terça-feira, 31 de maio de 2016
Justiça retira matérias do blog e proíbe falar do DPF Moscardi
Marcelo Auler
Em decisões proferidas respectivamente em 30 de março (que só tomamos conhecimento dia 10 de maio) e 5 de maio (da qual recorremos sem notificação oficial) o 8º e o 12º Juizados Especiais Cíveis de Curitiba, a pedido dos delegados federais Erika Mialik Marena e Mauricio Moscardi Grillo, ambos da Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Paraná (SR/DPF/PR) determinaram a suspensão de 10 reportagens publicadas neste blog. A juíza do 8º Juizado Especial, Vanessa Bassani, foi além e proibiu
“divulgar novas matérias em seu blog com o conteúdo capaz de ser interpretado como ofensivo ao reclamante” (o dpf Moscardi)
Através de um Mandado de Segurança impetrado junto à Turma Recursal dos Juizados Especiais do Estado do Paraná, os advogados Rogério Bueno da Silva, Tarso Cabral Violin e Thaisa Wosniack, do escritório Rogério Bueno, Advogados Associados, pedem a cassação da liminar do 12º Juizado Especial que obriga a retirar nove matérias do blog. Eles deixam claro que a determinação judicial “incorre em cerceamento nítido da liberdade de expressão” garantida pela Constituição Federal. A mesma medida será impetrada contra a decisão do 8º Juizado. Os advogados destacam ainda que,
“de maneira clara e acintosa, o blog do Impetrante está sendo alvo de censura, inclusive na modalidade de censura prévia, quando proíbe a publicação de novas matérias envolvendo o Requerente (delegado Maurício Moscardi Grillo), vulnerando de maneira acintosa os princípios da liberdade de imprensa”.
O viés político da Lava Jato – Para Bueno da Silva, o objetivo dos delegados é “sufocar” os jornalistas que fazem críticas às práticas adotadas na Operação Lava Jato. Nesse sentido, o delegado Igor Romário de Paula também ingressou com uma ação contra o jornalista Luís Nassif, editor do JornalGGN. As três ações foram ajuizadas pelos três delegados representados pela advogada Márcia Eveline Mialik Marena, irmã da delegada Érika. Escolheram o Juizado Especial Cível, para terem a opção do fórum. Com as ações correndo em Curitiba, os jornalistas, além das despesas com a defesa, terão gastos com os deslocamentos. Todos pedem indenização mais alta permitidas: R$ 35.200, em cada ação, a título de Direito de Imagem.
Eles, porém, desconhecem a solidariedade. Diversos blogueiros já fizeram uma vaquinha para ajudar a pagar a nossa defesa que, por sinal, teve um preço altamente simbólico por parte do escritório de advocacia. Com esta ajuda, pagamos as custas dos Mandados de Segurança.
No processo contra Nassif, a advogada também requereu a suspensão da reportagem Com excesso de poder, a Lava Jato pode ter virado o fio, publicada em 2 de fevereiro, no JornalGGN. Mas, a juíza Sibele Lustosa, do 6º Juizado Especial, não a atendeu. Leia, a propósito: Ao tentar censurar Nassif, delegado confessa viés político da Lava Jato.
Os delegados Érika, Igor (centro) e Moscardi movem ação de indenização por Direito de Imagem contra este blog e o JornalGGN, de Luís Nassif.
Revel sem intimação - Na ação proposta pela delegada Érika, a defesa do blog preocupou-se, inicialmente, em recorrer ao juiz Nei Roberto de Barros Guimarães, do 8º Juizado Especial, para derrubar a decretação da revelia do responsável pelo Blog, pelo não comparecimento à audiência de conciliação.
A ausência foi provocada pelo fato de ofereceram ao juízo um endereço onde o jornalista que responde por esta página não reside desde agosto de 2014. Somente no dia 17 de maio é que ele tomou ciência da audiência que deveria ter ocorrido seis dias antes. Por isso, os advogados pediram a anulação de tudo o que foi feito a partir da expedição do mandado de intimação.
Declaração de Chapultepec – Já com relação à liminar do 12º Juizado Especial que determinou a retirada de matérias do blog, os advogados lembram no Mandado de Segurança apresentado à Turma Recursal que isto fere a Constituição e colide com decisões do Supremo Tribunal Federal.
“O direito de liberdade de expressão é um direito fundamental, que se mostra como corolário da dignidade da pessoa humana, representando, de outra parte, fundamento necessário à sobrevivência do Estado, por isso, a restrição ao direito de se expressar livremente representa um exercício de violência, por parte de quem promove a censura, seja o Estado ou o próximo, na medida em que viola a abrangência totalizante da dignidade da pessoa humana”, diz a inicial do Mandado de Segurança.
Oa advogados recorrem ainda à Declaração de Chapultepec, cidade do México na qual a Conferência Hemisférica sobre liberdade de Expressão, em março de 1994, elaborou uma carta de princípios endossada por chefes de Estado, juristas, entidades ou cidadãos comuns. O Brasil referendou esta carta no Governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1996. Em 2006, Luís Inácio Lula da Silva reafirmou a adesão do país. A declaração deixa claro que:
“Uma imprensa livre é condição fundamental para que as sociedades resolvam seus conflitos, promovam o bem-estar e protejam sua liberdade. Não deve existir nenhuma lei ou ato de poder que restrinja a liberdade de expressão ou de imprensa, seja qual for o meio de comunicação. Porque temos consciência dessa realidade e a sentimos com profunda convicção, firmemente comprometidos com a liberdade“.
E prossegue:
“A censura prévia, as restrições à circulação dos meios ou à divulgação de suas mensagens, a imposição arbitrária de informação, a criação de obstáculos ao livre fluxo informativo e as limitações ao livre exercício e movimentação dos jornalistas se opõem diretamente à liberdade de imprensa“.
Colisão com o Supremo – A mesma declaração serviu ao ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2001, ao reformar, em decisão monocrática, o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que havia condenado o jornalista Paulo Henrique Amorim, em uma ação movida pelo banqueiro Daniel Dantas. Ao rever o decidido, o ministro reafirmou a posição do Supremo contrária a qualquer hipótese de censura ou cerceamento da liberdade de imprensa,mesmo se tratando de críticas jornalisticas. Ele expôs:
Ministro Celso de Mello: “o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as figuras públicas” Foto ASCOM/STF
“Ninguém ignora que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão estatal ao pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revele-se inspirada pelo interesse coletivo e decorra da prática legítima de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional (CF, art. 5º, IV, c/c o art. 220).
Não se pode desconhecer que a liberdade de imprensa, enquanto projeção da liberdade de manifestação de pensamento e de comunicação, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, entre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar.
A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as figuras públicas, independentemente de ostentarem qualquer grau de autoridade”.
Impedimento ao trabalho – A defesa do blog, lembrou ao Tribunal Recursal que “caso permaneça hígida a decisão judicial, tal como lançada no feito de primeiro grau, o Impetrante estará tolhido de exercer sua atividade profissional, como Jornalista Investigativo, na medida em que se encontra, por força de ordem judicial, impedido de mencionar o nome do Autor, e por via transversa a corporação estatal que o mesmo integra, criando óbice completo a qualquer reportagem que o Impetrante resolva fazer acerca da operação Lava-jato”. Em seguida, finaliza:
“Em se perdurando a decisão ora atacada, se terá afronta ao Estado Democrático de Direito, notadamente ao direito a informação e a liberdade de expressão“.
Com as decisões judiciais, as seguintes reportagens tiveram a veiculação suspensa:
Lava Jato, cai o delegado das mordomias do Paraná (08/04);
Carta aberta ao ministro Eugênio Aragão (22/03);
Novo ministro Eugênio Aragão brigou contra e foi vítima dos vazamentos (16/03);
Policia Federal sem verba para a Luz, mas com mordomias (11/02);
Lava Jato: Moro reacendeu as suspeitas do grampo ilegal na PF (23/01)
Investigações da Lava Jato: dois pesos e duas medidas (30/12)
Lava Jato: surge nova denúncia de irregularidade (06/12)
Lava Jato: DPF delega investigação do vazamento (02/12)
Grampo da Lava Jato: aproxima-se a hora da verdade (21/11)
Lava Jato: surgem mais grampos na PF-PR. “Grampolândia”? (04/11)
(*) Matéria reeditada para pequenos acertos no texto às 10H00 do domingo 29/05/16
Marcelo Auler.com
@@@@@@@@@@@
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário