terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Bolsa Família ganha maturidade e renda no Nordeste deve crescer menos




Beneficiado por políticas de transferência de renda nos últimos anos, a região Nordeste pode passar por alguma desaceleração em seu nível de consumo daqui em diante em função de um crescimento menor do Bolsa Família.

A renda gerada pelo valor médio dos benefícios pagos aos atendidos multiplicada pela quantidade de bolsas alcançou R$ 17,36 bilhões no ano passado, o que representa avanço médio anual de 10,2% em termos reais entre 2006 e 2011, acima dos 6,2% registrados pela massa de renda previdenciária e do crescimento de 5,8% da massa do trabalho. 


Os cálculos são da Tendências Consultoria, com base em dados do Ministério de Desenvolvimento Social, da Previdência e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Esse dinâmica se manteve semelhante em 2012, mas deve mudar. Como o Bolsa já atingiu um alto nível de universalização, a expectativa de especialistas é que essa massa de renda aumente em ritmo bem mais modesto nos próximos cinco anos, o que pode diminuir o ritmo de expansão do consumo em regiões mais pobres do país, especialmente no Nordeste, onde os rendimentos provenientes do programa representam 2,6% do total da renda familiar - mais que o dobro do peso de 0,9% na média do país e, por isso, foram importantes para impulsionar o comércio recentemente.


A alta de dois dígitos na massa de renda do programa social veio muito mais em função de reajustes nos benefícios, já que, entre 2006 e 2011, a bolsa média saltou 60%, ao passar de R$ 85 para R$ 137, em um ritmo médio anual de 18% em termos nominais. Nestes cinco anos, o salário mínimo subiu 55%, sem descontar a inflação. Embora em menor medida, também houve inclusão de novas famílias atendidas, que aumentaram de 11 milhões em 2006 para 13,8 milhões no ano passado.

Sócio e economista da Tendências, Adriano Pitoli avalia que 2012 ainda foi um período de crescimento forte para o Bolsa Família, ano em que o pagamento do recurso de expansão do Brasil Carinhoso, de forma que todos os integrantes superem o patamar de renda de R$ 70 mensais, foi ampliado para famílias com jovens até 15 anos. Antes, o complemento era destinado somente a famílias com crianças até seis anos.

Para o período de 2013 a 2017, porém, a consultoria estima que a massa de renda originada pelo programa irá crescer a um ritmo médio anual de apenas 1,3%, descontada a inflação, com avanço menor tanto nos reajustes dos benefícios como na inclusão de novas famílias. "Há um incentivo político para a ampliação do benefício e o governo pode flexibilizar as regras para quem pode recebê-lo, mas algumas famílias não precisariam mais da bolsa em algum momento", diz Pitoli.

O analista nota que a renda no Nordeste avançou a um ritmo médio de 7,4% ao ano entre 2006 e 2011, ao passo que, na média nacional, esse crescimento foi bem menor, de 5,7%, desempenho que em sua opinião está ligado à maior presença do Bolsa Família nessa região e também ao elevado peso da renda de aposentadorias, em sua maioria reajustadas pelo mínimo.

Segundo Pitoli, a variação mais robusta do que no resto do país deu mais fôlego ao consumo nordestino: nos últimos cinco anos, o volume de vendas no varejo restrito, que não inclui veículos e material de construção, ficou 9,2% maior no Nordeste, mais de um ponto percentual acima da média de 8,1% observada no país. Para os próximos cinco anos, no entanto, o analista não trabalha com comportamento tão favorável das vendas na região.

Pedro Ferreira de Souza, técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta que é possível o número de beneficiados chegar a, no máximo, 15 milhões em um período de dois a três anos, a depender da eficiência das prefeituras para encontrar pessoas aptas a receber a bolsa, mas ainda vê margem para correções acima da inflação nos benefícios per capita caso o governo altere algumas regras do programa. "É um programa muito barato. Ao contrário do salário mínimo, não depende muito do espaço fiscal disponível para haver aumentos reais", diz.

Ainda assim, afirma Ferreira, a tendência é que a massa de renda do programa cresça a passos bem mais modestos nos próximos anos, o que, no entanto, não deve comprometer severamente a expansão da economia nordestina em sua visão. "As aposentadorias rurais têm muita representatividade na região, que também está recebendo investimentos pesados. O Bolsa Família serve muito mais para aumentar o bem estar de famílias pobres do que para alavancar o crescimento."

Para Alexandre Rands, sócio da consultoria nordestina Datamétrica e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o programa social atingiu praticamente toda a população abaixo da linha de pobreza, o que aponta para aumento marginal de sua massa de renda nos próximos anos, ainda assim puxado somente por reajustes nos benefícios. Segundo Rands, esse cenário certamente terá efeito sobre o crescimento econômico do Nordeste nos próximos anos. "As bases de crescimento mais elevado do Nordeste mudaram, e a região irá voltar a crescer dentro do padrão nacional".

Valor Econômico

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