quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Por que Congresso não quer enfrentar corruptores



Legislativo engaveta projetos que permitiriam punir empresas que oferecem propina. Forte presença de parlamentares-empresários e financiamento privado das campanhas ajudam a entender conivência
Por André Barrocal e Najla Passos, Carta Maior

Um esquema de desvios na área de transportes do governo causou prejuízo aos cofres públicos de R$ 682 milhões, 13% do valor dos contratos auditados pela Controladoria Geral da União (CGU). Para punir os corruptos, a CGU abriu processos contra 31 pessoas. Já o futuro dos corruptores depende da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público (MP). Ambos receberam o relatório da auditoria e, agora, têm elementos para tentar incriminar a conexão privada dos desvios.
Não se deve esperar, porém, que as empresas que se beneficiaram da bandalheira sejam punidas. A legislação brasileira não prevê a criminalização delas, só a das pessoas físicas que operavam em nome das corporações. E o Congresso não parece disposto a mudar isso.
Em fevereiro de 2010, o governo mandou ao Legislativo projeto que cria mecanismos para punir empresas que cometam crimes contra órgãos públicos. Dezessete meses depois, a proposta não saiu do lugar.


Em maio de 2007, o deputado Henrique Fontana (PT-RS) apresentou projeto para tipificar, do ponto de vista criminal, a corrupção ativa de empresas. Há 33 meses, o texto repousa em uma comissão da Câmara que poderia votá-lo e enviá-la direto ao Senado, sem necessidade de remeter ao plenário.

“Nós estamos sem forças na Câmara. Há 27 projetos de combate à corrupção prontos para serem votados e não conseguimos colocá-los em pauta”, diz o coordenador da Frente Parlamentar Mista de Combate à Corrupção, deputado Francisco Praciano (PT-AM). “A sensação que dá é que medidas estruturais contra a corrupção não encontram eco no Congresso”, afirma Fontana.
Em agosto, Praciano cobrou oficialmente do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), a instalação, “com a máxima urgência”, de uma comissão especial para debater o projeto do governo. O requerimento oferece a Maia um argumento para ele pressionar os partidos a indicar integrantes da comissão. Esse é o motivo de ela não existir ainda.
O projeto está sujeito a uma comissão especial desde que chegou à Câmara. Isso acontece sempre que uma proposta tem conteúdo abrangente e precisa passar por ao menos quatro comissões.
Em 2010, o então presidente da Casa, Michel Temer (PMDB), hoje vice da República, determinara a criação da comissão, mas faltaram as indicações partidárias. Maia repetiu o gesto em maio, mas o Partido Verde (PV) não providenciou a indicação.
Na CGU, prioridade:  O movimento de Praciano foi combinado com a CGU. Autora do texto junto com o ministério da Justiça, a Controladoria considera a aprovação uma prioridade para melhorar proteção do erário.
“A legislação brasileira atual é falha e incompleta no tocante a medidas repressivas diretas contra as empresas envolvidas em corrupção”, diz o secretário-executivo da CGU, Luiz Navarro. “As penas mais fortes alcançam apenas as pessoas físicas dos dirigentes e empregados. Mas é muito difícil, senão impossível, alcançar o patrimônio da empresa para obter o ressarcimento do dano causado à administração pública.”
Hoje, só as pessoas que trabalham para as empresas estão, de forma individual, ao alcance da lei por lesar a administração pública. O projeto do governo tenta contornar isso. Descreve o que seriam atos corruptores e fraudes. E oferece dois modos de punir tais condutas.
Primeiro: permite que órgãos públicos apliquem sanções administrativas às empresas – como independeriam da Justiça, as decisões seriam mais rápidas. Haveria multas, indenização, proibição de assinar contratos com o governo e exposição pública do condenado, entre outras.
Segundo: com base nos atos corruptores descritos, o Ministério Público e outras entidades públicas poderiam entrar na Justiça para recuperar o dinheiro desviado (inclusive confiscando o patrimônio da empresa) e pedir o fechamento da firma.
A proposta do deputado Henrique Fontana tem dispositivos muito parecidos. Para ele, a ação dos agentes privados é tão nociva ao interesse público quanto a dos servidores. Neste ano, a Polícia Federal já prendeu 400 pessoas por participação, no lado privado, de esquemas fraudulentos. Os funcionários públicos algemados eram menos da metade.

“Se você pegar os 30, 40 maiores escândalos de corrupção, é praticamente nula a punição dos corruptores”, diz Fontana. “O corruptor é impune no Brasil.”
O projeto dele está parado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara desde dezembro de 2008. Em um ano e meio, tinha sido aprovado nas comissões de Trabalho e de Desenvolvimento Econômico. Na CCJ, ganhou a relatoria do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Até hoje, não houve parecer ou audiências públicas para discutir a idéia.
Poder econômico: Há duas pistas para entender a dificuldade de endurecer contra os corruptores. A primeira é o perfil dos parlamentares. A bancada empresarial é a maior do Congresso. Tem 45% das vagas, de acordo com estudo feito a partir da biografia de deputados e senadores pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).
A segunda é o tipo de financiamento de campanhas políticas no Brasil, com predomínio de doações empresariais. Nos últimos dias, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma ação para acabar com as contribuições de pessoas jurídicas.
“Vem daí a defesa, pelos políticos “devedores”, dos interesses econômicos dos seus doadores na elaboração legislativa, na confecção ou execução do orçamento, na regulação administrativa, nas licitações e contratos públicos etc”, diz a ação da OAB.
O fim das doações privadas e sua substituição pelo financiamento público de campanhas estão sendo debatidos atualmente na Câmara em um projeto de reforma política que está sendo relatado por Henrique Fontana.
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