Márcia Pinna Raspanti.
Nessa semana, a notícia de que um rapaz foi condenado a cumprir sete anos de cadeia pelo crime de estupro, por ter beijado uma moça à força no carnaval baiano de 2008, levantou polêmica. Enquanto muitos se espantaram com a severidade da sentença, alguns grupos feministas comemoraram o fato como uma grande vitória. O homem em questão – que por sinal, recorreu à defensoria pública – quer mudar a acusação para agressão para ser submetido a uma pena mais leve. A discussão tomou fôlego também por estarmos às vésperas do Carnaval, quando a prática dos beijos e carícias forçados se torna mais presente.
A definição de crimes sexuais sofreu diversas alterações em 2009. O estupro passou a ter a seguinte redação: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”, com pena de seis a dez anos de reclusão. Até então, o estupro era exclusivamente a conjunção carnal com penetração vaginal, mediante violência ou ameaça. A mudança na legislação buscou proteger aqueles que sofressem outros tipos de agressão sexual grave, inclusive os homens, que até então, não poderiam ser considerados vítimas de estupro, por questões anatômicas.
Um beijo forçado, uma “passada de mão” ou a infeliz “encoxada”, com certeza, causam grande constrangimento. E, muitas vezes, o agressor usa de violência para conseguir o que deseja. Mas, seria correto classificar tais atos como estupro? Não seria interpretar a legislação de forma equivocada? Acho que todas essas atitudes mostram como o machismo ainda reina entre nós brasileiros. Um homem que adota tal comportamento não respeita o sexo oposto e acredita que pode impor suas vontades pela força. Não aceita um NÃO como resposta. Entretanto, será que criminalizar comportamentos inadequados e encarcerar os agressores é a melhor solução? A cadeia é sempre a melhor saída para os males da nossa sociedade? Não acredito. O caminho, como sempre, é bem mais complexo: precisamos de mudanças profundas na mentalidade de homens e mulheres, que levem a relações mais igualitárias e respeitosas.
Outra questão importante: futuramente, sentenças como essa podem se tornar um verdadeiro “tiro no pé” das mulheres. O estupro é um crime terrível – que merece punição severa – e extremamente difícil de provar. Todos nós sabemos que muitas vítimas nem sequer dão queixa do ocorrido porque as investigações são muito dolorosas e humilhantes. Os agressores usam quase sempre a estratégia de desacreditar a mulher, fazendo julgamentos sobre seu comportamento, vestuário, caráter, ou afirmando que o sexo foi consensual. Um caso em que o homem é condenado por um beijo pode dar munição para a defesa de inúmeros casos de estupro. Ao ampliar tanto os limites da lei, ela pode acabar por perder sua força.
O estupro foi severamente condenado ao longo da História do Brasil e sua definição sempre foi polêmica. As Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia (1707) deliberavam: ”Porquanto o estupro se comete na defloração das mulheres donzelas, e o rapto se faz quando se roubam e tiram por força ou engano; um e outro são delitos gravíssimos, principalmente quando com aqueles que o cometem ficam as tais mulheres expostas a mais facilmente pecar e em perigo evidente para de todo se perderem”.
O delito dependia, como se pode observar, da condição da vítima: se fosse vigem e honesta, a ocorrência seria considerada grave. Mary del Priore, em “Ao Sul do Corpo”, destaca que o estupro era um “rótulo pesado para inúmeras fórmulas de sedução e defloramento – cujas punições poupavam até mesmo as mulheres coniventes”. Naqueles tempos, a mulher era considerada vulnerável, fácil de ser enganada e seduzida, portanto, nem quando decidia espontaneamente fugir com um homem, ela poderia ser responsabilizada pelos seus atos.
Hoje, depois de muitas conquistas femininas, ainda sofremos com os crimes sexuais, violências e constrangimentos. Isso nos mostra o quanto precisamos avançar para conseguir uma sociedade menos machista e violenta. Contudo, devemos pensar muito bem nos caminhos que escolhemos para chegar lá ou nunca nos libertaremos da condição de vítimas.
Historia Hoje
A definição de crimes sexuais sofreu diversas alterações em 2009. O estupro passou a ter a seguinte redação: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”, com pena de seis a dez anos de reclusão. Até então, o estupro era exclusivamente a conjunção carnal com penetração vaginal, mediante violência ou ameaça. A mudança na legislação buscou proteger aqueles que sofressem outros tipos de agressão sexual grave, inclusive os homens, que até então, não poderiam ser considerados vítimas de estupro, por questões anatômicas.
Um beijo forçado, uma “passada de mão” ou a infeliz “encoxada”, com certeza, causam grande constrangimento. E, muitas vezes, o agressor usa de violência para conseguir o que deseja. Mas, seria correto classificar tais atos como estupro? Não seria interpretar a legislação de forma equivocada? Acho que todas essas atitudes mostram como o machismo ainda reina entre nós brasileiros. Um homem que adota tal comportamento não respeita o sexo oposto e acredita que pode impor suas vontades pela força. Não aceita um NÃO como resposta. Entretanto, será que criminalizar comportamentos inadequados e encarcerar os agressores é a melhor solução? A cadeia é sempre a melhor saída para os males da nossa sociedade? Não acredito. O caminho, como sempre, é bem mais complexo: precisamos de mudanças profundas na mentalidade de homens e mulheres, que levem a relações mais igualitárias e respeitosas.
Outra questão importante: futuramente, sentenças como essa podem se tornar um verdadeiro “tiro no pé” das mulheres. O estupro é um crime terrível – que merece punição severa – e extremamente difícil de provar. Todos nós sabemos que muitas vítimas nem sequer dão queixa do ocorrido porque as investigações são muito dolorosas e humilhantes. Os agressores usam quase sempre a estratégia de desacreditar a mulher, fazendo julgamentos sobre seu comportamento, vestuário, caráter, ou afirmando que o sexo foi consensual. Um caso em que o homem é condenado por um beijo pode dar munição para a defesa de inúmeros casos de estupro. Ao ampliar tanto os limites da lei, ela pode acabar por perder sua força.
O estupro foi severamente condenado ao longo da História do Brasil e sua definição sempre foi polêmica. As Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia (1707) deliberavam: ”Porquanto o estupro se comete na defloração das mulheres donzelas, e o rapto se faz quando se roubam e tiram por força ou engano; um e outro são delitos gravíssimos, principalmente quando com aqueles que o cometem ficam as tais mulheres expostas a mais facilmente pecar e em perigo evidente para de todo se perderem”.
O delito dependia, como se pode observar, da condição da vítima: se fosse vigem e honesta, a ocorrência seria considerada grave. Mary del Priore, em “Ao Sul do Corpo”, destaca que o estupro era um “rótulo pesado para inúmeras fórmulas de sedução e defloramento – cujas punições poupavam até mesmo as mulheres coniventes”. Naqueles tempos, a mulher era considerada vulnerável, fácil de ser enganada e seduzida, portanto, nem quando decidia espontaneamente fugir com um homem, ela poderia ser responsabilizada pelos seus atos.
Hoje, depois de muitas conquistas femininas, ainda sofremos com os crimes sexuais, violências e constrangimentos. Isso nos mostra o quanto precisamos avançar para conseguir uma sociedade menos machista e violenta. Contudo, devemos pensar muito bem nos caminhos que escolhemos para chegar lá ou nunca nos libertaremos da condição de vítimas.
Historia Hoje
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