Bernardo Lima:
É preciso ter respeito nas polêmicas e disputas. Principalmente quando, por divergências políticas, debatemos com um intelectual como Plínio de Arruda Sampaio (o Plininho), que sempre esteve na luta dos trabalhadores e tem uma envergadura moral e intelectual gigantesca. Com todo o respeito e dentro da minha modesta capacidade, minha intenção aqui é polemizar com um artigo escrito pelo companheiro no sítio do PSTU. A análise de conjuntura que ele faz é em quase todos os aspectos diferentes da nossa, e isso explica as grandes diferenças políticas que têm surgido entre nós nos últimos meses.
Uma leitura atenta do artigo me fez elencar esses pontos centrais de divergências:
1) Plínio acredita que a entrada em cena da crise econômica precipita à direita a classe dominante e à esquerda as massas populares. Aos burgueses já não interessaria mais a manutenção do regime democrático atual e a classe trabahadora (orientada para outro extremo) estaria rejeitando de conjunto a democracia burguesia apelando a formas mais radicais de participação popular.
2) Acompanhando mecanicamente o pensamento acima, Plínio também conclui que o PT e Lula estão extintos politicamente. O parágrafo categórico sobre isso é o que versa sobre o futuro do petismo: "a crise do lulismo, com ou sem Lula, é estrutural. Ela é determinada, de baixo para cima, pelo descolamento da classe trabalhadora da ilusão de que soluções parlamentares, patrocinadas pela esquerda de uma ordem capitalista particularmente antissocial, antinacional e antidemocrática, possam resolver os problemas fundamentais do povo. Sem capacidade de mobilização social, o lulismo não sobrevive como projeto político."
3) Em consequência da sua análise extremamente otimista, Plínio enxerga que o Brasil está dividido em três grandes "partidos": o partido de Jucá (que seria os dos partidos políticos da ordem e da conciliação, incluído provavelmente o PT); o partido do "Fora todos reacionário" representado por Bolsonaro e os generais falastrões que propõem saídas autoritárias; e o "partido das ruas", que seriam os movimentos sociais e a grande maioria das massas radicalizadas, que deveria defender abertamente o "Fora Todos de baixo para cima" - única saída para a crise política nacional.
Portanto, na visão do autor, a política capaz de unificar “os de baixo” seria radicalizar a consigna de poder, propugnando imediatamente a derrubada de todo o regime e todos os partidos políticos da ordem, colocando Lula e o PT no mesmo saco que Aécio e Temer; o “Fora Todos”.
4) No último parágrafo, uma proposição estranha fecha o artigo, ele se coloca contrário à decisão do PSOL (segundo ele) de colocar a "liberdade de Lula" e a "batalha eleitoral" no centro da conjuntura e diz que a esquerda deve levantar a bandeira dos "Direitos já" e "Pelo fim dos privilégios" (não é isso o que fazemos há tantos anos???) e colocando a “Revolução Democrática” (sic) no centro da agitação.
Como “Revolução Democrática” é uma expressão abstrata (não sei realmente o que seria essa revolução no Brasil do Século XXI) e as duas outras bandeiras já são utilizadas diariamente pelo PSOL, resta como diferença política real a palavra de ordem do “Fora Todos” e a questão da prisão do Lula.
Como Plínio é um militante muito inteligente e capaz não resta dúvida de que seu artigo possui forte coerência interna. Em uma conjuntura onde toda a superestrutura da democracia burguesa está sendo descartada pelas massas, inclusive os líderes e partidos reformistas, e em que a dificuldade de mobilização reside no fato de que a classe trabalhadora não acredita em conquistar reformas através da conciliação; seria um ato de traição não propor imediatamente a derrubada de toda a ordem burguesa; insistir em consignas defensivas; propor frentes para a ação com partidos reformistas já abandonados pelas massas, etc.
Porém, é esta mesmo a correlação de forças entre as classes? Acredito que os militantes umbilicalmente ligados à classe trabalhadora tenham dificuldades em concordar. Bastam alguns minutos nos grupos de Whatsapp das famílias e locais de trabalho, uma boa conversa em um churrasco da fábrica ou um bate papo no ponto de ônibus ou no local de trabalho para se chegar a conclusões opostas.
Parte significativa das massas defende com unhas e dentes o legado do governo Lula. Outra parte, influenciada pela Globo e pela direita, quer vê-lo preso e confia cegamente no judiciário como agente de “limpeza” da política nacional. Uns e outros “são contra tudo o que está aí”, e tem esperanças que surja um “outsider” de mãos limpas. Além disso, multiplicam-se os “bolsominions” dentro de nossa própria classe. Os trabalhadores que fazem barulho dizendo que vão “anular o voto” são em geral os mais atrasados politicamente, menos ativos nas greves, etc. A “confiança nas próprias forças” da classe trabalhadora está profundamente abalada. E os partidos e grupos que são associados a ideia de “Fora Todos” (como o PSTU) não recebem quase nenhum apoio político (filiação, votos, participação em debates e encontros, manifestações favoráveis nas redes sociais, etc) mesmo onde possuem trabalho de base sindical.
A diferença gritante na análise de conjuntura nos coloca tarefas muito diferentes. O MAIS se preocupa com deter a escalada golpista e os ataques da classe dominante, organizar a defensiva e reorganizar a esquerda socialista que rejeita a conciliação de classes (será um grande passo se esse campo adquirir influência de massas, ainda que minoritária, ampliar sua capacidade de mobilização e ganhar um peso superior na vanguarda dos movimentos sociais).
Facebook Valerio Arcary
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