O "remédio amargo" do ajuste fiscal radical vai agravar ainda mais o desemprego
Patrus Ananias
Não é a primeira vez que enfrentamos uma crise econômica. Não é a primeira vez que nos ameaçam com um ajuste fiscal radical que sacrifica, principalmente, os mais pobres. Não será, infelizmente, a primeira vez que essa receita, além de não resolver, agravará mais a crise brasileira.
Em março de 2002, a taxa de desempregoestava em 12,1%, quase um ponto percentual acima da taxa atual de 11,2%. O governo Fernando Henrique realizara então um grande ajuste fiscal, em que a prioridade foi cortar todos os gastos a fim de pagarmos os achacantes juros que o FMI cobrava a cada novo empréstimo. “Desestatizar” era a palavra de ordem. E o resultado foi que, em janeiro de 2003, quando o presidente Lula assumiu, o desemprego subia a terríveis 13%.
Treze anos depois, vivemos uma crise novamente. E precisamos enfrentá-la. Mas o primeiro passo para um enfrentamento sério que nos leve a lugar melhor é mensurá-la com correção e honestidade.
Em primeiro lugar, essa não é uma crise exclusivamente brasileira. A Espanha, a África do Sul e a Itália têm, hoje, taxas de desemprego maiores do que a nossa, por exemplo. Em segundo lugar, essa não é a pior crise da história brasileira. Na crise do governo FHC o desemprego foi maior, num cenário de IDH bem mais baixo e de ínfimas reservas cambiais – US$ 37 bilhões.
Hoje, podemos reagir à crise em melhores condições, com PIB per capita anual de US$ 11.726,81 (cinco vezes maior do que o de 2002 - US$ 2.805,72), com 42 milhões de cidadãos e cidadãs que saíram da pobreza e com uma reserva cambial dez vezes maior, de US$ 370 bilhões, a sétima maior do mundo, à frente de países como Coreia do Sul, Alemanha, França, Dinamarca, Índia e México.
A PEC 241/2016 sintetiza o fundamentalismo econômico da facção política que usurpou o governo: quer congelar os gastos sociais federais pelos próximos 20 anos, ao valor de 2016 – ano recessivo.
Propõe, assim, um rompimento com o núcleo dos direitos sociais previstos na Constituição,revogando os patamares mínimos definidos na Carta para a saúde e a educação. É alarmante pensar que, caso o Brasil tivesse feito durante os governos Lula e Dilma o crescimento vegetativo proposto pela PEC, teríamos aplicado menos R$ 253 bilhões em saúde, menos R$ 437 bilhões na assistência social e menos R$ 454 bilhões em educação.
A única certeza que advém da PEC 241 é que o País terá que trabalhar ainda mais para fortalecer o capital especulativo e rentista que, só nos últimos 12 meses, recebeu do governo federal R$ 454 bilhões – quase meio trilhão de reais – de serviço da dívida.
A PEC do desmonte, que cobra investimentos em saúde, educação e assistência social ao povo brasileiro, só não coloca limites para o gasto específico com os juros da dívida. Esse valor já exorbitante irá aumentar astronomicamente nas próximas décadas. E a nação deixará para depois os investimentos na saúde, na educação, na assistência social e, inclusive, no apoio à nossa indústria nacional.
Como uma vez nos disse Karl Marx, a história se repete não só como tragédia, mas como farsa. E o horizonte que temos é que o remédio, de efeito incerto, será aplicado em uma superdosagem que somente um golpe na democracia poderia permitir.
O efeito colateral – este sim indubitável – agravará ainda mais a doença do paciente que, nesse caso, se trata dos empregos dos brasileiros. Um agravamento que poderá ser irrecuperável por atingir em cheio o projeto nacional de bem-viver definido em nossa Carta Constitucional de 1988.
*Patrus Ananias, ex-ministro do Desenvolvimento Social e do Desenvolvimento Agrário, é deputado federal pelo PT-MG
Carta Capital
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