terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Krugman ridiculariza modelos da direita Miami



A paranoia dos plutocratas

Paul Krugman

O aumento da desigualdade tem, obviamente, custos econômicos: salários estagnados apesar da crescente produtividade, aumento da dívida que nos torna mais vulneráveis a crises financeiras. Também tem grandes custos sociais e humanos. Por exemplo, há uma forte evidência de que a alta desigualdade leva a uma saúde pior e maior mortalidade.

Mas há outras coisas. A extrema desigualdade, como se percebe, cria uma classe de pessoas alarmantemente afastadas da realidade – e ao mesmo tempo dá a essas pessoas um grande poder.

O exemplo que muitos estão comentando neste momento é o investidor bilionário Tom Perkins, um membro fundador da firma de capital de risco Kleiner Perkins Caufield & Byers. Em uma carta ao editor do “Wall Street Journal”, Perkins lamentou as críticas do público ao “1%” – e as comparou aos ataques nazistas contra os judeus, sugerindo que estamos a caminho de outra Noite dos Cristais.

Você pode dizer que esse é apenas um sujeito maluco e se perguntar por que o “Journal” publicaria tal coisa. Mas Perkins não é alguém tão alheio. Nem é o primeiro titã das finanças a comparar os defensores da taxação progressiva aos nazistas. Já em 2010 Stephen Schwarzman, presidente e executivo-chefe do grupo Blackstone, declarou que as propostas para eliminar as brechas fiscais dos fundos hedge e dos gerentes de private equity eram “como quando Hitler invadiu a Polônia em 1939″.

E há muitos outros plutocratas que conseguem manter Hitler fora de seus comentários mas que, de todo modo, têm, e expressam em voz alta, opiniões políticas e econômicas que combinam paranoia e megalomania em partes iguais.

Sei que isso parece forte. Mas veja todos os discursos e artigos de opinião de pessoas de Wall Street que acusam o presidente Barack Obama – que nunca fez nada mais que dizer o óbvio, que alguns banqueiros se comportam mal – de demonizar e perseguir os ricos. E veja quantos dos que fazem essas acusações também fizeram a alegação ridiculamente autocentrada de que seus sentimentos feridos (em oposição a coisas como a dívida das famílias e a austeridade fiscal prematura) eram a principal coisa que mantinha a economia atrasada.

Agora, só para ser claro, os muito ricos e aqueles em Wall Street em particular, estão na verdade se saindo pior sob Obama do que se Mitt Romney tivesse ganhado em 2012. Entre a reversão parcial dos cortes fiscais de Bush e o aumento de impostos que paga em parte pela reforma da saúde, as alíquotas de impostos sobre o 1% voltaram mais ou menos aos níveis pré-Reagan.

E também os reformadores financeiros tiveram vitórias surpreendentes sobre o ano passado, e isso é má notícia para os interesseiros cuja riqueza vem principalmente de explorar a regulamentação fraca. Por isso você pode defender a tese de que o 1% perdeu algumas importantes batalhas políticas.

Mas todos os grupos enfrentam críticas e acabam no lado perdedor das disputas políticas, em algum momento do caminho; isso é democracia. A pergunta é o que acontece depois. As pessoas normais seguem o rumo; mesmo que elas estejam irritadas e amargas por causa de reveses políticos, elas não gritam “perseguição”, comparam seus críticos aos nazistas e insistem que o mundo gira em torno de suas mágoas. Mas os ricos são diferentes de você e eu.

E sim, isso é em parte porque eles têm mais dinheiro, e o poder que vem com isso. Eles podem e com frequência se cercam de cortesões que lhes dizem o que eles querem ouvir e nunca, jamais, que estão sendo tolos. Estão acostumados a ser tratados com deferência, não apenas pelas pessoas que contratam, mas pelos políticos que querem suas contribuições de campanha. E por isso ficam chocados ao descobrir que o dinheiro não pode comprar tudo, não os pode isolar de toda adversidade.

Também suspeito que os Mestres do Universo de hoje estão inseguros sobre a natureza de seu sucesso. Não estamos falando aqui de capitães da indústria, de homens que fazem coisas. Estamos falando sobre interesseiros, homens que empurram o dinheiro e enriquecem retirando a espuma do topo enquanto ele avança. Eles podem se gabar de que são criadores de empregos, pessoas que fazem a economia funcionar, mas estão realmente agregando valor? Muitos de nós duvidam disso – e também, suspeito, alguns dos próprios ricos, uma espécie de autodúvida que os faz atacar ainda mais furiosamente seus críticos.

De todo modo, já estivemos aqui. É impossível ler arengas como as de Perkins ou Schwarzman sem pensar no famoso discurso de Franklin D. Roosevelt em 1936, em que ele falou sobre o ódio que enfrentava das forças do “dinheiro organizado” e declarou: “Eu aprecio seu ódio”.

Obama, infelizmente, não fez tanto quanto FDR para conquistar o ódio dos ricos não merecedores. Mas fez mais do que muitos progressistas lhe dão crédito – e, como FDR, tanto ele como os progressistas em geral deveriam apreciar esse ódio porque é um sinal de que estão fazendo algo certo.
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Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, é colunista do NYT
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Folha de S. Paulo

Juremir Machado 

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