Rico e branco como toda a elite |
A elite branca brasileira é constituída pelo conjunto de pessoas cuja leitura da própria cidadania se reduz à visão do umbigo de cada uma delas...
Esta leitura faz com que tais seres não tenham a menor percepção sistêmica da sociedade na qual estão inseridos, reduzindo a existência dos mesmos aos seus interesses mais diretos e imediatos.
Tal redução aparta-os barbaramente do contexto sócio-histórico no e pelo qual o país e a nação brasileiros foram construídos, impedindo-os ato contínuo de se situarem adequadamente no presente e de projetarem o futuro.
Tudo se passa como se eles estivessem imersos num instante congelado em cujo interior há apenas o espelhamento recíproco daqueles elementos considerados “naturais”, quais sejam, as oposições hierárquicas entre brancos e negros, ricos e pobres, católicos e evangélicos (e seitas), homens e mulheres, heterossexuais e homossexuais, etc.
Aliás, a naturalização/hierarquização de tudo é (permitam-me o trocadilho) uma espécie de segunda pele da elite branca brasileira: para ela as oposições pontuadas acima não são de maneira alguma históricas – logo, políticas e mutáveis – mas sim existentes “desde que o mundo é mundo”, devendo permanecer da mesma maneira, pois, “para sempre”; neste contexto, a menor alusão à História – refiro-me àquela cuja lógica foi desvendada por Marx (a luta de classes, etc) – causa-lhe grandes erupções cutâneas...
Ora, auto-segregando-se cada vez mais atrás dos portões e grades dos condomínios, dos automóveis “indevassáveis”, dos shoppings cuja presença constrangedora de “seguranças” só eleva o mal-estar, de uma mídia que retroalimenta sua alienação da realidade sócio-histórica, de uma polícia incapaz de se diferenciar conceitual e praticamente dos criminosos, etc, tal elite mergulha no delírio segundo o qual vivemos em um país sem nação, vale dizer, em um país cujos únicos constituintes são o Estado, o território e... ela mesma!
Noutros termos, a elite branca brasileira se auto-exclui da nacionalidade (lato sensu), como se pudesse viver em um Estado instituído apenas pelos direitos dela e em um território que lhe pertenceria exclusiva e integralmente, sem os povos (no caso, os indígenas e os negros) e sem a história aos quais o Brasil deve sua existência.
Esse posicionamento discursivo – o delírio, ensina-nos Lacan, se constitui em uma modalidade de discurso – é herdeiro do longo e brutal passado colonial do país, expressando em nossa atualidade capitalista-tecnocientífica ainda a forma de vida e o ideário político dos “senhores”, ambos pautados pelo autoritarismo, pelo preconceito racial/social/sexual, pelo dogmatismo, pela arrogância e pela violência.
Neste sentido, o modus vivendi capitalista-tecnocientífico testemunha o seu próprio fracasso enquanto civilizador do elitismo, pois ele municia constantemente o delírio de auto-exclusão com miragens de bizarros “paraísos terrestres”: por exemplo, a cidade de Miami, nos Estados Unidos, é (perdoe-me o Islã pela desonra) a Nova Meca dos brasileiros endinheirados...
Apesar de tudo e na contramão do que se poderia supor, tal auto-exclusão é estratégica e dialeticamente favorável àqueles que se situam no campo da Esquerda Esclarecida (EE), visto que o alheamento face à nação é representativo da leitura delirante que os reacionários fazem da realidade sócio-histórica e sócio-cultural de nosso país, levando-os às derrotas nas eleições presidenciais dos últimos doze anos (2002 – 2014).
Não há como não expressarmos aqui o nosso desejo – desejo político, evidentemente – de que a elite branca brasileira (insistimos: o termo “branca” refere-se à posição discursiva e não à cor da pele) continue delirando... em praça pública.
Poeta. Psicanalista. Editor da página *ESQUERDA ESCLARECIDA*.
Golpeachment
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