Francisco Paes Barros
Luiz Inácio Lula da Silva tinha tudo para escrever um dos capítulos mais bonitos da História republicana brasileira. Fez parte da resistência pacífica à ditadura militar. Jamais pregou a violência. No início da década de 1980, ao lado de trabalhadores, de intelectuais, de artistas, de jovens estudantes e de religiosos progressistas, ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores – PT.
A eleição presidencial de 1989 foi histórica. Lula era uma fonte de idealismo que contaminou milhões de brasileiros. O saudoso, querido e grande brasileiro Plínio de Arruda Sampaio foi membro importante da coordenação da campanha.
A partir daquela eleição, Lula foi deixando de lado o seu idealismo e assumiu um projeto que visava o poder pelo poder. Projeto que ficou conhecido como “Lulinha, paz e amor”. Aderiu ao marketing político, cedendo às imposições dos marqueteiros. Fez uma ampla coligação que acolheu políticos reacionários e outros envolvidos em denúncias por corrupção.
Com essa gente, com o PMDB de Michel Temer, maior partido do Brasil, e com o “mensalão”, governou o Brasil por oito anos e garantiu sua sucessão.
Lula chegou ao poder “vendendo uma imagem” durante a campanha eleitoral de 2002 que o desfigurou. Aderiu por inteiro ao sistema capitalista neoliberal deixado por FHC. Os banqueiros, os grandes empresários e as grandes empreiteiras nunca haviam “ganhado” tanto dinheiro como nos governos petistas. Lula foi considerado, com muita justiça, “mãe dos ricos”. Ele teve o Congresso nas mãos graças ao “mensalão” e à então oculta “Petrobrás” – duas bombas devastadoras de efeitos retardados.
Lula também foi considerado “pai dos pobres”. Não se pode deixar de reconhecer que, nos seus dois governos, o avanço social foi significativo, promoveu-se a inclusão social. De fato, Lula foi o melhor presidente da República do Brasil para os pobres. Muitos pobres puderam comprar suas geladeiras, seus carros, seus televisores, e se alimentar melhor. Essa gente sofrida passou a ter poder aquisitivo. Lula socorreu os miseráveis por meio do programa Bolsa Família. Foi, então, que eles puderam comprar o “pão nosso de cada dia”. Hoje, já não podem: são impedidos pela inflação.
A política econômica de Lula errou ao fazer do consumismo o seu alicerce. Alicerce fraco diante da realidade brasileira. Seu governo deixou de fazer a reforma agrária (limitar a propriedade rural em 1.000 hectares/investimento na agricultura familiar). Não investiu na segurança pública e na educação pública. Na educação, o investimento ideal seria na ordem de 10% do PIB. Não investiu na saúde pública, em que era necessário estatizar os serviços; no transporte público, na moradia, no investimento saneamento básico. Deixou de implantar um programa de inclusão social que viesse a substituir o Bolsa Família, que tem caráter emergencial.
De um lado, o pobre ganhou poder aquisitivo. De outro lado, ele viu seu filho sair da faculdade semi-analfabeto, fruto da decadência do ensino. Esse pobre não pode sair de casa de carro para passear, com medo de ser alvo de bala perdida. Fica inseguro até dentro de casa. Morre na fila esperando ser atendido nos postos de saúde de equipamentos sucateados. Sua moradia sofre com a falta de luz, água e saneamento básico.
Lula cometeu um erro fatal: conduziu muito mal sua sucessão, ao escolher Dilma Roussef para as eleições de 2010. Dilma venceu e não corrigiu os pontos vulneráveis do governo anterior. Não soube dar continuidade ao avanço social. Sua política econômica não seguiu rumo à direita nem à esquerda: seguiu a “marcha à ré”, rumo ao caos. Foi reeleita em 2014 com uma campanha que ocultava a situação gravíssima em que o País havia chegado.
As bombas do “mensalão” do “petrolão” estouraram no colo de Dilma Rousseff, esparramando lama para todos os cantos. Hoje, o PT ainda luta para salvar-se desse lamaçal que emporcalhou a história do Brasil, de Lula e do próprio partido.
Conclusão: Lula se distanciara da causa socialista e optara por um caminho perigoso.
Recentemente, fiquei muito triste ao ouvir no rádio e na televisão as gravações que vazaram da Operação Lava Jato e que mostraram conversas telefônicas de Lula com várias pessoas. Fiquei chocado com os termos e com as ideias. Tudo o que foi dito contraria profundamente o testemunho de vida dado por Lula até 1989.
O fascínio do poder é demoníaco, e conseguiu transformar um homem bom, simples, humilde, idealista no atual caudilho arrogante. Acredito que, um dia, Lula ainda fará uma autocrítica. E, com ajuda de seus verdadeiros amigos, voltará à sua origem. Mais maduro, experiente, sofrido e arrependido, poderá prestar valiosíssimos serviços ao Brasil, principalmente aos mais pobres.
Francisco Paes de Barros é radialista Radio Capital
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