possibilidades de escolhas!
Quebrando o tripé da oligarquia
O Governo Lula pode demonstrar, com largueza, que o as teses dos economistas da “Era FHC” – condenado o país a ser um continente de pobres com ilhas de riqueza – era uma impostura.
Paciente curado, sem febre, tem que estar vivo! Foi isso, enfim, que se apreendeu durante a gestão Lula e daí se constituiu seu sucesso e popularidade, em comparação ao seu antecessor, indiscutível. Dilma seguiu o mesmo caminho, mas com alguma diferença: não negociou as limitações impostas pelo “sistema produtivo” ao Governo Lula e contrariou todos os (múltiplos) sustentáculos do tripé: com o Código Florestal alienou a bancada ruralista; com a expansão do BB e da Caixa Econômica e a redução dos juros, alienou os bancos ( o que ameaçava os juros cobrados de forma exorbitante) e com as medidas de controle e revisão das concessões de serviços públicos (elétricas, rodovias, portos, ferrovias, etc.) alienou empreiteiras e o grande capital. Por fim, a gota d´água: a PEC do Trabalho Doméstico rompendo com uma trava do escravismo remanescente no país. Aí a Barra da Tijuca se revoltou! O tripé se assustou e iniciou uma feroz campanha contra o governo Dilma.
Surgiu, aí, o “tomate-diamante”, surgiram os apagões, surgiu a má gestão de serviços, surgiram crises a cada dia. Surgiram? Claro que não, já existiam. O que aconteceu foi a midiatização, a exposição mediática, de mazelas e malfeitos de forma brutal. Com tudo isso, os índices de emprego e de remuneração dos assalariados, não só mantinham-se os mais elevados da história, como ainda avançavam.
Como então desconstruir Dilma, o PT e um projeto de continuação da distribuição de recursos sociais?
A crise vai às ruas
No início de 2013, com o “tomate-diamante” bombando, e a campanha em torno do retorno da inflação, vários movimentos sociais autônomos – como o Movimento Passe Livre, o Movimento das Populações Sem-Teto, o Forum de Lutas ou o Movimento em Favor da Aldeia Indígena Maracanã – foram para as ruas de Porto Alegre, Natal, Curitiba e então São Paulo e Rio de Janeiro. Daí espalharam-se por mais de trezentas cidades brasileiras e reuniram mais de 20 milhões de pessoas em protestos contra as péssimas condições de vida (Saúde, educação, Moradia) e dos serviços concessionados (Transporte Urbano, em especial). A liderança de tais movimentos era difusa, pouco conhecida e no início não envolviam mais de do que 300 pessoas por ato. Contudo, a justeza, e a clareza, do movimento era tal que em poucos dias, de maio de 2013 ao começo de junho de 2013, as pequenas aglomerações viraram marchas de multidões.
Em poucos dias São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília paravam. Os manifestantes forçavam à portas do Congresso Nacional e do Palácio de Itamaraty. Ali estavam trabalhadores, vítimas dos transportes urbanos; classes médias ameaçadas por juros e alugueis; estudantes aviltados pela qualidade do ensino; trabalhadores da saúde, indignados com o abandono e jovens, muitos jovens, revoltados. Uns, a maioria da periferia, organizaram-se e se conectaram por redes, assumindo táticas de “violência simbólica”, tendo como alvo bancos e sedes de legislativos locais, identificados com a corrupção e a arrogância. Lá estavam, também, jovens de classe média, membros de grupos de lutas de academias e de torcidas organizadas que agiram com violência indiscriminada, atacando símbolos do poder, militantes políticos e partidos que se faziam presentes. Ali estavam, ainda, centenas e centenas de moradores de ruas, de sem-teto, que aderiram por crítica ao “sistema”, raiva, rancor e porque nada tinham mais a perder.
O governo também parou. Perplexo, boquiaberto, sem fala e sem presença. Na sua aliança informal, conjuntural, e involuntária e desamada com o “grande tripé” dos donos do poder, os anos de governo do PT acostumou os movimentos sociais – que desde da ditadura haviam se constituído na cara da sociedade civil autônoma e organizada – ao papel de “linha auxiliar” da governamentalidade. O grande Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, que deveria ser o elo entre a sociedade civil e o governo do PT, foi burocratizado e esquecido. Mesmo as bases do PT foram aconselhadas a ter calma e aceitar as mais esdrúxulas alianças (Sarney, Renan, Sergio Cabral, Crivella, e toda a oligarquia que assim se colocasse à soldo), muitas vezes levando a quase extinção do PT em estados e cidades onde o partido era um pilar das lutas sociais, como no caso do Rio de Janeiro.
As grandes, e históricas, entidades de luta popular, como a CUT, o MST, a UNE e inúmeras ONGs e similares atrelaram-se aos ministérios e secretarias nacionais, perdendo o contato com suas bases e, claro, a representatividade. No limite, para garantir “a base governista” se entregou a Comissão de Direitos Humanos ao inesquecível Feliciano (e agora se oferece o mesmo posto ao incansável Bolsonaro). Os movimentos sociais “históricos” nem mais representavam as bases do movimento popular junto ao governo do PT e nem explicavam às bases porque o governo do PT estava tão ensimesmado e andando em tão más companhias.
Uma parcela do PT que não admitira tanto silêncio e o arremedo e reedição moderna do varguismo, já havia se rebelado, dando origem ao PSTU. Outra, que suportou o sufocamento local e a ausência de diálogo, abandonou o projeto petista e originou o PSOL. Ao contrário das grandes experiências históricas de frentes populares e de grandes unidades para a transformação já vistas na história, o PT optou em jogar ao mar seu lastro ideológico e buscar apoio nas velhas oligarquias. Acreditou-se numa aliança com Sarney, Renan e até em Roberto Jeferson. Era, perdão pelo óbvio, a crônica de uma tragédia anunciada.
A oligarquia é velha, manhosa, sem escrúpulos e trai por natureza: valeu mesmo trocar Plinio de Arruda Sampaio por Roberto Jeferson?
Nas ruas uma geração sem líderes
Para milhares de jovens, estes mesmos que eram os primeiros em suas famílias a terminar o segundo grau, os únicos na rua a ir à universidade, os filhos que agora tinham carteira assinada, o PT não se diferenciava de seus novos parceiros. Afinal, vovó dizia: “mostra-me com quem andas e....”. O PT com Sarney; o PT com Maluf; o PT com Blairo? A conclusão era uma só: “...são todos iguais e vocês não nos representam!” Todos são jovens, muitos jovens. Entrevistei black Blocs com 17 anos! O que querem? Mudança, mudança de tudo – ingênuos, idealistas, mas... como então me disse a antropóloga Maria José Carneiro, perigosos! E para eles o PT não é a mudança. Me falaram em “revolução popular em curso”. Fiquei pasmo.
Não havia, para eles, nenhum tipo de organização, debate, experiência política anterior e acreditavam estar fazendo uma revolução. Não participavam de movimentos secundaristas (ditos “aparelhados”) ou de DCEs, onde a luta entre PSTU, PcdoB, PSOL e PT pode ser mais cruel do que da esquerda contra as oligarquias do “grande tripé”. Creio que foi Nelson Rodrigues (Flávio Aguiar, me socorra!!!) que disse: “...a esquerda só se une na prisão”!
Depois dos primeiros confrontos, passada a euforia (da mídia) de que as ruas eram contra “a Dilma”, a revolta popular atingia o governo federal e os governos e prefeituras estaduais, como o PMDB do Rio e o PSDB de Minas Gerais e de São Paulo como alvos principais. A televisão mudou. Os manifestantes passaram a ser vândalos e a ação da polícia, cada vez mais violenta e provocativa, foi glorificada. A rua reagiu, da forma que ela sabia, violenta e difusa. Os jornalistas, os caminhões de externas, os equipamentos foram apedrejados e queimados. “É duro, a Globo apoiou a ditadura” a rua escandia em altos brados. Aos poucos, e em especial através da ação da Mídia Ninja, as grandes televisões foram tiradas das ruas e seus funcionários sistematicamente atacados. Claro, a resposta foi “vandalizar” o conjunto dos movimentos populares. Deu-se o rompimento entre as ruas e a mídia.
Neste momento, os trabalhadores da imprensa tornaram-se alvo. Sem organização, para setores muito populares, sem formação e agressivos, as televisões eram um alvo. Daí a uma tragédia, tendo ela sido voluntária, planejada, ou não, estávamos a um passo do anunciado. E a tragédia aconteceu e tem um nome: Santiago Andrade. É a dor. É a injustiça. É a gratuidade. Esperamos que não seja inútil e que, de verdade, não tenha sido um ato planejado. Há criminosos presos que se declaram ameaçados de morte e pagos para lá estarem... temos que ir ao fundo disso.
A “violência simbólica” é inútil, e neste caso foi um fator para acelerar os atos de repressão e de criação de leis especiais. Culpa dos black blocs? Não há nada, nada até o momento que mostre que os dois criminosos presos sejam black blocs ou membros de quaisquer entidade política. O que isso prova? Os debates foram inúteis, embora intensos. Mas, os espaços, incluindo as grandes mídias, foram se fechando, assumindo cada vez mais o discurso “da ordem”. Não havia qualquer simetria entre o tratamento dado à destruição de uma dezena de fachadas de bancos ou alguns ônibus incendiados e a tortura e morte de populares (Caso Amarildo, agora já esquecido, foi apenas um de cinco assassinatos diários cometidos pela polícia no Brasil em 2013) bem como a violência provocativa da polícia, como do estudante João Pedro Cruz, baleado pela PM em 2/01/2014.
Da mesma forma, o treinamento, equipamento e aconselhamento da polícia foi relegado pelos governos. A polícia, incompetente para deter o tráfico nas UPPs “pacificadas” do Rio ou da Periferia de Sampa, foram lançadas contra os manifestantes. Bairros e regiões inteiras foram desguarnecidos. O número de roubos, furtos e assassinatos aumentou exponencialmente. Houve o medo. No Rio as milícias aceitam de bom grado sua nova legitimação e, enfim, as classes médias assustadas criaram suas rondas de “justiceiros”.
Pretos, pobres, desempregados, pequenos ladrões, doentes mentais, gays, passaram a ser o alvo de jovens despreparados de uma classe média, que vê seus privilégios encolherem em face do avanço das classes populares e constata o abandono por parte do estado. Pobre garoto negro, nu, e acorrentado ao posto.
É um quadro de Debret na zona sul do Rio no ano da Copa.
Os policiais, mesmos os bons policiais, como a soldado Alda Rafael Castilho, no Rio, são mortos pelo tráfico. Para o estado não há culpa. Podem ser substituídos, são só estatísticas. Além disso, transformam-se, na dor sentida de seus pais, em objeto de legitimação de mais assassinatos, num ciclo diabólico. E o sonho? E o orgulho desses pais? E a vida? Serão esquecidos! No Rio, em Maceió, em Sampa ou BH as mortes proliferam, vítimas de balas perdidas, sem inquéritos, sem condenações e quase sempre em inventados autos de resistência ou alguma alegada ligação com o tráfico. São todos pequenas notas dos jornais.
Policiais, por mais que sejam truculentos, são eles também trabalhadores explorados, inconscientes, de serem mal pagos para bater em trabalhadores mal pagos. Isso o poeta explica: “E os quase brancos pobres como pretos. Como é que pretos, pobres e mulatos.... Dando porrada na nuca de malandros pretos. De ladrões mulatos e outros quase brancos. Tratados como pretos”. Mas, os governos estaduais continuam pagando salários ridículos para pessoas enfrentarem o crime sem treinamento e sem equipamento. Tais mortes, como da soldado Alda Rafael Castilho são esquecidas. O governo simplesmente colocará no seu lugar outra soldado. Para a família, resta a dor. Tudo isso não tem qualquer reposta.
Para o governo, em especial o governo Cabral-Beltrami, tais mortes são temas para mudar a legislação, afrontar direitos humanos e exigir leis celeradas, como o faz agora instrumentalizando o impacto da tragédia do Rio de Janeiro. Em vez de treinar a polícia, equipá-la melhor, garantir saúde e moradia para os soldados – no mais das vezes obrigados a morar com o inimigo ao lado! – a preocupação da dupla Cabral-Beltrami é gerar, do fundo da história, leis celeradas contra a liberdade de expressão e a criminalização dos movimentos sociais. Eis a contribuição dos nossos políticos contra a violência: uma lei sobre “desordem em atos políticos” e a votação de uma famigerada Lei do Terrorismo para proteger a Copa? E o metro? E a Supervia? E o “trensalão” paulista? E as filas nos hospitais? E a vergonha do ensino público? Tudo obra dos vândalos!
A verdade não se escondendo sempre: “Polícia se diz despreparada para a enfrentar atos” noticia O GLOBO, hoje (13/02/2014). Qual a resposta do Sr. Beltrami: cercear a liberdade, dar direitos à polícia para bater e atirar, limpar as ruas do mínimo significado do mal-estar e estabelecer a paz... dos cemitérios!
E o combate ao crime?
Enquanto Beltrami, e o novo chefe de Polícia, bem como o delegado do caso Santiago Andrade aproveitam-se das informações repassadas por um advogado que notarizou-se como advogado de milícias do Rio de Janeiro, criam-se fantasias insustentáveis. Os agressores e assassinos de Santiago seriam black blocs. Não há quaisquer evidencias disso. O próprio delegado encarregado do caso diz que a atuação dos criminosos “se aproxima” (GloboNews, Boletim das Nove, 13/02/2014) dos black blocs, só isso! Por que um advogado de milicianos é o advogado dos dois agressores?
Quando se conheceram? Onde e quem os apresentou? Por que tal advogado, sem provas, acusou o deputado estadual (Psol-RJ) Marcelo Freixo de ligado aos agressores? Ocorre, que Marcelo Freixo presidiu a CPI das Milícias e foi o responsável pela acusação do deputado chefe das milícias no Rio, defendido pelo mesmo advogado, e por isso foi ameaçado, com sua família, de morte! No entanto, tal advogado é o defensor de ambos os agressores de Santiago Andrade.
Quem paga o advogado? Quem constituiu essa relação? Quem pagou as passagens de advogado e da namorada do criminoso até a Bahia? Quem ameaça de morte os criminosos? Se declararam pagos para estar nas manifestações, quem pagou? Por que o mesmo advogado é o defensor de criminosos que se atacam mutuamente? Enfim, quais as relações entre os criminosos apontados e as milícias do Rio de Janeiro? O elo de entendimento reside no papel do advogado das partes comuns... Ambos os criminosos e os milicianos.
Enquanto isso, o crime avança no Rio de Janeiro: “PM atribui aumento de crimes ao deslocamento de tropas para atuação em protestos” (O GLOBO, 31/10/2013). A média de assassinatos no estado passou de 110 mortes/mês em 2013, além da proliferação de roubos e furtos em pleno centro da capital da Copa. Mas, os PMs estavam de prontidão para bater em professores, como em outubro e novembro do mesmo ano. Mas, não é só isso: grande parte das tropas foi para as UPPs, plataforma eleitoral de Cabral-Beltrami (este já cogitado para vice-presidente da chapa de um candidato surpresa, conhecido como “algoz do PT”). Assim, bairros típicos de classe média foram assolados pela criminalidade, dando origem a formação de tropas de “justiceiros”, capazes de mimetizar as milícias fascistas italianas ou as SA do Terceiro Reich. Nenhuma novidade, quando um deputado federal – do PP do RS - afirma que “índios, quilombolas, gays e lésbicas são tudo de que não presta” (O GLOBO, 13/02/2014). O fascismo avança na sociedade brasileira.
O novo chefe de polícia do Rio, em sua entrevista de apresentação prometeu rigor e declarou que organizações “que fazem protestos” estão sob investigação. Por que? É proibido no Brasil fazer protestos? Isso foi definido pela dupla Cabral-Beltrami e seu novo chefe de polícia como o alvo central de sua atuação. E o treinamento e equipamento dos policias e as medidas para que não haja novas vítimas como a soldado Alda? Nada! E a solução do Caso Amarildo Nada! E o número absurdo, “iraquiano”, de autos de resistência e de “balas perdidas” seguidos de mortes? Nada! Pois é, para o novo chefe de polícia do Rio de Janeiro o grande problema “é o envolvimento político, inclusive de mandatos (ou seja, de deputados)”, no qual foi seguido pelo presidente (notório) da ALERJ: “...não há dúvida que há partidos políticos envolvidos”. Estamos perante um duplo fenômeno aterrador: de um lado, o aumento e descontrole da criminalidade, aterrorizando as classes médias e originando a explosão de nichos de fascismo na sociedade; de outro lado, o foco da ação da polícia tornou-se a vigilância e repressão dos protestos políticos, declarando descaradamente que “partidos, movimentos e organizações” politicas estão sob vigilância pela inteligência da polícia. Ou seja, a sociedade civil organizada é o alvo e todos estão sob olhar do “grande irmão”. A mídia insiste, quer os “atores escondidos”, apontando o dedo para deputados da esquerda e para movimentos sociais. O ciclo é perfeito, infernal: péssimas condições sociais protestos criminalização pela mídia formação de um clima de medo mais repressão mais violência criminalização da oposição e dos movimentos sociais!
E onde está o Amarildo? E a luta contra as milícias (estas estão se oferecendo como linha auxiliar da polícia)? E o treinamento das polícias? E o estudante de jornalismo João Pedro Cruz morte pela PM do Rio? E o menino negro de 15 anos espancado e amarrado no poste na zona sul do Rio? Sobre tudo isso paira o silêncio!
(*) Professor Titular de História Contemporânea do IUPERJ
Carta Maior
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